quinta-feira, 31 de março de 2005

 

Terri Schiavo


Hoje morreu Terri Schiavo.

Na sequência de dois ataques cardíacos que impediram a chegada de oxigénio ao seu cérebro, o que lhe ocasionou gravíssimas lesões cerebrais, Terri Schiavo encontrava-se há mais de 15 anos em estado vegetativo, considerado pelos médicos como irreversível.

Depois de uma longa luta judicial, o marido de Terri Schiavo conseguiu uma autorização para que fosse legalmente retirado o tubo que a alimentava artificialmente.
O que acabou por ser executado há já treze dias.
Contudo, logo desde o início o pais contestaram tal decisão e levaram a cabo uma luta titânica, que chegou ao Congresso e ao próprio presidente dos Estados Unidos, procurando em vão a recolocação do tubo de alimentação da filha.
Ainda ontem o Supremo Tribunal dos Estados Unidos havia recusado uma vez mais intervir no caso, indeferindo qualquer possibilidade de recurso da decisão de parar a alimentação artificial de Terri.

É difícil fazer qualquer juízo de valor sobre a luta que se travou entre o marido e os pais de Terri Schiavo ou sobre as suas intenções ou motivações.

Como julgar o marido, que procura terminar com a indignidade daquela espécie de «vida para além da vida»?
Será que “aquilo” ainda era «vida»?
Como julgar os pais, quem sabe ainda esperançados numa qualquer cura milagrosa, para quem aquele ser humano, qualquer que fosse a sua condição, seria sempre a sua filha?
Qual será a maior dor para um pai? Ver a sua filha num estado vegetativo, ou vê-la simplesmente morrer?

Mas não estaria, decerto, longe da verdade se pensasse que se alguma réstia de consciência, de raciocínio, ainda restasse a Terri Schiavo, provavelmente seria ela própria quem lutaria também pela retirada do tubo que há 15 anos a mantinha naquela situação, e haveria de querer sair desta vida com dignidade, talvez a única coisa que ainda lhe restava.

Era, pelo menos, o que eu quereria...

quarta-feira, 30 de março de 2005

 

Johnnie Cochran













Johnnie Cochran
(2 de Outubro de 1937 – 29 de Março de 2005)


Johnnie Cochran, provavelmente o advogado mais famoso do mundo, morreu ontem aos 67 anos de idade, de uma doença neurológica.

Johnnie Cochran nasceu em Shreveport, no estado da Louisiana, Estados Unidos da América, de uma família descendente de escravos.
Depois de se licenciar em direito, na Califórnia, fez o exame à barra no ano de 1963. O seu primeiro emprego foi na divisão criminal do Ministério Público, em Los Angeles.
Mas, logo dois anos depois, optou pela advocacia privada e cedo fundou a sua própria firma, a «Cochran, Atkins & Evans» que ganhou fama nos anos 70 com a defesa de alguns casos mediáticos relacionados com brutalidade policial.

O seu caso mais famoso, em 1994, foi sem dúvida a defesa de O. J. Simpson, acusado do sangrento homicídio da ex-mulher, Nicole Brown Smith e do namorado desta, Ron Goldman.
À frente de uma extraordinária equipa de advogados famosos e sumptuosamente pagos, que ficaram conhecidos como o «Dream Team», como F. Lee Bailey, Robert Shapiro ou Barry Scheck, Johnnie Cochran conseguiu, contra todos os prognósticos, a absolvição de O. J. Simpson.

Na ocasião, não pude deixar de seguir diariamente na «Sky News» quase todas as sessões do julgamento e o impressionante desempenho daquela equipa de advogados milionários, cada um com a sua especialidade específica, e com todas as suas tarefas rigorosamente definidas com um profissionalismo indescritível.

No final do julgamento, ficaram célebres as extraordinárias alegações finais de Johnnie Cochran, provavelmente das mais brilhantes da história da advocacia e que, sem qualquer dúvida, influenciaram decisivamente o júri no sentido da absolvição.
Recordo a repetição exaustiva, de forma a marcar e a impressionar profundamente cada um dos jurados, da fórmula «if it doesn't fit, you must acquit».
Cochran referia-se a uma fase decisiva do julgamento quando a acusação intimou O. J. Simpson a calçar uma das luvas usadas pelo assassino e a luva... não lhe serviu.

Depois da absolvição de O. J. Simpson, Johnnie Cochran ficou inquestionavelmente associado à imagem de uma determinada «justiça» que nos Estados Unidos da América favorece quem pode pagar os honorários milionários de advogados de renome, em detrimento daqueles que, mesmo inocentes, correm o risco de ser condenados depois de uma defesa negligente ou menos competente.

Em Portugal, como é óbvio, passa-se rigorosamente o mesmo.

terça-feira, 29 de março de 2005

 

A Blogosfera


No «Diário de Notícias» um excelente artigo de Diogo Sousa e Filipe Morais sobre o fenómeno da Blogosfera, que não hesito em transcrever na íntegra.

A não perder... até porque fala de mim...


«A revolução da Blogosfera pode criar um novo poder»

«A liberdade de expressão ganhou uma nova amplitude com a massificação da blogosfera, que se posiciona como concorrente dos media tradicionais. A facilidade de utilização e a capacidade de chegar às massas permite que os conteúdos emitidos sejam, muitas vezes, informativos, apesar de não serem espaços de jornalismo. A polémica está lançada.

«Rogério Santos, professor universitário, entende que "os blogues também podem ser um sítio de informação, mas sem o crivo do jornalismo". O docente diz "não acreditar que os blogues sejam concorrentes dos media tradicionais, porque não seguem o princípio do contraditório e não fazem referência a fontes", sendo "sobretudo uma nova forma de expressão de quem escreve. Os blogues são principalmente individuais e esse é o seu grande problema". A questão do anonimato da maioria dos blogues retira-lhes credibilidade, pelo que "não são um paradigma de jornalismo". No entanto, tendo em conta que estão 'dentro' da Internet, "é possível que venham a ser uma nova forma" de media, disse ao DN.

«Para o jornalista José Pedro Castanheira, "os blogues já podem ser um sistema de vigilância à comunicação social tradicional. Podem ser um instrumento eficaz, mas também podem ser veículos de informações falsas", afirmou ao DN. A principal questão relacionada com os blogues prende-se com a autoria, "se são ou não anónimos", acrescentou.

«Os blogues têm trabalhado a informação sem limites, legais e deontológicos. Podem também agir como vigilantes e censores à informação dos media. Esta capacidade pode vir a transformá-los num novo poder. José Pedro Castanheira entende que actualmente "não há uma situação em que se estabeleça uma relação de concorrência, talvez de complementaridade, com a opinião".

«Estes diários pessoais na Internet são já vistos como uma revolução na forma de comunicar, acessíveis a qualquer pessoa, mesmo com poucos conhecimentos técnicos. As suas ferramentas de edição aumentaram, em muito, a massificação do fenómeno, que cresce cada vez mais por todo o globo.

«O servidor Blogger incita à concorrência com os media, afirmando que estes diários "são a voz dos seus autores na Web", virados para "audiências de milhares", onde "jornalistas profissionais e amadores podem publicar breaking news".Na blogosfera há já casos onde foram lançadas importantes informações que depois chegaram à comunicação social. Em 1998, o Drudge Report abriu o precedente, ao anexar informações do caso Monica Lewinsky antes da Newsweek, o primeiro media tradicional a abordar a polémica.

«No recente fórum de Davos, um post no blogue oficial daria origem à demissão de Eason Jordan, ex-editor da CNN e responsável pela cobertura da guerra do Iraque, que numa intervenção nunca cedida pela organização acusou os militares norte-americanos de alvejarem propositadamente jornalistas. Rony Abovitz, empresário convidado, estranhou a indiferença dos media e decidiu, no seu primeiro post de sempre, comentar o episódio. O blogue conservador Captain's Quarters e a publicação National Review deram-lhe voz e até à publicação no Washington Post, Wall Street Journal ou o New York Post, foi um passo.

