sexta-feira, 29 de setembro de 2006

 

O Paradoxo



O cancelamento em Berlim da exibição da ópera de Mozart «Idomeneu», sob o pretexto de que a sua exibição iria constituir «um risco com final imprevisível para os funcionários e o público», será talvez uma das mais significativas vitórias do fanatismo e do extremismo religioso.

De facto, este cancelamento demonstra que o Ocidente está inequivocamente refém do medo de desagradar a um bando de fanáticos.
Um medo de morte!
Um medo até de que uma simples manifestação cultural desencadeie uma reacção que leve ao assassinato puro e simples das pessoas que estejam mais ou menos envolvidas.

Mas a principal questão que se coloca é esta:
- E agora?

Quem será o próximo a recuar na exibição de uma ópera, ou a hesitar na publicação de um texto, na publicação de um cartoon, ou na realização de um filme, só porque eles podem ferir uma qualquer sensibilidade religiosa fanática, imbecil e doentia?

Que fazer para que mais nenhum encenador cancele um espectáculo?
Que fazer para que mais nenhum cineasta seja esfaqueado na rua?

Quantos mais mortos serão precisos?

Porque o que é facto é que o medo chegou, e a liberdade já está, neste momento, irremediavelmente perdida!
E o que é verdade é que não há resposta!

A não ser que, se não quisermos desistir, se não nos quisermos render, se não nos quisermos submeter e rebaixar a esta ignóbil chantagem, a resposta esteja afinal na própria negação dos valores e da cultura ocidentais.

A não ser que a intolerância religiosa de quem escolheu o Ocidente para viver e a quem acolhemos como iguais, com quem nos cruzamos na rua e cujos filhos andam com os nossos na escola, mas que mesmo entre nós quer «espalhar a fé com a espada», só se possa combater com outra intolerância religiosa ou com a intolerância do racismo ou da xenofobia.

A não ser que a resposta esteja neste infernal paradoxo!...


quinta-feira, 28 de setembro de 2006

 

Badajoz à Vista



Fiquei a saber pelo «Público» que existe em Portugal uma coisa interessantíssima auto-denominada «Associação Portuguesa de Famílias Numerosas».

(É curioso como esta expressão “auto-denominada” antes do nome de uma associação qualquer toma um sentido pejorativo interessantíssimo, não é?)

Ora, esta auto-denominada «Associação Portuguesa de Famílias Numerosas» pediu a demissão do ministro da Saúde, Correia de Campos, a quem acusa de "falta de senso" por defender a despenalização do aborto e querer incentivar os hospitais a aumentar a sua prática.

Segundo a auto-denominada «Associação Portuguesa de Famílias Numerosas», as declarações do ministro revelam "cegueira e falta de senso", uma vez que o aumento do número de abortos vai reduzir "a dramática taxa de natalidade" em Portugal, "financiando o gigantesco negócio das clínicas abortivas" através de dinheiros públicos.

Pois bem:
Não faço a mínima ideia o que leva algumas pessoas a pensar que por algum desígnio desconhecido da natureza foram bafejadas com uma inteligência invulgar só porque fazem parte de uma família com mais pessoas que a média, ou que por isso são dotadas de alguma espécie de autoridade moral acrescida.

Mas lá que acharam que deviam fazer uma associação e tudo, lá isso é verdade.
Não sei se lutam pelo aumento das famílias numerosas ou se pela sua diminuição, mas isso é lá com eles.

Mas que é a primeira vez que vejo alguém a manifestar-se contra a despenalização do aborto recorrendo não a opções pessoais ou de ordem ética ou filosófica, mas unicamente a critérios demográficos e de oportunidade financeira, isso é um facto.

Talvez por isso alguém devesse explicar a esta gente que mesmo que a despenalização não seja aprovada no referendo os abortos continuarão a ser feitos.
Serão é feitos em Badajoz, para quem os possa pagar, ou num qualquer vão de escada, para quem não possa.

