quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

 

Um Peculiar Conceito de Ética



A questão é até surpreendentemente simples:
Diz o artigo 36º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa:
«TODOS têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade».

Todos?
Sim, todos!
É o que estabelece a Constituição.

E todos, quer dizer isso mesmo: «todos».
Ou seja:
Todos os cidadãos têm o direito de constituir família e de contrair casamento, sem que ninguém os possa condicionar no acesso a esses direitos constitucionalmente estabelecidos.
E sem que ninguém os possa discriminar no exercício desses direitos qualquer que seja a razão invocada, incluindo, por exemplo, a sua orientação sexual. É o que estabelece o nº 2 do artigo 13º da Constituição.

São pois estas as determinações Constitucionais que estão vigentes, são estes os Direitos, Liberdades e Garantias que vigoram no Estado de Direito que TODOS NÓS pretendemos ver cumprido em Portugal.

Todos?
Não!
De facto, nem a todos interessa ver cumprido o Estado de Direito, nem todos acham que se deva dar relevância aos Direitos, Liberdades e Garantias estabelecidos na Constituição Portuguesa.

Explica-nos a «Agência Ecclesia» que a Conferência Episcopal Portuguesa está a preparar uma coisa chamada «nota pastoral» que começa por nos explicar que os cristãos, coitados, precisam muito que lhes expliquem quais são os partidos políticos em que devem ou não votar nas próximas eleições.
É assim como se fosse uma espécie de mistura entre um atestado de estupidez e um atestado de menoridade política que a Conferência Episcopal passa ao seu próprio rebanho.
Enfim, eles lá sabem!

Depois, os bispos portugueses deixaram bem claro que acham que devem ser eles a determinar não só já o Direito Canónico, o seu Catecismo, o tamanho das hóstias ou as músicas que se cantam nas missas, mas agora também a forma como são definidos e legalmente regulados alguns dos contratos tipificados no Código Civil.

Finalmente, estes ilustres prelados querem deixar bem claro que a Constituição da República Portuguesa não é coisa que valha a pena levar em consideração, tanto assim que defendem que é à Igreja Católica que compete definir o conceito de «família» mesmo que o direito à sua constituição esteja previsto no artigo 36º da nossa Lei Fundamental.

Como se não bastasse, o próprio secretário da Conferência Episcopal Portuguesa parece também querer deixar bem claro o que é que a Igreja Católica entende por ÉTICA.
Com efeito, aquele emérito especialista em família e em casamento afirmou que «a Igreja acolhe no seu seio todas as pessoas, incluindo os homossexuais, e condena “toda a discriminação”».

Toda?
Mesmo TODA a discriminação?
Não! Claro que não.

Para que não restassem dúvidas o Sr. Bispo afirma que condena toda a discriminação, sim, mas… “CONTUDO” – e, para certas pessoas, nestas coisas de direitos fundamentais dos cidadãos é sempre bom deixar uma ou outra excepção em aberto, não é? – explica-nos que, vejam só, «a família não é aquilo que nós queremos que seja»!

E, logo a seguir, cá fica a determinação da Igreja Católica que toda a sociedade deve obviamente prosseguir acriticamente: «a família é constituída pela união de amor entre um homem e uma mulher».

E cá temos a Igreja Católica no seu melhor:
- Uma instituição absolutamente tenebrosa, que se acha no direito de definir e estabelecer onde começa e acaba o amor entre os seres humanos, que não respeita os fundamentos do Estado de Direito em que vive, que diz que condena as discriminações entre os seres humanos, mas não “todas” as discriminações, que pretende determinar as condições e a regulamentação dos contratos de natureza exclusivamente civil e que já tem mesmo o desplante de querer impor a toda a sociedade o seu peculiar e paleolítico conceito que tem de «família».

E tudo isto nos é explicado no meio de uma chantagem político-eleitoral por um sujeito qualquer que aparece de repetente na comunicação social vestido de saias e que eu não conheço de lado nenhum, mas que se acha no direito de determinar a sociedade em que eu vivo.

E que ainda por cima, de acordo até com as definições que nos pretende impor, nem sequer ele próprio tem… família!




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