«As críticas de juristas democratas e a defesa de Jordan, por parte de David Gergem, um republicano, comprovaram que os posts podem e são utilizados para fins não políticos, servindo cada vez mais para criticar os media.

«Dan Rather, figura emblemática da CBS, também foi vítima da blogosfera, por usar documentos falsos, retirados de um blogue.

«Em Portugal, o blogue Random Precision, de Luís Grave Rodrigues, denunciou a nomeação de Branquinho Lobo para a direcção nacional da PSP, depois de já ter sido aposentado por incapacidade devido a uma doença do foro psiquiátrico. A informação em primeira mão valeu-lhe a citação como fonte em notícias dos jornais Expresso, Correio da Manhã e Público».


segunda-feira, 28 de março de 2005

 

O Estagiário


Nem os velhos e sombrios corredores do Tribunal da Boa-Hora afastavam o calor abrasador daquela tarde de fim de Setembro.
Subiu lentamente as escadarias de mármore, gastas de séculos, e admirou os claustros que abrigavam na sua sombra as dezenas de pessoas que pareciam silenciosamente unidas pelo destino comum de estarem num tribunal criminal.

Foram decerto a gravata, a pequena pasta debaixo do braço e aquele ar de juvenil falsa segurança que o denunciaram. O funcionário aproximou-se dele e perguntou-lhe, apressado:
- O Dr. é estagiário?
- Sou.
- Quer fazer uma oficiosa?
Sem hesitar e tentando demonstrar calma e segurança na resposta, respondeu:
- Claro, vamos a isso.
Seguiu o funcionário pelo labirinto dos corredores até a uma pequena sala de audiências, já cheia de gente.

O peso da sala abateu-se sobre ele. Já tinha assistido a muitos julgamentos; sei lá, a alguns oito ou nove. Mas aquela era a sua primeira intervenção num processo, a sua primeira “oficiosa”.
Tentou disfarçar as pernas que lhe tremiam, a boca seca e aquele súbito e inesperado frio que o invadiu naquela tarde de Verão.
Olhou de soslaio para a arguida que ia defender. Ar modesto. Não mais de 18 ou 19 anos.
- Qual é a acusação? Posso consultar o processo? – perguntou ao funcionário.
Entregando-lhe um pequeno processo de capa cor-de-rosa, o funcionário segredou-lhe:
- A arguida está acusada de homicídio. Teve um bebé sozinha e matou-o à nascença. Embrulhou-o num saco plástico e deitou-o para um contentor de lixo.
Ainda quis ter a iniciativa de falar com a arguida, procurar uma explicação para a sua atitude, qualquer coisa que o pudesse ajudar na sua defesa.
Mas era tarde demais: de súbito, os três juizes e o procurador do Ministério Público entraram de rompante na sala.
Toda a gente se levantou respeitosamente.
O funcionário arrancou-lhe autenticamente o processo das mãos e pô-lo em cima da bancada dos juizes.
Muito direito, sentou-se à sua secretária e chegou a pequena pasta para a sua frente.
Sem perceber sequer que a inutilidade daquela pasta, vazia se não fossem alguns papéis em branco, não era muito diferente da sua.
Começou o julgamento!
Foi lida a acusação.
Foram feitas perguntas e a arguida confirmou tudo o que tinha sido lido, sem nada mais adiantar.

A pergunta do juiz sobressaltou-o:
- O Sr. Dr. deseja alguma coisa da arguida?
Se desejava alguma coisa? Claro que desejava!
Queria parar o julgamento. Já!
Queria consultar o processo. Queria preparar a defesa. Queria falar com a arguida com tempo. Queria perguntar-lhe porquê. O que tinha acontecido. O que tinha motivado aquele gesto tão cruel e desesperado.
Mas era a sua primeira oficiosa. Como é que aquilo se fazia? Como ia ousar sequer fazer uma coisa daquelas? Será que o podia fazer? Onde ia a porcaria de um estagiário arranjar coragem para interromper, para perturbar daquela maneira o julgamento de um Colectivo no Tribunal da Boa-Hora?
Mas tinha que ser! Tinha que agir de acordo com a sua consciência. Que raio de justiça era aquela? Com que farsa estava a colaborar? O que estava ali a fazer, afinal? Ofício de corpo presente?
Quando um dia sonhou ser advogado, não era certamente naquela palhaçada em que estava a pensar.

Mas, como se fosse outra pessoa a falar, quase com raiva, ouviu-se a si próprio a dizer cobardemente:
- Não quero nada, Sr. Dr. Juiz.
E o julgamento prosseguiu, com calma naturalidade:
- O Sr. Dr. tem a palavra para alegações.
Soergueu-se ligeiramente na cadeira e balbuciou:
- Peço justiça!
E tornou a sentar-se. Envergonhado consigo próprio.

Uma semana depois, a sentença: cinco anos de prisão!

No final dessa tarde, desabafou com o seu velho patrono.
Não lhe contou o que tinha pensado, o que tinha sentido. Tinha vergonha. Falou-lhe só do drama do caso e da severidade pena aplicada.
- Como organizou a defesa? – perguntou-lhe o patrono – Tentou ao menos justificar os motivos da actuação da arguida? Era mãe solteira? Sabia quem era o pai? Será que ela teve medo da reacção da família? Da reacção da comunidade onde vive? Tinha meios para se sustentar a si e à criança? Com uma justificação razoável, com uma explicação plausível, poderia talvez ter-se conseguido uma pena suspensa. Como organizou então a defesa?

O seu silêncio foi esclarecedor. Sentiu-se corar violentamente.
Mas a calma experiência do patrono sossegou-o:
- Deixe estar. Para a próxima já sabe...

sábado, 26 de março de 2005

 

O Ponto G

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À Procura do Ponto "G"
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sexta-feira, 25 de março de 2005

 

Puxar Pelos Galões


Foi noticiado que alguns agentes da Brigada de Trânsito da GNR que passaram multas a superiores hierárquicos têm sofrido retaliações, sendo alvo de processos disciplinares onde são acusados de não terem feito a saudação militar que lhes é imposta pelo regulamento.

Quem teve algum contacto com a instituição militar saberá bem que, muito provavelmente, os guardas serão efectivamente punidos e os oficiais superiores, pelos vistos muito preocupados com o mais rigoroso cumprimento da lei e dos regulamentos, ficarão escandalosamente impunes.

Mas nem sempre é assim.
Felizmente ainda há cidadãos que não querem aproveitar-se do cargo ou da posição que ocupam para seu benefício pessoal.
É, por exemplo, o caso de Pedro Santana Lopes.

Conta-se que o ex-Primeiro-ministro, já nas últimas semanas do seu Governo, viajava tranquilamente na auto-estrada Lisboa-Porto quando foi acometido de uma súbita e irreprimível vontade de urinar.
Não teve outro remédio senão parar e, escondido o melhor possível atrás do carro, lá começou a fazer o que ninguém podia fazer por ele.
Mas eis que um carro patrulha da GNR aparece como vindo do nada (não é sempre assim?), e surpreende o Primeiro-ministro naquela delicada função.