Mas mais interessante ainda foi que o próprio presidente da tal auto-denominada «Associação Portuguesa de Famílias Numerosas», de nome Fernando Castro (decerto gente de muito boas e numerosas famílias) deu uma entrevista à «SIC Notícias» onde insinuou claramente, entre duas tiradas de linguagem muito brejeira que lá achou adequadas às circunstâncias, que Correia de Campos teria um interesse financeiro pessoal na instalação de clínicas em Portugal, destilando contra o ministro um ódio estranho e absolutamente invulgar.

É caso para perguntar se esta auto-denominada «Associação Portuguesa de Famílias Numerosas» com o afã com que se abespinha a lutar contra a despenalização do aborto em Portugal não terá algum interesse financeiro nas clínicas de Badajoz...


terça-feira, 26 de setembro de 2006

 

A «joint venture»



Com uma habilidade diplomática notável, o Papa Bento XVI lá conseguiu, pelo menos por agora, acalmar os protestos que um pouco por todo o mundo islâmico se levantaram com as citações de imperadores bizantinos que agora resolveu começar para aí a fazer.

Sem ter de se retractar ou de pedir desculpa - e também sem ter a coragem suficiente para endireitar as costas e assumir alto e bom som que efectivamente aquilo que disse é aquilo que pensa (ele e toda a gente), e que é verdade que os muçulmanos não têm feito outra coisa ao longo da História que não «espalhar a fé usando a espada» - é de facto absolutamente notável como Ratzinger com uma simples reunião com duas dúzias de sujeitos vestidos de robe de seda e de toalha na cabeça conseguiu esvaziar de importância uma polémica que correu mundo.

Bastou-lhe, inteligentemente e com um discurso cheio de lugares-comuns, apelar ao diálogo ecuménico entre todas as religiões face aos «desafios que todos juntos têm de enfrentar».

Para aplacar aquela gente, o Papa não teve mais do que lhes propor a criação de uma espécie de joint-venture de multinacionais da exploração crendice das pessoas, um grande monopólio mundial de todas as religiões, finalmente unidas por aquilo que realmente todas elas têm em comum:

- O uso da espada para espalhar a fé!


segunda-feira, 25 de setembro de 2006

 

O Ministério Público que temos



Enganam-se os que pensam que foi Souto Moura quem trouxe ao Ministério Público a reputação de que este actualmente goza na sociedade portuguesa.

Souto Moura, é verdade, teve o condão de levar o Ministério Público ao descalabro total.
Estrutura organicamente hierarquizada, o Ministério Público encontrou em Souto Moura um líder despersonalizado, apático e mole, que o transformou numa casa sem rei nem roque.

Se o seu antecessor, Cunha Rodrigues, era muitas vezes acusado de fazer uma gestão política e oportunística de processos, o que é facto é que Souto Moura levou o seu mandato a não fazer gestão nenhuma.

Mas se com Souto Moura o Ministério Público bateu no fundo, sim, o que é facto é que a sua fama já vem de longe.

Ao longo dos tempos o Ministério Público transformou-se numa estrutura corporativa pesada, fechada para si própria e, pelos vistos, profundamente ineficiente.
E dominada por interesses político-sindicais, que inevitavelmente se confundem com interesses partidários, sempre mais interessados em fazer reivindicações laborais e salariais do que pugnar por uma eficiente reforma da Justiça.

Os procuradores do Ministério Público chamam-se galhardamente a si próprios «magistrados», embora, estou convencido, nenhum deles saiba bem o que isto quer dizer.
Talvez porque entram nas salas de audiências pela mesma porta e ao mesmo tempo que o juiz e se sentam “lá em cima” ao pé dele.
Embora nenhum deles, estou convencido, saiba bem porque é que isso acontece, o que é facto é que esta situação lhes dá uma de sensação de conforto e superioridade em relação às pessoas para quem olham lá de cima.

Mas, ao mesmo tempo e ainda que inconscientemente, acabam por interiorizar uma espécie de subordinação quase hierárquica em relação ao juiz, a quem louvaminham e temem reverencialmente, ao ponto de se esquecerem que até entrarem na sala de audiências pensavam que eram uma «magistratura independente».

Lá do alto, entre a subordinação ao juiz e o olhar de superioridade cá para baixo, os procuradores do Ministério Público transformaram-se a si próprios nos sargentos da justiça!

