segunda-feira, 25 de setembro de 2006

 

O Ministério Público que temos



Enganam-se os que pensam que foi Souto Moura quem trouxe ao Ministério Público a reputação de que este actualmente goza na sociedade portuguesa.

Souto Moura, é verdade, teve o condão de levar o Ministério Público ao descalabro total.
Estrutura organicamente hierarquizada, o Ministério Público encontrou em Souto Moura um líder despersonalizado, apático e mole, que o transformou numa casa sem rei nem roque.

Se o seu antecessor, Cunha Rodrigues, era muitas vezes acusado de fazer uma gestão política e oportunística de processos, o que é facto é que Souto Moura levou o seu mandato a não fazer gestão nenhuma.

Mas se com Souto Moura o Ministério Público bateu no fundo, sim, o que é facto é que a sua fama já vem de longe.

Ao longo dos tempos o Ministério Público transformou-se numa estrutura corporativa pesada, fechada para si própria e, pelos vistos, profundamente ineficiente.
E dominada por interesses político-sindicais, que inevitavelmente se confundem com interesses partidários, sempre mais interessados em fazer reivindicações laborais e salariais do que pugnar por uma eficiente reforma da Justiça.

Os procuradores do Ministério Público chamam-se galhardamente a si próprios «magistrados», embora, estou convencido, nenhum deles saiba bem o que isto quer dizer.
Talvez porque entram nas salas de audiências pela mesma porta e ao mesmo tempo que o juiz e se sentam “lá em cima” ao pé dele.
Embora nenhum deles, estou convencido, saiba bem porque é que isso acontece, o que é facto é que esta situação lhes dá uma de sensação de conforto e superioridade em relação às pessoas para quem olham lá de cima.

Mas, ao mesmo tempo e ainda que inconscientemente, acabam por interiorizar uma espécie de subordinação quase hierárquica em relação ao juiz, a quem louvaminham e temem reverencialmente, ao ponto de se esquecerem que até entrarem na sala de audiências pensavam que eram uma «magistratura independente».

Lá do alto, entre a subordinação ao juiz e o olhar de superioridade cá para baixo, os procuradores do Ministério Público transformaram-se a si próprios nos sargentos da justiça!

Então como corporação pelos vistos não há melhor que o Ministério Público: titulares constitucionais da iniciativa e do exercício da acção penal, dá a ideia que qualquer dos seus membros goza de total imunidade.
Aliás uma imunidade tanto penal como disciplinar ou laboral.

Alguma vez algum procurador foi responsabilizado por ter deixado prescrever um processo?
Mas sabemos que todos os anos prescrevem processos aos milhares, pela simples inacção de quem os devia instruir.

Que juízo haverão de fazer os portugueses do seu Ministério Público quando vêm um criminoso sair em liberdade por irregularidades processuais nas escutas que o incriminavam?

Alguma vez algum procurador foi punido disciplinarmente por ter feito um inquérito incompetente?
Mas sabemos que todos os dias aparece mais um processo investigado com uma incompetência confrangedora.
Basta pensarmos nos casos FP 25, Fátima Felgueiras ou ponte de Entre-os-Rios.
E no caso Casa Pia, avocado por Souto Moura para a sua responsabilidade pessoal.
E poderá o Ministério Público queixar-se da reputação que sob Souto Moura granjeou entre os portugueses depois da gestão desastrosa e até risível do caso «Apito Dourado»?

E se é o Ministério Público quem representa o Estado numa acção judicial, como pode Souto Moura deixar impune um procurador que em representação institucional do Estado Português, tem a autêntica lata de dizer numas alegações de recurso que «é preferencialmente no seio do casamento que deve ser feita a procriação»?

E que pensará o Ministério Público de si próprio face ao autêntico passador em que se transformou o «segredo de justiça?»?
Que pensará das informações cuidadosamente passadas a conta-gotas para a comunicação social, com um critério de oportunidade tal que não deixa margem para dúvidas a quem interessa?
Tudo isto sempre sob o silêncio complacente – e por isso cúmplice – de Souto Moura.

O regabofe é de tal dimensão que até já perderam a vergonha:
Sem qualquer pudor, o Ministério Público mostra que se está positivamente a borrifar para o próprio Presidente da República quando este, no «Caso do Envelope 9» lhe pede urgência numa investigação.
Sem pestanejar, o Ministério Público até faz de conta que não percebe que o pedido do Presidente da República previa também no mesmo caso uma investigação e uma responsabilização disciplinar.
Mas isso poderia lixar alguém cá da malta da corporação. Por isso, o melhor é assobiar para o lado e fingir que não percebemos.

Depois, seria até interessante saber como é que apareceu escarrapachada num jornal uma notícia de algo que constava de um processo em segredo de justiça.
Terá sido um funcionário judicial?
Terá sido um procurador do Ministério Público?
Terá sido o juiz de instrução?

Bem: alguém foi!
Quem contou ao jornalista?
Terá sido por dinheiro? Terá sido por amor?

Mas não:
Assim numa espécie de despedida em grande de Souto Moura, assim numa espécie de saída em apoteose com fogo de artifício e tudo, o Ministério Público tem a autêntica lata de oito meses depois vir contar aos portugueses que a violação do segredo de justiça é tudo culpa... dos jornalistas!

É neste clima que Pinto Monteiro, cuja nomeação vinda da magistratura judicial é, ela própria, um autêntico soco no estômago do Ministério Público, vai iniciar as suas novas funções e tem a oportunidade única para fazer um excelente lugar como novo Procurador Geral da República:

- É que com este Ministério Público, pior é impossível!




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