Imediatamente o guarda aborda-o:
- A urinar na auto-estrada? O senhor desculpe mas vou ter de o autuar!
Mas nisto reconhece Pedro Santana Lopes na pessoa do infractor, e imediatamente muda de ideias:
- Ah! É o Sr. Primeiro-ministro! Peço imensa desculpa. Faça favor de seguir.
Mas Santana Lopes, com toda a dignidade, diga-se desde já, virou-se para o guarda e disse-lhe:
- Não Senhor! Nem pensar! Eu sou um cidadão como os outros. De facto, quando estava a urinar na auto-estrada, eu estava a violar a lei. Por isso, o Sr. guarda faça o favor de me multar.
- Desculpe, Sr. Primeiro-ministro – retorquiu o guarda - mas não o vou multar.
- Multa sim senhor – insistiu Santana Lopes – já lhe disse que sou um cidadão como qualquer outro.
Mas o guarda teimou:
- Já lhe disse que não multo, nunca o poderia multar, Sr. Primeiro-ministro!
- Mas, ó homem: não multa porquê?
- Então o Sr. Primeiro-ministro está há meia dúzia de meses no Governo e já fez tanta merda, e era eu agora que o ia multar só por causa de uma simples mijinha?...

quinta-feira, 24 de março de 2005

 

A História e a Páscoa





«A História e a Páscoa»

A não perder, o excelente post do Nuno Guerreiro na «Rua da Judiaria».





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quarta-feira, 23 de março de 2005

 

O Pai da Filha


Já era professor naquela escola de Camarate há mais de um mês, e começava finalmente a familiarizar-se com os problemas daquela turma.
Alunos de uma comunidade muito pobre, que parecia conjugar todos os problemas da grande cidade com as dificuldades dos subúrbios semi-rurais de Lisboa.

Mas naquele dia, quando estava a combinar com os alunos a data do teste, foi com indisfarçável espanto que o professor ouviu aquela rapariga dizer-lhe:
- Nesse dia não posso, S’tôr. Tenho de ir ao pediatra com a minha filha.
De facto, um motivo absolutamente válido. Mesmo para uma aluna de 14 anos de idade...

No fim da aula chamou-a, para lhe falar a sós:
- Tu tens uma filha?
- Tenho. Faz agora 4 meses.
- E o pai da menina? Assumiu a paternidade e ajuda-te?
- Sim, S’tôr. Ele trata de tudo. Nunca faltou nada à bebé.
- E acompanha a menina, está com ela e tudo?
- Oh sim! Mesmo lá em casa prepara os biberons, muda as fraldas e levanta-se à noite quando a bebé chora e tudo.
- E os teus pais que dizem a isso? Tens 14 anos e já vives com o pai da tua filha?
Riu-se francamente quando respondeu:
- Não! O S’tôr não está a perceber! Todos os meus colegas e o Conselho Directivo da escola já sabem desde o ano passado: o pai da minha filha é o meu próprio pai...

terça-feira, 22 de março de 2005

 

I.R.S.

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segunda-feira, 21 de março de 2005

 

A Pensão de Reforma


Vasco Pulido Valente escreve no «Público» que, depois de quinze dias de angústia, o regresso de Pedro Santana Lopes à Câmara de Lisboa se prendia já com um problema de ordem estritamente pessoal, pois aquele estaria, por assim dizer, sem emprego e sem dinheiro, e à espera de uma "saída" melhor.

Vasco Pulido Valente defende ainda que «a lei devia atribuir uma reforma ao primeiro-ministro, como já faz com o Presidente da República, para evitar que um antigo primeiro-ministro ande por aí aos tombos, como Santana tarde ou cedo andará, envergonhando toda a gente».
«Sócrates podia, neste ponto, ser generoso e profiláctico».

Eis, de facto, uma boa ideia!

A atribuição de uma pensão aos cidadãos que tenham desempenhado as altas funções de primeiro-ministro de Portugal seria uma medida de inteira justiça que, antes de servir para agraciar esta ou aquela personalidade, contribuiria principalmente para dignificar o cargo.
E, claro, também o país.
Essa pensão, de montante semelhante ao vencimento do próprio primeiro-ministro, teria sempre de ser, como é óbvio, de atribuição genérica e objectiva, e absolutamente independente de juízos de valor sobre o desempenho do cargo ou do tempo de duração do mesmo.

Mas mais:
no caso concreto de Pedro Santana Lopes essa pensão traria um benefício adicional: com um rendimento que lhe permitisse retirar-se da política, Santana Lopes poderia, talvez, ter poupado os lisboetas ao seu regresso...

 

John DeLorean











John Zachary DeLorean
(6 de Janeiro de 1925 - 19 de Março de 2005)

John DeLorean, que chegou a ser candidato à presidência da General Motors, resolveu um dia prosseguir o sonho de fabricar o seu próprio automóvel,.
Foi assim que em 1973 nasceu a «DeLorean Motor Company» com o apoio de alguns investidores famosos, como Johnny Carson ou Sammy Davis, Jr. e até do Governo britânico.

A «DeLorean Motor Company», na sua fábrica da Irlanda do Norte, produziu cerca de 9.000 unidades de um único modelo, o DMC-12.
Mas foi o suficiente para transformar numa preciosa peça de colecção e num lenda do automobilismo este carro único, que não era pintado, pois era feito de aço inoxidável, com portas de abertura «asa de gaivota» e dotado de um potente motor de 6 cilindros e 2.850 cc.
O DMC-12 ficou famoso com o protagonismo de que rcebeu no filme «O Regresso ao Futuro».
Mas as dificuldades de desenvolvimento do automóvel, aliadas a acusações das autoridades americanas de que Jonh DeLorean traficava droga para subsidiar a construção do carro, acabaram em 1982 por conduzir a companhia à falência.
Já em 1984 Jonh DeLorean acabou por ser ilibado de todas as acusações, embora tarde demais para a sua preciosa companhia.
Resolveu então fundar uma marca de relógios a «DeLorean Time», que nunca alcançou grande sucesso.

À data da sua morte Jonh DeLorean projectava o lançamento de um novo automóvel que tinha recentemente desenhado, e no qual ainda vinha trabalhando nos últimos anos.

domingo, 20 de março de 2005

 

Laços de Família


Quando entrou no meu gabinete, estudei-o discretamente:
Muito magro, quarenta e poucos anos, cabelo liso penteado para trás e muito pouco asseado.
O fato cinzento fora de moda e a camisa grande de mais no colarinho, já puída nas mangas, demonstravam uma origem modesta.
O ar tímido e a voz balbuciante revelavam a delicadeza do assunto que ali o trazia:

Os pais já tinham morrido há alguns anos. Tinham deixado de herança aos seis filhos uma palacete enorme nos arredores de Lisboa, e que precisava urgentemente de obras de conservação.
Os parcos recursos dos seis irmãos obrigava-os ainda a viver todos juntos no palacete herdado.
Os três mais velhos, já casados e com filhos, partilhavam o segundo andar e ainda parte do primeiro, com as respectivas famílias.
Os três irmãos mais novos, ele, um irmão e uma irmã, ocupavam cada um o seu quarto no primeiro andar.

Estava ali porque a irmã o tinha acusado de violação.

Foi talvez o meu ar atónito que o fez dizer-me apressadamente:
- Mas é tudo mentira, Sr. Dr.! É completamente mentira!

Tentei ocultar os meus mais recônditos pensamentos quando ele continuou:
- O que é verdade é que tive um caso com a minha irmã. Durante algum tempo mantivemos relações sexuais.
- Algum tempo? Quanto tempo? – Perguntei.
- Para aí uns dez anos – respondeu-me.
- E alguém soube? Alguém lá de casa se apercebeu?
- Bem... – hesitou na resposta – a bem dizer, eu acho que o meu irmão mais velho e a minha cunhada andavam desconfiados. Mas eu e a minha irmã sempre tomámos todos os cuidados para ninguém saber.
- Que cuidados?
- Só quando estavam todos a dormir é que eu ia ao quarto dela, ou ela ao meu.
- Ela também ia ao seu quarto, ou só o senhor é que ia ao quarto dela?
- A maior parte das vezes até era ela quem ia ao meu quarto. Às vezes eu já estava a dormir, e lá vinha ela de mansinho...
Interrompeu-se e olhou-me como que a pedir a minha solidariedade e compreensão:
- Como pode estar ela agora a fazer-me isto? A dizer que eu a violei?