Então como corporação pelos vistos não há melhor que o Ministério Público: titulares constitucionais da iniciativa e do exercício da acção penal, dá a ideia que qualquer dos seus membros goza de total imunidade.
Aliás uma imunidade tanto penal como disciplinar ou laboral.

Alguma vez algum procurador foi responsabilizado por ter deixado prescrever um processo?
Mas sabemos que todos os anos prescrevem processos aos milhares, pela simples inacção de quem os devia instruir.

Que juízo haverão de fazer os portugueses do seu Ministério Público quando vêm um criminoso sair em liberdade por irregularidades processuais nas escutas que o incriminavam?

Alguma vez algum procurador foi punido disciplinarmente por ter feito um inquérito incompetente?
Mas sabemos que todos os dias aparece mais um processo investigado com uma incompetência confrangedora.
Basta pensarmos nos casos FP 25, Fátima Felgueiras ou ponte de Entre-os-Rios.
E no caso Casa Pia, avocado por Souto Moura para a sua responsabilidade pessoal.
E poderá o Ministério Público queixar-se da reputação que sob Souto Moura granjeou entre os portugueses depois da gestão desastrosa e até risível do caso «Apito Dourado»?

E se é o Ministério Público quem representa o Estado numa acção judicial, como pode Souto Moura deixar impune um procurador que em representação institucional do Estado Português, tem a autêntica lata de dizer numas alegações de recurso que «é preferencialmente no seio do casamento que deve ser feita a procriação»?

E que pensará o Ministério Público de si próprio face ao autêntico passador em que se transformou o «segredo de justiça?»?
Que pensará das informações cuidadosamente passadas a conta-gotas para a comunicação social, com um critério de oportunidade tal que não deixa margem para dúvidas a quem interessa?
Tudo isto sempre sob o silêncio complacente – e por isso cúmplice – de Souto Moura.

O regabofe é de tal dimensão que até já perderam a vergonha:
Sem qualquer pudor, o Ministério Público mostra que se está positivamente a borrifar para o próprio Presidente da República quando este, no «Caso do Envelope 9» lhe pede urgência numa investigação.
Sem pestanejar, o Ministério Público até faz de conta que não percebe que o pedido do Presidente da República previa também no mesmo caso uma investigação e uma responsabilização disciplinar.
Mas isso poderia lixar alguém cá da malta da corporação. Por isso, o melhor é assobiar para o lado e fingir que não percebemos.

Depois, seria até interessante saber como é que apareceu escarrapachada num jornal uma notícia de algo que constava de um processo em segredo de justiça.
Terá sido um funcionário judicial?
Terá sido um procurador do Ministério Público?
Terá sido o juiz de instrução?

Bem: alguém foi!
Quem contou ao jornalista?
Terá sido por dinheiro? Terá sido por amor?

Mas não:
Assim numa espécie de despedida em grande de Souto Moura, assim numa espécie de saída em apoteose com fogo de artifício e tudo, o Ministério Público tem a autêntica lata de oito meses depois vir contar aos portugueses que a violação do segredo de justiça é tudo culpa... dos jornalistas!

É neste clima que Pinto Monteiro, cuja nomeação vinda da magistratura judicial é, ela própria, um autêntico soco no estômago do Ministério Público, vai iniciar as suas novas funções e tem a oportunidade única para fazer um excelente lugar como novo Procurador Geral da República:

- É que com este Ministério Público, pior é impossível!


sexta-feira, 22 de setembro de 2006

 

A Filha de Lucy



A «National Geographic» revelou que uma equipa de paleontropólogos descobriu na Etiópia já em Dezembro de 2000 um esqueleto daquela que acreditam ser a criança mais antiga do mundo, como 3,3 milhões de anos, e que pertence à espécie «Australopithecus Afarensis».

Este esqueleto é cerca de 100.000 anos mais antigo que o da famosa “Lucy” e foi encontrado a escassos 10 quilómetros do local onde este tinha sido descoberto já em 1974.
Pertenceu a uma criança do sexo feminino que teria apenas 3 anos de idade quando morreu, está admiravelmente bem preservado e completo, incluindo o seu crânio.

