segunda-feira, 15 de março de 2010

 

A coragem de não tomar posição



O Presidente da República decidiu requerer ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade das normas dos artigos 1.º, 2.º, 4.º e 5.º do Decreto n.º 9/XI da Assembleia da República, que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

E cá temos mais uma das já típicas e peculiares iniquidades deste Presidente.
Infelizmente já sempre esperadas.

Repare-se que o Presidente da República não requereu a fiscalização da constitucionalidade das normas do Decreto relativas à adopção.
E todos sabemos porquê: pura e simplesmente porque seria certo e sabido que, essas sim, o Tribunal Constitucional declararia inconstitucionais, passando automaticamente a ser permitida a adopção também por casais do mesmo sexo.

Se nalguma coisa há acordo unânime – da esquerda à mais empedernida direita – é sobre a mais do que óbvia inconstitucionalidade da exclusão da possibilidade de adopção por parte de casais homossexuais que o Partido Socialista fez incluir no projecto de lei aprovado na Assembleia da República.
O que, como todos sabemos, fez unicamente por motivos políticos que não lhe ficaram nada bem.


Porque enviou então o Presidente da República estas precisas normas, basicamente as que retiram a expressão «de sexo diferente» da definição de casamento do artigo 1.577º do Código Civil (e só essas), para apreciação do Tribunal Constitucional?

Uma coisa todos sabemos, incluindo o Presidente: o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre isso em sede de fiscalização concreta da inconstitucionalidade dessa norma quando decidiu:
«[...] Mas a recepção constitucional do conceito histórico de casamento como união entre duas pessoas de sexo diferente radicado intersubjectivamente na comunidade como instituição não permite retirar da Constituição um reconhecimento directo e obrigatório dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, sem todavia proibir necessariamente o legislador de proceder ao seu reconhecimento ou à sua equiparação aos casamentos».

Ora, se o Presidente da República sabe isto muito bem, porque enviou ele então o decreto para o Tribunal Constitucional, solicitando-lhe que se pronunciasse outra vez sobre o que já se pronunciou?
É muito simples: porque não teve coragem nem de promulgar nem de vetar politicamente o decreto.
E então simplesmente chutou-o para canto, a pensar que se livrou do problema.

E cá temos o nosso Presidente da República naquilo que lhe é mais típico: tentar agradar a gregos e a troianos para, no final, desagradar a toda a gente.

Um Presidente da República cinzento, que se envolve inutilmente em quezílias partidárias promovidas em ridículas intrigas jornalísticas. Um Presidente sem coragem, e sem a verticalidade para tomar uma decisão e para assumir uma posição quando esta lhe parece polémica.

Enfim, um Presidente da República que há muito, muito tempo, perdeu já o meu respeito.




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