Fiz-me desentendido:
- Então, se as relações sexuais que teve com a sua irmã foram sempre consensuais, como explica que a sua irmã ao fim deste tempo todo, ao fim de dez anos, o venha acusar agora de violação?
- Ciúmes, Sr. Dr.! É tudo por causa dos ciúmes!
- Ciúmes? – perguntei – Ciúmes de quem? E porquê?
- É que ela acabou tudo comigo, e tem agora um caso com o meu outro irmão!...

sábado, 19 de março de 2005

 

Aos seus lugares


Miguel Sousa Tavares no «Público»:

«...assistimos a mais um episódio, dos tais de que se socorreu o Presidente da República para despedir Santana das suas funções governativas. Um milhão de lisboetas só podem ter-se sentido enxovalhados pela forma eloquente como Santana mostrou que estava a ver se caía qualquer coisa de pessoalmente mais apetecível, antes de se decidir, por ausência de alternativas, a regressar à Câmara da maior cidade do país.

«...Mais do que esperança, o que os portugueses sentem, desde 20 de Fevereiro, é uma sensação de alívio. Sócrates pode governar bem ou mal, mas ninguém espera dele uma atitude de leviandade, enquadrada por uma constante e primária cobertura de propaganda e promoção da imagem.
«Apesar deste nenhum tempo decorrido, há já quem reclame que os colunistas que antes criticavam Santana Lopes comecem já a fazer o mesmo com Sócrates, abolindo, como o fizeram com Santana, o tradicional período do "estado de graça".
«E, mais curioso ainda, até há quem o tenha já começado a fazer, com medo de que lhe chamem incoerente.

«Pois eu, que não só não respeitei o período de graça, como até comecei a criticar o Governo de Santana antes mesmo de ele ter tomado posse, não enfio o barrete. Porque as diferenças são, à partida, abissais: Sócrates não é Santana, e esse é o ponto essencial.
«O homem que escolhe os cargos políticos de acordo com as suas conveniências pessoais não merece dúvida nem condescendência - ou então acabemos com o choradinho sobre a falta de categoria da classe política.
«Por outro lado, Sócrates foi eleito por metade dos portugueses, e Santana foi cooptado, e também por razões de interesse pessoal, por aquele que eu, pessoalmente, considero o mais vazio e o mais profiteur de todos os políticos portugueses contemporâneos: Durão Barroso....»

sexta-feira, 18 de março de 2005

 

O Pato



Ouvi há pouco Mira Amaral declarar à «SIC Notícias» que se sente «um pato» quando pensa nos impostos que paga todos os anos.

Recorde-se que Mira Amaral, depois de menos de dois anos ao serviço, aufere uma reforma da Caixa Geral de Depósitos no montante de 18.156 euros mensais.


Com uma reforma destas, o coitado deve é sentir-se um pato... com laranja...



 

Made in China


No auge do debate sobre a liberalização da venda de medicamentos nos hipermercados, estou certo que esta notícia não deixará de preocupar as autoridades governamentais portuguesas:


Em Hanói, um vietnamita de 47 anos resolveu tomar um comprimido de «Viagra» falsificado, feito na China, e que lhe tinha custado menos de dois dólares.


Ao que parece o comprimido tinha um defeito qualquer, já que o homem teve de ser hospitalizado para os médicos realizarem uma pequena cirurgia para lhe drenar sangue do pénis, que tinha uma erecção que durava há mais de dois dias.

Depois desta notícia, espera-se um aumento das importações de «Viagra» Made in China...

quinta-feira, 17 de março de 2005

 

«O Eco»

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Estes são alguns exemplares (e respectivas “fichas técnicas”) do Jornal «O Eco».

O jornal «O Eco» foi publicado durante os anos de 1971 a 1974 por alunos (entre os 14 e os 16 anos de idade) do Liceu Paulo Dias de Novais, em Luanda.

(Clique nas imagens para as ampliar - e depois novamente no ícone que parecer no canto inferior direito da imagem)















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quarta-feira, 16 de março de 2005

 

O Código da Vinci


O «Diário de Notícias» e o «Público» noticiam que o Vaticano está a promover um seminário para desmontar os “erros e as “distorções” existentes no célebre romance de Dan Brown «O Código Da Vinci».
O cardeal Tarcisio Bertone, que foi o escolhido para liderar mais uma cruzada da Santa Sé – desta vez contra um romance de um escritor americano – apelou ontem ao católicos na Rádio Vaticano que não leiam e não comprem o livro.
Dan Brown é acusado de montar “um castelo de mentiras” e de obedecer a uma «intenção deliberada de desacreditar a Igreja Católica».

Uma vez mais o Vaticano procura determinar o modo de vida das pessoas de acordo com os seus cânones e princípios, por mais ortodoxos ou fundamentalistas que se venham a revelar.
E, se a «Santa Inquisição» já não existe hoje, é a sua condigna sucessora, a «Congregação para a Doutrina da Fé», chefiada pelo inefável Cardeal Joseph Ratzinger, quem actualmente controla a ortodoxia dos "ensinamentos católicos".
E esses ensinamentos revestem as mais variadas formas: desde influências sobre determinadas áreas governamentais e legislativas, à completa proibição de acesso às mais diversas áreas do conhecimento humano.
Não vão por aí espalhar-se boatos insidiosos de que a Terra é redonda, ou que a mulher afinal não foi criada de uma costela de Adão...
Exemplo disso é a extensa lista de livros cuja leitura é proibida aos cristãos: o célebre «Index librorum prohibitorum».
Não vá o Diabo tecê-las!

Dan Brown deve estar orgulhoso!
Num ápice, a sua inclusão no «Index» coloca o seu livro ao lado de outras obras primas da literatura mundial, como «Os Miseráveis» de Vítor Hugo.
E compara o seu autor a outros escritores que foram declarados heréticos e totalmente “banidos da cristantade” (sob pena da imediata excomunhão de quem lesse os seus livros), de que se destacam: Descartes, Bacon, Hobbes, Voltaire, Diderot, Montesquieu, Lock, Pascal, Rousseau, Lamartine, Stuart Mill, Hume, Zola, Maeterlinck, Comte, Anatole France, Kant, Jean-Paul Sartre, André Gide, Alberto Moravia, etc., etc.

Quando perceberá o Vaticano que não é preciso um romance de segunda categoria para desacreditar a Igreja Católica?
Quando perceberá que é a Igreja Católica que se desacredita a si própria?...

 

O Cinto

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terça-feira, 15 de março de 2005

 

A Fonte Segura


O excelente artigo de Clara Ferreira Alves na revista «Única» do «Expresso» da semana passada, a propósito do boato que se espalhou por esse país fora sobre José Sócrates e Diogo Infante, para além do que aqui já escrevi sobre a indignidade de quem origina e propaga tais boatos, fez-me lembrar um caso a que assisti há já uma boa meia dúzia de anos:

De repente, vindo não se sabe de onde, começou a espalhar-se pelo concelho de Loures o boato que os industriais e comerciantes de maior renome da região tinham como principal fonte dos seus rendimentos o tráfico de droga, que concertavam entre si como uma autêntica quadrilha organizada.

Conheci bem o caso, e acompanhei pessoal e profissionalmente alguns dos alvos dos boatos.
Por isso, sei bem o que essas pessoas sentiram enquanto o boato durou.
Principalmente o caso de um cliente que, pela sua notoriedade no concelho, era particular alvo dos boatos. E que, porque o conhecia bem, eu defendia sempre que ouvia alguém a difamá-lo.