A importância da descoberta do esqueleto desta criança, a quem os cientistas, chamam já «a filha de Lucy», é absolutamente inegável:

Para os cientistas, veio reafirmar as teorias evolucionistas, já desenvolvidas com a descoberta do esqueleto de «Lucy» há mais de 30 anos, e veio dar novas pistas sobre a forma como se desenvolveram e evoluíram os nossos ancestrais.

Para os criacionistas, principalmente após a recriação das feições dos «Australopithecus Afarensis», veio criar novas perspectivas sobre o verdadeiro significado do ensinamento bíblico de que o Homem foi criado à imagem e semelhança de Deus...


quinta-feira, 21 de setembro de 2006

 

A Coerência



Dizem para aí que o golo com que o Paços de Ferreira derrotou o Sporting por 1-0 no passado fim de semana foi marcado com o braço.

O Sporting está indignado.
E com toda a razão.

Pela voz de João Moutinho, o Sporting diz-se «injustiçado».
Pela voz de Filipe Soares Franco, o Sporting manifesta-se «indignado» e afirma que no futebol português não existe «fair play»
E vai mais longe: invocando exemplos do futebol inglês, o Sporting pretende agora que o Paços de Ferreira tome a iniciativa de requerer à Liga de Futebol a repetição do jogo, para assim se repor a «verdade desportiva».

É, de facto, uma excelente sugestão:
Seria uma maneira de devolver a credibilidade ao futebol português e de até, quem sabe, poder mesmo vir a diminuir os sucessivos «erros de arbitragem», sempre envoltos em polémica e suspeições várias.

E pronto:
Feita esta sugestão, aguarda-se agora a todo o momento anúncio formal e solene por parte do Sporting Clube de Portugal de, a bem da coerência, da verdade desportiva e do «fair play», ser agora ele próprio o primeiro a requerer à Liga de Futebol a repetição do jogo da jornada anterior com o Nacional da Madeira.

É que, como é sabido, neste jogo foi o Sporting quem derrotou o Nacional, também por 1-0, com um golo imediatamente precedido de uma falta claríssima que o árbitro entendeu por bem não assinalar.
Como é óbvio, esta derrota injusta e completamente desligada da «verdade desportiva» também deixou o Nacional «injustiçado» e «indignado».
O que o Sporting, a bem da coerência de princípios e que não necessita de favores dos árbitros para ganhar ao Nacional, não quer obviamente que suceda.

Daí, esta notável iniciativa do Sporting, que não precisa de exemplos do futebol inglês para nada e quer ser o primeiro e repor a «verdade desportiva» e a dar o exemplo de coerência e de «fair play», pois se exige a repetição do jogo com o Paços de Ferreira, é também o primeiro a pretender igualmente a repetição do jogo com o Nacional da Madeira.

Isto sim, isto é que é «fair play»
Isto sim, isto é que é repor a «verdade desportiva».
Isto sim, isto é que é coerência!

Ah, ganda Sporting!!!


quarta-feira, 20 de setembro de 2006

 

Os Direitos Adquiridos



Ainda a propósito do debate sobre o estado da educação em Portugal, o «Expresso» noticia esta semana que a ministra da Educação enviou já para promulgação um decreto-lei que visa a reconversão profissional dos professores incapacitados para dar aulas e a sua transferência das escolas para outros serviços da Administração Pública.

Existem neste momento cerca de dois mil professores que, embora tenham sido submetidos a juntas médicas que atestaram a sua incapacidade para dar aulas, continuam a permanecer nas escolas a que estão afectos e a receber o seu vencimento ao fim do mês.
E entre uns trabalhitos na biblioteca ou a fazer as contas da cantina, por lá se arrastam o dia todo a fazer não se sabe bem o quê.

O que o Ministério da Educação pretende, é precisamente acabar com esta insólita situação, e aproveitar e rentabilizar a força de trabalho destes professores para tarefas que possam efectivamente desempenhar, estando mesmo prevista a realização de novas juntas médicas e a frequência de cursos de formação para adaptação aos novos postos de trabalho.

Como não podia deixar de ser, os sindicatos dos professores acham muito bem a situação que actualmente se verifica e estão veementemente contra esta iniciativa da ministra da Educação.

Provavelmente porque pretendem defender o direito adquirido e inalienável de cada um destes professores continuar a receber o seu vencimento para passar o dia na escolas a roçar o cu pelas paredes.

Não é com certeza por demais repetir:
- Senhora ministra: por favor, não desista!


terça-feira, 19 de setembro de 2006

 

Não desista!



No «Prós e Contras» houve debate sobre o estado da educação em Portugal.

Mesmo tendo sido um debate quase sempre morno, serviu antes de mais para reafirmar o que aqui tenho dito sobre os diversos intervenientes nestas águas da educação, ultimamente tão agitadas:

Sobre o que tenho dito do notável trabalho que esta ministra tem desenvolvido e sobre uma coragem que raramente se tem visto em governantes portugueses.

Sobre os professores e a inércia com que lutam contra tudo o que lhes cheire a mudança ou a avaliação do seu desempenho.
E sobre o autismo com que sacodem a água do capote e se desresponsabilizam do atraso endémico de há décadas da educação portuguesa.
E sobre o autêntico desplante com que afirmam que o insucesso escolar de uma determinada disciplina não se deve ao professor abandalhado e que deu 40% das aulas que devia ter dado, porque, como toda a gente sabe,«a culpa» é da ministra.
E sobre a sua mais recente postura, como agora tanto tenho ouvido, de declararem alto e bom som e com um ódio previamente bem destilado, que «ai é assim que a ministra quer? Então a partir de agora estou-me nas tintas para isto!».

E, finalmente, sobre os sindicatos e o seu persistente anquilosamento ideológico.
E sobre a sua mais que suspeita intenção de nivelamento da classe dos professores pela mediocridade, sem perceberem que nos últimos anos mais não têm feito do que contribuir para o desprestígio - certamente injusto - da própria classe que era suposto representarem.

Por tudo isto, talvez não seja por demais repetir as palavras de Miguel Sousa Tavares aqui reproduzidas na semana passada:

- Senhora ministra: por favor, não desista!


segunda-feira, 18 de setembro de 2006

 

O feitiço contra o feiticeiro



«Mostra-me o que Maomé trouxe de novo, e verás apenas coisas más e desumanas, como a sua ordem de divulgar a fé usando a espada»
É esta a citação feita pelo Papa Bento XVI das palavras de um imperador bizantino do século XIV, e que tanta polémica têm causado por esse mundo fora.

Ora bem:
Não está em causa se era bem isto que o Papa queria dizer, ou se as suas palavras foram retiradas de um contexto que até pretendia dizer o contrário.

Até porque estas palavras correspondem cristalinamente à verdade dos factos!

E, quer correspondessem quer não, estava o Papa no pleno direito de as proferir, possam elas ser ou não interpretadas como uma blasfémia para os muçulmanos.

Também não está em causa que as mesmíssimas palavras se aplicam ponto por ponto ao cristianismo:
Ao longo dos últimos dois mil anos, a História dos homens está manchada do sangue de milhares, de milhões de pessoas, derramado pela determinação cega dos cristãos em «divulgar a sua fé usando a espada» e em aniquilar sem piedade todos os que se lhe opuseram ou simplesmente eram de um credo diferente.

Mesmo ainda hoje, no século XXI, a Igreja Católica não desistiu de tentar moldar a vida das sociedades, procurando impor-lhes a sua ética religiosa e lutando pela implementação de Estados confessionais, mais ou menos disfarçados.
Que é precisamente, aliás, o que acontece na quase totalidade dos países muçulmanos.

O que está em causa é uma coisa completamente diferente:
O que se passa é que uma vez mais o mundo ocidental está refém de fanáticos religiosos.

E com um medo de morte, apressam-se agora os desmentidos e os pedidos velados de desculpas, tentando apaziguar a turba ululante dos fanáticos ofendidos pelas blasfemas palavras do Papa.

Uma vez mais o Ocidente tem medo.
E uma vez mais olha assustado e em pânico sobre o ombro, sem saber se deve temer o vizinho do lado, que toda a gente sabe que é muçulmano.

O que está em causa é que ninguém tem dúvidas que o Papa pensa sobre os muçulmanos exactamente aquilo que significam as palavras que citou.
O que não tem é coragem, ou talvez a liberdade suficiente para o admitir.
Ironia do destino, talvez agora o Papa tenha de engolir as suas próprias palavras quando perorou contra a liberdade de expressão quando em confronto com as religiões e os dogmas religiosos.
Simplesmente porque tem medo que lhe atirem com um avião para cima da Basílica de São Pedro.