Um dia, estava eu no escritório muito descansado, quando tocou o telefone.
Era o António, absolutamente exultante por me dar uma notícia:
- Com que então o teu querido cliente era uma pessoa de bem? Com que então vivia do seu trabalho? Queres saber uma coisa?
Fez uma pausa para saborear o momento e continuou:
- Pois bem: acabei de estar com um amigo meu que é inspector da Judiciária. Sabes o que é que ele fez esta tarde, ainda não há uma hora? Prendeu o teu cliente por tráfico de droga! Cercaram-lhe a vivenda e tudo. Ele ainda procurou fugir pelo muro das traseiras, mas quando a Judiciária disparou uns tiros para o ar, acabou por se entregar. Está agora nos calabouços da Gomes Freire.
- Mas tu tens a certeza disso que estás a dizer? – perguntei.
- Porra! – respondeu – Estou-te a dizer que acabei de falar com o próprio inspector que o prendeu! Queres fonte mais segura?
- Mas ele não poderá ter confundido as pessoas? – Insisti.
- Achas que era possível uma confusão dessas, pá?
Tinha razão. A notoriedade pública do meu cliente não se compadecia com essas confusões.

Foi então que eu lhe disse com toda a calma:
- Olha: para a próxima vê se arranjas umas fontes mais seguras, pá. Essas são uma merda!
Quase lhe via pelo telefone o ar de vitória que tinha na cara.
- Eu sabia que ias continuar a defender o gajo. Tu és lixado, pá! Estou-te a dizer que falei há cinco minutos com o próprio inspector da Judiciária que o prendeu! Está neste momento preso, pá! Porque não confirmas? Telefona-lhe!
Respondi-lhe:
- Olha António, vou-te dizer uma coisa: em primeiro lugar, o meu cliente não vive numa vivenda. Mora num sétimo andar. Em segundo lugar, acontece que, por simples coincidência, ele está aqui mesmo à minha frente. Temos estado a trabalhar aqui os dois, há mais de duas horas.
Parei um pouco a olhar para o meu cliente à minha frente, que não estava a perceber o que se passava.
- Olha vou-lhe passar o telefone, fala directamente com ele.
E perante o olhar de espanto do meu cliente, passei-lhe o telefone.
O meu cliente ainda perguntou:
- Estou?
Mas o António nem sequer respondeu.
Retomei o telefone e disse-lhe:
- Sabes o que podes dizer a esse teu amigo da Judiciária? Que bem pode ir para a puta que o pariu!
E desliguei o telefone.

Nunca até hoje o António teve coragem de tornar a falar comigo sobre o assunto...

segunda-feira, 14 de março de 2005

 

Uma história triste


Leio no «Afixe» uma história absolutamente perturbadora, excelentemente escrita pela Emiéle, que não resisto a transcrever na íntegra:

«Uma história triste»
«O ano passado conheci uma menina. Vamos chamar-lhe Mariana.
Nessa altura a Mariana andava a dormir mal. Tinha pesadelos, insónias, de noite queria ir para a cama dos pais apesar dos seus 8 anos.
Vim a saber que o casal a quem ela chamava pai e mãe, não eram os seus pais verdadeiros mas os únicos que ela conhecia e de que se lembrava. Ela e um irmão um ano mais novo, tinham sido abandonados há mais de 6 anos, tendo a Mariana passado os seus primeiros 3 anos de vida num “lar” do qual não conservava nenhuma recordação.
Quando tinha aproximadamente 3 anos de idade, estes “pais” tinham ficado sensibilizados com este abandono e, de acordo com a instituição trouxeram-na para a sua casa, onde lhe deram o mimo e carinho de uma filha.
Tanto quanto a sua memória podia recuar, a Mariana só se lembrava da mãe a dar-lhe banho, de ir passear com os pais, de a aconchegarem com o beijinho da noite, das comidas de que mais gostava, de a irem levar e trazer á escola. Manteve contacto com o irmão, porque ele tinha sido recebido por outra família, mas sempre com o cuidado de se reuniram muitas vezes, faziam as festas em conjunto, davam passeios juntos e eles sabiam que eram irmãos apesar de “terem pais” diferentes.
Um dia a mãe apareceu.
Receberam uma comunicação da instituição para levar lá a Mariana. A nossa menina, para quem os pais eram os que sempre tinha conhecido, é confrontada com a presença de uma mulher, que ela sabia existir, mas que nunca tinha visto e por quem não sentiu a menor simpatia.
A rejeição foi enorme e aí começaram os pesadelos e o mau dormir. Quando falei com ela, vi-a apavorada, nem queria imaginar que pudesse perder os seus pais! E o mesmo se passou com o irmão.
Entretanto o processo foi decorrendo, ela e o irmão foram várias vezes levados à força a encontros com a mãe, de onde voltavam perturbadíssimos e em pânico. As suas famílias viam-nos sofrer e sofriam com eles.
Há poucos dias recebi um telefonema da mãe da Mariana. Disse-me “Sucedeu o pior!” Contou-me, em lágrimas, que dois dias antes tinham ido ao tribunal, eles e o outro casal com o menino. A Mariana, que estava com gripe, tinha ficado de cama. Alguém deu a mão ao irmão da Mariana, saindo com ele por uma porta. Ouviram-no chorar, mas quando os pais quiseram acudir foi-lhes barrada a passagem.
O juiz perguntou-lhes secamente e de um modo cortante “Sabem que esta menina tem mãe ?!” Ao tentarem, em pânico, gaguejar uma resposta ouviram: “Se não a apresentarem amanhã podem ser acusados de rapto”.
Portanto, no dia seguinte, aquela Mariana que conheci radiosa apesar de assustada na altura, a menina cuja memória mais remota era de uma vida com esta família, pais, avós, tios, primos, de uma penada viu a sua vida modificada radicalmente e perdeu completamente a sua família. Uma morte colectiva.
A violência deste acto, onde é dito que nem sequer se pode dar o contacto destas crianças porque é secreto, deixa-me pensar que também há histórias de Kafka para a infância.
Só imagino como vai dormir agora a Mariana, numa cama estranha, ao pé de pessoas estranhas, num ambiente estranho, a frequentar uma escola estranha, com colegas e professores estranhos.
Neste momento nem estou a pensar no sofrimento dos adultos a fazerem este luto doloroso, penso apenas no terror desta menina e como é possível situações destas resolverem-se apenas pela frieza das leis.
Julgava que não era possível.
Foi».

Não sei como estará agora a Mariana.
Não consigo imaginar o seu sofrimento.
Nem sequer posso imaginar como passa os seus dias.
Que pensamentos a atormentam.
Que pesadelos a assaltam à noite, quando as luzes se apagam.

Mas tenho a certeza absoluta que o juiz que tomou esta decisão, decerto no melhor interessa da Mariana, está de consciência perfeitamente tranquila.
E que dorme bem à noite e tudo...

 

A Evolução do Homem





Se é mesmo verdade (Génesis: 1,27) que Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança...











...também não é menos verdade que, desde a sua criação, o Homem já evoluiu...



(Ideia gamada ao «Diário Ateísta»)

 

Teatro Experimental











Este artigo foi publicado em Junho de 1973 no jornal «A Província de Angola», e relata a realização de um espectáculo do Grupo de Teatro Experimental do Liceu Paulo Dias de Novais, de Luanda.





(Para ampliar, clique sobre a imagem e seguidamente
no ícone que aparecer no canto inferior direito)

domingo, 13 de março de 2005

 

O Senhor Deputado


A Assembleia da República é a sede do poder legislativo.
Os deputados eleitos terão na legislatura que agora se iniciou a tarefa da feitura das leis, e terão também a responsabilidade de influenciar a sua redacção de acordo com os projectos e os programas dos partidos políticos que representam.
Mais ainda: terão de o fazer de acordo com a sua competência e a sua consciência.
É precisamente para isso que lá estão.