O que está verdadeiramente em causa é saber o que ainda estamos dispostos a fazer pela defesa do nosso Estado de Direito, dos nossos valores civilizacionais e da nossa liberdade.
Ou se pura e simplesmente fomos já vencidos por esta ignóbil chantagem pelo terror.


quinta-feira, 14 de setembro de 2006

 

O Exorcista



Segundo o «Daily Mail», o chefe dos exorcistas do Papa Bento XVI, o padre Gabriele Amorth, acaba de revelar ao mundo que tanto Hitler como Estaline estavam possuídos pelo Demónio.

De acordo com este especialista na matéria, o Diabo existe de facto e tanto pode possuir uma pessoa individualmente como até grupos de pessoas.

Mas este santo homem, que é presidente de uma coisa curiosíssima chamada «Associação Internacional dos Exorcistas», e que muito recentemente clamou veementemente contra os satânicos livros de Harry Potter, vai ainda mais longe: revelou também que durante a guerra o Papa Pio XII, ele próprio pessoalmente, tentou o exorcismo de Adolf Hitler à distância.

Contudo, explicou ainda o exorcista-chefe do Vaticano, é muito raro que as orações e os exorcismos funcionem efectivamente a grande distância. É que uma das exigências do exorcismo é precisamente a presença física da pessoa que está possuída e também que esta queira ser exorcizada.

Ainda assim, piamente convencido de que Hitler estava possuído pelo Demónio, o Papa Pio XII não hesitou em tentar o seu exorcismo.
Infelizmente, por muito que invocasse a ajuda de Deus Todo Poderoso para libertar o espírito de Hitler de tão demoníaca possessão, a grande distância a que estava do ditador nazi tornou infrutíferas todas as suas tentativas.

É pena!
Mais um bocadinho e teria sido possível abreviar a 2ª Guerra Mundial e provavelmente ter-se-iam evitado muitos milhões de mortos.
O Papa Pio XII bem tentou pedir a ajuda de Deus.
Mas não foi possível.
Estava muito longe e infelizmente Deus não pôde ouvir as suas preces: provavelmente não havia rede...


quarta-feira, 13 de setembro de 2006

 

Uma citação e uma sugestão



Extracto do artigo de Miguel Sousa Tavares, publicado no «Expresso» do passado sábado:


«A ministra da Educação tem uma proposta simples:
Que os professores entrem e progridam na carreira, não em função de um direito natural ou da antiguidade, mas do mérito. Dos resultados obtidos, das aulas dadas, das provas prestadas.

Antes mesmo de conhecerem os detalhes da proposta, já os Sindicatos dos Professores estavam a ameaçar com “a maior greve que o país jamais viu”.

Nesta resposta sindical, além da já intragável atitude sistemática da Fenprof e do indigerível Paulo Sucena, encontramos a própria resposta à razão da decadência continuada do movimento sindical.
Porque o mundo mudou, mas eles continuam a defender o mesmo de sempre: o “colectivo”, a “luta de massas”, os que têm emprego garantido até à eternidade, os que acham que todos devem ser tratados por igual, quer trabalhem e se esforcem quer vivam de meter “baixas” e fazer greve sem razão.

Só um mau trabalhador teme uma selecção baseada no mérito: os bons não temem, e, por isso, os bons não estão hoje nos Sindicatos.
Não é uma boa notícia, é uma má notícia: os maus patrões agradecem.

Há trinta anos que a política de educação neste país está sequestrada pelos Sindicatos dos Professores. E essa é uma das razões evidentes do nosso atraso e subdesenvolvimento.

Senhora ministra: por favor, não desista».



E pronto.
Posto isto, e uma vez que os sindicatos dos professores anunciaram já a sua intenção inequívoca de fazer uma nova greve, resta-me fazer aqui uma sugestão amiga a todos os professores:

- Façam greve já no próximo dia 6 de Outubro.
Não só o dia 6 de Outubro calha a uma sexta-feira, como o dia 5 de Outubro é feriado.
Dá cá um fim de semana prolongado do catano!


terça-feira, 12 de setembro de 2006

 

O Pato da Justiça



De súbito o grande segredo de Estado foi revelado:
Em preparação há largos meses, com um sigilo quase esotérico, ciosamente guardado tal como o impunham os altos interesses do Estado (o que, como toda a gente sabe, não está ao alcance de todos), José Sócrates e Marques Mendes assinaram com pompa e circunstância – e uma conveniente cobertura mediática – uma coisa fantástica a que chamaram «pacto para a justiça».

Até o «Expresso» lhe chama mesmo "um Bloco Central inesperado"!
E continua entusiasmado: «Sócrates rendeu-se ao diálogo, e o Governo até já reconhece o PSD como interlocutor privilegiado».

Reconhece mas é uma ova!

Este pacto deve constituir uma das mais notáveis manobras políticas de Sócrates: com uma só cajadada matou uma data de coelhos.

Repare-se:

Começou por limpar a desgastada imagem de Alberto Costa, frequentemente apontado como estando em primeiro lugar para cair da carroça numa próxima remodelação do Governo. Sem se rir, Sócrates não poupou os maiores elogios ao ministro da Justiça no próprio discurso de apresentação do pacto, com Marques Mendes ao lado e tudo.
E de repente, afinal tudo vai bem no Ministério da Justiça!

Depois, limpou a sua própria imagem de arrogância e a sua fama de se recusar a dialogar.
De um dia para o outro, Sócrates passou a ser um líder dotado de um alto sentido de Estado. Afinal, lá no fundo, as tais grandes reformas com que o Primeiro-ministro anda a “abanar” o país devem ser boas: pois não é que a oposição as apoia e tudo?
Afinal, até “os outros” são a favor do que o Sócrates anda a fazer; só que, pelos vistos, até agora ninguém tinha tido coragem para o assumir.

Como se não bastasse, até Cavaco Silva não hesitou em reclamar para si próprio alguns dos louros deste «consenso alargado», também ele a ajudar a passar esta nova imagem de diálogo, tolerância, cooperação e até de grandiosidade institucional do Primeiro-ministro.

Até o facto de ter ignorado os mais pequenos partidos com assento parlamentar – o PCP, o Bloco de Esquerda e o CDS – foi um autêntico golpe de mestre por parte de José Sócrates.

Até parece que, de um dia para o outro, o país ficou a conhecer a mais completa irrelevância destes partidos para os mais altos desígnios da política nacional.
E como se não bastasse, todos eles ainda caíram na esparrela armada por Sócrates quando recusaram a oportunidade de colaboração que lhes foi sugerida pelo Primeiro-ministro na concretização das reformas que se vai seguir.
Afinal, e pelos vistos, mais importante que a colaboração nas grandes reformas do país, tão gentilmente oferecida pelo Primeiro-ministro, é a indignação destas donzelas ofendidas.
Então quem é que estes tipos pensam que são? Pensam que sem eles a reforma não se faz?

Finalmente, se o PSD pensa que a assinatura deste pacto lhe granjeou novos dividendos políticos, está redondamente enganado.
Para já, logo no dia seguinte o PSD ficou a saber que a sua importância não é assim tão grande como isso: Sócrates já deu a entender que não vai haver mais pacto nenhum quando afirmou que vai levar a reforma da Segurança Social ao Parlamento tal e qual ela está gizada pelo Governo.
E quem quiser votar a favor vota, quem não quiser vota contra.

Ao mesmo tempo, quando assinou o pacto, mais do que passar uma imagem de grandeza e de colaboração institucional imposta pela sua grande responsabilidade e sentido de Estado enquanto líder da oposição, Marques Mendes demonstra não mais que não há qualquer lógica em falar-se em alternativa política quando, afinal, Sócrates vai no bom caminho.

Mais do que isso, ali ao lado a botar discurso ao lado do Primeiro-ministro só revelou subserviência face à pose magnânima e condescendente de Sócrates.
Porque toda a gente sabe – e Marques Mendes também o sabe – que lá no fundo Sócrates vai daqui para a frente fazer as reformas da justiça como muito bem lhe apetecer e der na real gana.