Um desses deputados, a quem Santana Lopes ofereceu de mão beijada (ainda hoje estou para saber porquê) um lugar elegível nas listas do PSD, é Nuno da Câmara Pereira.

O que poderemos nós esperar deste senhor deputado nesta legislatura?
Qual então o currículo deste homem?
Bem: não serão decerto os seus dotes de fadista que farão dele um bom parlamentar.
Até porque, mesmo como fadista, o homem não me parece grande coisa.

Também não deve ser por ter uma vez entalado a Edite Estrela num programa do Herman, que é agora deputado. Seria uma justificação má demais para se ser um legislador da Nação.

Será então por aquilo que pensa, por aquilo que diz, que deveremos perspectivar no futuro a actuação e o desempenho de Nuno da Câmara Pereira como representante do povo português na Assembleia da República.
Depois de o ouvir dizer na televisão que se tivesse um filho homossexual corria com ele de casa, temos para já esta esclarecedora entrevista ao «Diário de Notícias», em que esta brilhante luminária tece considerações sobre a questão do aborto e teoriza mesmo sobre a necessidade de se repensar a lei actualmente em vigor:

Concorda com a despenalização do aborto?
- Por formação, sou visceralmente contra o aborto, mas considerando os fenómenos da modernidade penso que pelo menos até à maioridade as jovens devem poder prevaricar.
Ou seja, interromper uma gravidez?
- Sim, porque até aos 18 anos não têm maturidade para assumir essa responsabilidade...
Defende, então, a criação de outra excepção na lei?
- Sim, até aos 18 anos temos que repensar a lei do aborto
E se a mulher tiver mais de 18 anos?
- Se já é adulta tem que ser responsável por isso.

Mas alguém me diz no que é que o Santana Lopes estava a pensar ou, quem sabe, que fretes estava a pagar, quando pôs este gajo como deputado?...

sábado, 12 de março de 2005

 

Ó Sr. Guarda: viu o meu carro?


Finalmente a fama da competência e da fabulosa eficácia da polícia portuguesa ultrapassa fronteiras!

Leio no «ABC News Online» que o Anselmo, um estudante de Évora, se lembrou um belo dia de retirar as chapas de matrícula do seu carro para as mandar reparar.
Desparafusou-as cuidadosamente e deixou o carro estacionado num parque de estacionamento do centro daquela cidade.
Mas um zeloso e preocupado cidadão achou muito estranho e altamente suspeito ver um homem retirar as chapas de matrícula de um automóvel e deixá-lo estacionado num parque de estacionamento.
E fez obviamente o seu dever: chamou a polícia.
Vai daí, a polícia isolou o carro e, não fosse o Diabo tecê-las... fê-lo explodir!

Quando cerca de quatro horas depois o bom do Anselmo regressou ao local, nada pode fazer para além de contemplar os destroços do seu querido carro.
Em declarações à comunicação social, a responsável da polícia eborense afirmou que tinham sido tomadas todas as medidas adequadas, já que tudo indicava que havia explosivos no automóvel.

O próprio Anselmo admitiu ser o culpado por todo o sucedido porque, de facto, isso de deixar um carro sem matrícula num parque de estacionamento é uma estupidez.

Sendo assim, é bem feito:
ninguém te manda ser estúpido, ó Anselmo!...

 

666


Segundo relatos em vários jornais, num tribunal do estado do Nebraska, nos Estados Unidos, Ivan Henk acabou de ser condenado a prisão perpétua, sem possibilidade de liberdade condicional, pela morte do próprio filho de 4 anos, cujo corpo nunca foi sequer encontrado.
Com o objectivo de escapar à pena de morte, Ivan Henk acabou por se reconhecer culpado do homicídio, que justificou dizendo que o filho era o «Anticristo» e que tinha a marca «666» na testa.

Não há dúvida:
A fé move montanhas...

sexta-feira, 11 de março de 2005

 

11-M


No dia 11 de Março de 2004 três atentados atribuídos à organização terrorista Al Quaeda, de Bin Laden, provocaram em Madrid quase duas centenas de mortos e mais de 1.400 feridos.
Os terroristas colocaram explosivos em comboios, e fizeram-nos explodir nas estações ferroviárias de Atocha, Santa Eugénia e El Pozo.

Mais do que a indignação que causaram em todo o mundo, mais do que a profunda raiva que me provocaram, estes atentados causam-me ainda hoje uma indescritível revolta, quando penso que nada nos pode assegurar que não voltarão a repetir-se.
E isso é já a primeira vitória dos terroristas!
Porque significa já uma perda da minha LIBERDADE.


Por isso, pergunto-me frequentemente se, de facto, estaremos a contribuir para a reconquista dessa liberdade.
Ou se, pelo contrário, não estaremos todos os dias a perdê-la mais um pouco.
E pergunto-me até se essa liberdade, que tantos séculos nos custou a conquistar, que julgávamos garantida e definitivamente adquirida, não desapareceu já de vez do mundo ocidental.
Levada por gente que, sejamos verdadeiros, associamos imediatamente a uma religião distante, a nacionalidades e culturas longínquas, e... a uma raça diferente.
Gente que acolhemos generosamente na nossa terra, com quem partilhamos os nossos direitos e a nossa liberdade, e cujos filhos andam e brincam na escola com os nossos filhos.

É então que (e é envergonhado comigo mesmo que o confesso), dou por mim a reprimir já com uma estranha e inesperada dificuldade, sentimentos da mais básica e primária xenofobia.
Que nem sequer sabia que existiam...

Mas sou só eu que sinto isto?
Sou só eu que penso assim?
Merda para isto!!!

quinta-feira, 10 de março de 2005

 

A Múmia


A cidade de Itami, no Japão orgulhava-se de contar entre os seus mais ilustres habitantes um dos homens mais velhos do mundo, o Sr. Kyujiro Kanaoka, de 107 anos de idade.

De tal forma, que até o presidente da Câmara Municipal lá do sítio todos os anos lhe enviava para casa prendas pelo seu aniversário, em sinal de respeito pela sua provecta idade.

Tudo corria bem, até que se descobriu que o Sr. Kyujiro Kanaoka tinha já morrido há quase dez anos.
E que os três filhos com quem tinha vivido, todos já com mais de 70 anos de idade, mantinham o corpo do pai na sala, sentado num sofá com um quimono vestido e rodeado de talismãs e amuletos religiosos.
Segundo a polícia, os filhos serviam-lhe diariamente todas as refeições, que deixavam pontualmente ao pé do corpo, e praticavam «rituais bizarros» à volta do cadáver.

Há tanto tempo que o corpo estava já mumificado.

Uma vizinha da família manifestou-se muito chocada com a descoberta, e acabou por admitir que achava um bocado estranho que fossem feitas todas aquelas referências e honrarias a uma pessoa de tão avançada idade, mas que ao fim e ao cabo e bem vistas as coisas, nunca ninguém tinha visto...

quarta-feira, 9 de março de 2005

 

O Milagre


Um padre passeava pela floresta quando viu uma onça que vinha na sua direcção.

O padre começou imediatamente a fugir. Mas quando a onça estava quase a alcançá-lo, ele teve uma brilhante ideia: parou, ajoelhou-se, ergueu os braços para o céu e começou a rezar:
- Senhor, faça com que esta onça tenha princípios cristãos!

Foi então que se deu o milagre: a onça parou subitamente, ergueu as patas para o céu, e disse:
- Senhor, abençoai este alimento que vou comer...

terça-feira, 8 de março de 2005

 

O Salão Erótico


Finalmente Lisboa vai juntar-se ao clube das grandes cidades europeias e mundiais!

O «Random Precision» tem a honra de anunciar em primeira mão que nos próximos dias 30 de Junho a 3 de Julho vai realizar-se o «1º Salão Internacional Erótico de Lisboa» na FIL do Parque das Nações.