Porque com este pacto o que Sócrates só quer é que entretanto Marques Mendes esteja calado e não o chateie!


segunda-feira, 11 de setembro de 2006

 

11 de Setembro



Esta é uma das mais espectaculares homenagens ao 11 de Setembro que já vi.
A música de fundo chama-se «Goodbye Blue Sky» do álbum «The Wall».
Dos Pink Floyd, claro.

O vídeo é da autoria do Joe, do site Pink Floyd & Co.




sexta-feira, 8 de setembro de 2006

 

O Aeroporto



Como toda a gente sabe, Portugal é um Estado laico por exigência constitucional.
Por isso, uma das grandes curiosidades do nosso laicismo é o actual nome do aeroporto que se situa perto da cidade de Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, nos Açores.

Chama-se nada mais nada menos do que «Aeroporto João Paulo II».

Construído há várias décadas, este aeroporto foi aberto ao tráfego civil em 1969 com o nome de «Aeroporto de Nordela».

Mas porque raio, é de perguntar, tem agora o coitado do aeroporto, que não fez mal a ninguém, o nome de João Paulo II?
A resposta é simples: porque na década de 90 Karol Wojtyla resolveu visitar a ilha de São Miguel e, como ia de avião, a malta da logística lá deve ter achado que o melhor era utilizarem o aeroporto.

Foi então que algum beato da Opus Dei, que naquela altura teria algum poder de decisão e que certamente queria ganhar um lugar no Céu, achou que o momento era bom demais para ser desperdiçado.
Vai daí, pimba: mudou o nome ao aeroporto!

E porquê o nome de João Paulo II?
Sim, já vimos que o Papa passou por ali.

Mas então a intenção era homenagear o chefe de Estado do Vaticano?
Então o que fez este Chefe de Estado do Vaticano pelos Açores, para merecer esta homenagem?
Bem: assim de repente não imagino nada.

Foi então intenção homenagear o líder da religião católica?
Então e o que fez este líder da religião católica pelos Açores, para merecer esta homenagem?
Bem: assim de repente também não vejo nada.

Foi por João Paulo II ter passado pelo aeroporto?
Então, se é por causa disso, é por mero acaso que o aeroporto não se chama Fidel Castro ou Papa Doc, Chefes de Estado de países atlânticos, colegas dos Açores.
Como é também por mero acaso que o aeroporto não se chama Aga Khan ou Alexis II, que são também líderes religiosos igualmente muito bem vistos por esse mundo fora, e com toda a certeza com fiéis nos Açores.

Uma coisa é certa: não há razão nenhuma para um aeroporto português ter o nome de um líder religioso ou de um Chefe de Estado estrangeiro.
Acho mesmo que o aeroporto devia mas é mudar de nome, e era já!
Nem que fosse para «Aeroporto Carlos César».
Podia até ser para «Aeroporto Mota Amaral».

Para mim, podia até levar o nome do primeiro gajo que tivesse tomates para mudar o nome ao raio do aeroporto!


quarta-feira, 6 de setembro de 2006

 

Consciência de Classe



Eis a parte final de uma sentença provinda de um tribunal não muito longe daqui, e de que ontem mesmo fui notificado.
Diga-se de passagem que esta sentença foi proferida largos meses após a realização da audiência de julgamento.

Reza assim:


«Acumulação de serviço pela circunstância de ter deixado de laborar fora do período de horário normal, bem como em feriados e fins de semana na minha residência, aderindo, assim, à deliberação votada no dia 18-6-2005, em Assembleia Geral Extraordinária da Associação Sindical dos Juizes Portugueses».


É, de facto, notável.

Tão notável que não me admirava nada de ainda um dia ver uma declaração de teor semelhante provinda de um fiel e cumpridor membro de um qualquer “Sindicato dos Membros do Governo” ou de uma qualquer “Associação Sindical dos Deputados da Nação”.

Porque uma coisa é certa:
Mesmo quando se trata de titulares de órgãos de soberania, a consciência de classe é uma coisa muito bonita!


segunda-feira, 4 de setembro de 2006

 

Vamos lá a ter calma:



Depois de um mês de férias, não é assim de repente que um Blog entra em velocidade de cruzeiro!




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