Uma organização do já mundialmente célebre «Festival Erótico de Barcelona», o certame contará com a presença de reputados artistas internacionais de filmes pornográficos.
Serão exibidos shows e filmes eróticos e, para além de uma «gay zone», terá ainda uma «hard zone» um «fetish café» e um «boulevard erótico».



Confesso que estou muito curioso com as reacções que se adivinham...

domingo, 6 de março de 2005

 

A Sucata da Justiça


Estas fotos foram hoje tiradas no parque de estacionamento do Palácio da Justiça do Seixal.
(Clicar nas fotos para as ampliar)

Os automóveis que se vêem nas fotos foram apreendidos, penhorados ou arrestados à ordem de determinados processos e, por isso, estão à guarda do Tribunal do Seixal.
Por estarem completamente abandonados a uma qualquer negligência (e que, como é óbvio, todos sabemos que ficará impune) os automóveis acabam por apodrecer lentamente, depois de serem roubados dos seus componentes, ou simplesmente vandalizados.


Apesar de estarem à guarda da Justiça portuguesa, estão agora completamente destituídos de qualquer valor e nenhum préstimo têm mais.
Nem para os seus donos, nem para os respectivos credores.
Nem sequer os que forem declarados perdidos a favor do Estado servirão para outra coisa que não somente para mais um encargo para o erário público, quando tiverem de ser enviados para um depósito de sucata.

Mas, como uma imagem vale mil palavras, talvez lá no fundo da lenta agonia do seu apodrecimento estes automóveis ainda sirvam para nos mostrar uma última coisa:

Pois não são eles, de facto, a verdadeira imagem do actual estado da Justiça portuguesa?

 

David Gilmour


No dia 6 de Março de 1946 nasceu David Jon Gilmour.

David Gilmour é guitarrista e vocalista de uma das mais famosas bandas de Rock ’n Roll de todos os tempos, os Pink Floyd, de que fez parte juntamente com Syd Barrett, Roger Waters, Rick Wright e Nick Mason.

David Gilmour entrou para a banda em 1968 para substituir Syd Barrett, principalmente nos espectáculos ao vivo.
No entanto, acabou pouco tempo depois por tomar definitivamente o lugar de Barrett, após a sua saída do grupo.
David Gilmour é um guitarrista exímio, e compôs alguns dos mais famosos temas dos Pink Floyd, principalmente após a saída de Roger Waters.

Tem 8 filhos: 4 filhos da sua primeira mulher, Ginger, 3 filhos da sua actual mulher, Polly que por sua vez tem também um filho de um anterior casamento.
Para além de coleccionar aviões, que gosta de pilotar em shows aeronáuticos, e de fazer generosas doações para instituições de caridade, David Gilmour é também conhecido pelo seu sentido de humor.

David Gilmour contou-me recentemente que um dia, estando de visita aos Estados Unidos, encontrava-se com alguns amigos num bar. De repente, aproximou-se dele um homem, já com alguns sinais de quem tinha bebido mais do que a sua conta, virou-se para ele e perguntou-lhe:
- Eu conheço-te, pá. Tu não és aquele gajo dos Pink Floyd?
- Sou! – admitiu.
- Eu sei o teu nome. Espera, não digas, deixa-me lembrar...
Fez-se silêncio por uns instantes, até que o homem exclamou:
- Já sei! És o Roger Waters, pá!!! Sou o teu fan número 1!!! Dás-me um autógrafo?
David Gilmour não se desmanchou e disse-lhe:
- Acertaste! É isso mesmo! Claro que te dou um autógrafo.
E quando o homem lhe estendeu um papel para que lhe desse o autógrafo, David Gilmour escreveu com a sua melhor caligrafia: “Roger Waters”.
E lá foi o homem, feliz da vida...

sexta-feira, 4 de março de 2005

 

A Testemunha de Acusação


A D. Silvina tinha uma pequena loja de pronto-a-vestir de senhora.
Não que precisasse: com os filhos já arrumados, o ordenado que o marido recebia no banco chegava perfeitamente para viverem confortavelmente. Ainda por cima com a reforma da mãe, que vivia com eles.
Mas era um aconchego ao orçamento familiar. E depois, sempre estava entretida.

Mas às vezes até uma pequena loja traz os seus problemas e causa os seus dissabores.

Foi o que aconteceu com o caso da D. Maria Ribeiro:
Não é que aquela malandra, que sempre tinha considerado amiga e uma pessoa séria, lhe tinha passado um cheque de 30 contos para pagamento de umas roupas, e o cheque tinha sido devolvido por falta de provisão?
Escreveu-lhe cartas sem fim, que ela já não atendia o telefone. Mandou-lhe recados por toda a gente que a conhecia. Nada!
Até que, quase a terminarem os seis meses, apresentou queixa crime.

Mais de três anos depois, foi chamada a julgamento na qualidade de testemunha do Ministério Público.
A arguida faltou e o julgamento foi adiado.
Na segunda data, novo adiamento. Ao que parece, nem sequer a tinham ainda conseguido notificar.
Seis meses depois, novo julgamento. E mais um adiamento.
Uma semana depois, outro ainda. Já era o quarto.
A loja fechada e as deslocações ao Tribunal, já lhe estavam mais caras que o raio dos 30 contos do cheque.

Uns tempos depois, recebeu um postal do Tribunal com a marcação das duas novas datas – mas somente para daí a um ano e três meses: uma quinta-feira e a segunda-feira seguinte.
Preocupada, colou o postal com um bocado de fita gomada ao pé do telefone.

No preciso dia em que o julgamento estava marcado, a mãe morreu.
Foi dar com ela caída ao fundo das escadas. Chamou os Bombeiros, que se limitaram a confirmar o óbito.
Claro que nem lhe passou pela cabeça o julgamento.

Como teve de ser feita autópsia e se meteu o fim de semana, o funeral foi marcado para segunda-feira. Saía da igreja lá da terra para o cemitério próximo.
A missa de corpo presente estava marcada para as 10 horas.

Ainda não eram 9 horas, entraram dois soldados da GNR na capela mortuária. Tinham um mandado para a conduzir ao Tribunal por causa do julgamento do cheque.

Um mandado? Mas ela não era a queixosa?
Pois, mas como tinha faltado na quinta-feira anterior, a juíza tinha-a condenado a pagar uma multa de 36 contos, e tinha ordenado que a GNR a fosse buscar, para não faltar outra vez.

Mas estava no funeral da mãe!
Não podiam os senhores agentes ter um bocadinho de compreensão?
Mas não, estavam só a cumprir ordens superiores.

Ao menos assistir à missa?
Não: a missa era às 10 e a essa hora já tinham de estar no tribunal.

Ninguém queria acreditar no que se estava a passar:
Completamente atónitos, todos viram a D. Silvina, debaixo de um choro incontrolável a ser arrancada ao funeral da própria mãe para ser conduzida ao Tribunal com um escolta da GNR, ainda por cima para ser testemunha num processo em que era queixosa.

Já depois das 11 da manhã chamaram-na à sala de audiências.
Sem conseguir deter as lágrimas, explicou à juíza que o que queria era estar no funeral da mãe, de onde tinha sido forçada a sair pela GNR.
Se calhar, àquela hora o funeral até já tinha acabado.
Mas a juíza explicou-lhe calmamente que era assim, e quais as obrigações legais de um cidadão perante a justiça.
Mas foi muita cordial com a D. Silvina: explicou-lhe que o Tribunal continuava sem descobrir o paradeiro da arguida para a notificar. Pediu-lhe desculpa e tudo.

E uma vez mais adiou o julgamento...

quinta-feira, 3 de março de 2005

 

Os Atrasos da Justiça


O juiz conselheiro Nunes da Cruz, que é candidato à presidência do Supremo Tribunal de Justiça, declarou à TSF que são os advogados os verdadeiros responsáveis pela morosidade da justiça.
Diz ainda o Sr. Conselheiro que já tem 40 anos de magistratura e que conhece bem e desde sempre o «expedientezinho e a diligenciazinhas dilatórias» que são utilizadas para retardar as decisões.

Ainda bem que os 40 anos de experiência do Sr. Conselheiro puderam iluminar-me tanto:
Fiquei agora a saber que, afinal, é por minha culpa que ainda não recebi uma sentença que aguardo do Tribunal de Loures há quase 14 meses; que é por minha culpa que espero há mais de 2 anos do Tribunal de Sintra por um simples despacho numa acção de despejo; que é por minha culpa que ainda não fui notificado pelo Tribunal do Seixal de uma conferência de interessados cuja marcação aguardo há quase 4 anos; e que é por minha culpa que ainda não recebi sequer a mínima notícia de nenhuma das dezenas de acções executivas que ando a intentar desde Setembro de 2003.
Será, portanto, uma boa notícia e uma autêntica iluminação para a justiça portuguesa, a nomeação do Sr. juiz Conselheiro Nunes da Cruz para a Presidência do S.T.J.

Mas fiquei a saber mais:
É que se aquilo que o Sr. Conselheiro diz é verdade, e ao fim e ao cabo é por culpa dos advogados que os processos estão parados nas secretarias dos tribunais e nos gabinetes dos juizes, isso só pode querer dizer que os funcionários judiciais e os juizes andam, afinal, com muito pouco que fazer, porque estão à espera, coitados, que os advogados despachem os processos...

Ainda bem, porque assim o Sr. Conselheiro teve tempo para dar uma entrevista a uma rádio... durante as horas de serviço...

quarta-feira, 2 de março de 2005

 

A Pena de Morte



O Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América acabou de decidir por escassa margem (5 votos a favor e 4 contra) proibir a pena de morte para menores de 18 anos.
Esta medida tem, para já, o alcance imediato de salvar a vida de 72 jovens que neste momento aguardavam execução no «corredor da morte».

Só nos podemos congratular com esta medida, reveladora de uma humanidade que já julgávamos difícil de encontrar no sistema judicial americano.

Pois não consideramos todos nós o direito à vida um direito absoluto e fundamental das sociedades civilizadas?
Pois não somos todos nós contra o aborto, pelo menos como mera forma de controle rotineiro de natalidade?
Não somos todos nós contra a eutanásia e contra a pena de morte?

Ou não somos?...

Lembro-me de ter lido nos jornais, talvez há mais de 10 anos o seguinte caso passado na Alemanha:
Numa pequena cidade, uma mãe, viúva, reportou às autoridades policiais o desaparecimento da sua filha de 12 anos de idade.
Uma onda de solidariedade percorreu a comunidade: todos participaram nas buscas, fizeram-se batidas sistemáticas nos bosques próximos e inúmeros apelos em toda a comunicação social.
Até que os piores receios se confirmaram: foi encontrado o cadáver da criança, com sinais de ter sido repetidamente violada, e barbaramente torturada e seviciada até à morte.
Uma onda de indignação percorreu o país e todo o mundo.
Muito mais quando se descobriu que o culpado era um amigo da família, que se tinha mostrado publicamente chocado com a morte da miúda, e tinha até participado activamente nas buscas.

A mãe da criança assistiu a todas as sessões do julgamento do assassino.
Todos admiraram aquela mulher que, com uma inegável coragem, e sem pronunciar sequer uma palavra, foi ouvindo da primeira fila da sala de audiências, com um estoicismo admirável, a descrição de todos os pormenores médicos e forenses do caso.
De vez em quando chorava silenciosamente, e era tudo. Principalmente quando era mostrada uma fotografia ou era descrito um pormenor mais chocante do caso.
Mas nunca proferiu uma palavra.

Na última sessão do julgamento foi lida a sentença, que considerou o arguido culpado, e o condenou a uma pesada pena de prisão.

Foi então que a mãe da criança se levantou lentamente.
Meteu a mão dentro da sua mala e dela tirou um revólver.
Aproximou-se calmamente do assassino acabado de condenar e desfechou-lhe seis tiros à queima roupa, causando-lhe morte imediata.
De seguida, atirou a arma para o chão, levantou os braços e entregou-se à polícia.

Foi por sua vez julgada, poucos meses depois.
Requereu tribunal de júri.
No final do julgamento, a decisão unânime dos jurados: foi absolvida!

Pergunto-lhe agora, caro leitor:
Se tivesse feito parte daquele júri, qual teria sido a sua decisão?
Também teria absolvido a mulher?
Ou, pelo contrário, tê-la-ia condenado?

terça-feira, 1 de março de 2005

 

Mar Adentro


O tema da eutanásia foi novamente relançado com a atribuição do Óscar da Academia para o melhor filme estrangeiro ao filme espanhol «Mar Adentro», do realizador Alejandro Amenábar.

Baseado numa história verídica, o filme relata a vida de Ramon Sanpedro, um tetraplégico que durante 26 anos lutou pelo direito a uma morte digna, mas que logrou conseguir somente com a ajuda de uma amiga e de um complicado esquema que ele próprio engendrou.

Mas se a história relatada no filme me chocou, leio também no «Independent» de hoje uma outra história de uma crueza absolutamente perturbante:

Andrew Wragg, um inglês de 36 anos e antigo militar, assistia há anos à progressiva decadência do seu filho Jacob, de 10 anos de idade, que sofria de uma doença degenerativa que em breve o levaria à morte no meio de grande sofrimento, o «síndroma de Hunter».
Esta doença, de progressão muito rápida, causa surdez, mudez, cegueira e dupla incontinência, até levar à agonia de uma morte por asfixia.

No dia 24 de Julho do ano passado, Andrew Wragg pediu à sua mulher que saísse de casa com o outro filho do casal. Depois, ingeriu uma considerável quantidade de álcool.
De seguida, sufocou o filho até à morte com uma almofada.
Finalmente, lavado em lágrimas, telefonou à mulher e contou-lhe o que tinha acabado de fazer.
Quando chegou a casa, a mulher deparou com o marido deitado na cama a chorar convulsivamente, agarrado ao corpo do filho.
Quando percebeu o acto do marido, somente lhe perguntou:
- Diz-me por favor que não o fizeste sofrer.
- Claro que não o fiz sofrer! - Respondeu.

Andrew Wragg, que está agora a ser julgado, telefonou imediatamente à Polícia a quem confessou prontamente o seu acto. Declarou que não tinha praticado mais do que a «morte piedosa» do filho, pois tinha-o olhado nos olhos e viu que para ele não havia qualquer futuro.
«Não me julguem até conhecerem todos os factos», pediu.
No entanto, a acusação alega que as emoções do pai, por mais compreensíveis que sejam, não podem constituir justificação para o homicídio do filho.

A eutanásia será sempre um tema polémico e muito delicado.
Haverá sempre diferentes justificações para a defesa das posições de quem a defende e de quem a afasta liminarmente, enquanto houver também diferentes interpretações para o que se deve considerar como o início e o fim da vida.
E até para o significado da própria vida.
Não a mera vida celular ou vegetativa, mas a vida com uma perspectiva de racionalidade, de consciência, de humanidade.
Terminará a vida com a morte cerebral? Terminará antes? E quando ocorre a morte cerebral?
E quem tem o direito de definir a oportunidade da morte de outro ser humano?
E terá alguém o direito de decidir a sua própria morte?
Teremos o direito de conferir dignidade à nossa própria morte?
Quando estão em discussão conceitos de ordem ética, nunca haverá consenso.

Mas, para mim, uma coisa é certa:
em casos limite, mais do que um acto de coragem, mais até do que um acto de humanidade ou de um imperativo de consciência, a eutanásia pode muito bem ser, antes de tudo... um acto de amor!

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