quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

 

A Greve dos Médicos



Os médicos portugueses estiveram hoje em greve.

Segundo Mário Azinheira, o secretário-geral da federação dos sindicatos dos médicos, a FenMed, a greve foi um sucesso esmagador e revela bem a fortíssima união e a inequívoca oposição de toda a classe médica às políticas do ministério de Ana Jorge.

De acordo com a FenMed a adesão dos médicos portugueses a esta greve chegou a cerca de 96%, um número histórico e nunca antes visto nas lutas sindicais em Portugal.
Esta adesão significa sem dúvida um claro aviso à ministra da Saúde para que ponha um fim imediato a sua intransigência e ao actual sistema de avaliação de desempenho dos médicos.

A FenMed é clara: a luta dos médicos não cessará enquanto o Ministério da Saúde não suspender o actual sistema de avaliação de desempenho e o substituir por uma avaliação que dignifique a classe.

Nem sequer quando é confrontado com o acordo de princípio celebrado com a ministra da Saúde há escassos 6 meses o secretário-geral da FenMed hesita por um momento: "simplesmente mudámos de ideias", afirma Mário Azinheira.
E acrescenta: "é completamente falso que os médicos não queiram ser avaliados".

De facto, a FenMed tem proposto nos últimos dias um sistema de avaliação de desempenho alternativo ao sistema ministerial, que Mário Azinheira classifica de “muito simples”:

- Em primeiro lugar deixa de haver essa coisa iníqua e abstrusa que é um médico avaliar outro médico. Os colegas estão unidos e não se deixam instrumentalizar; pô-los a avaliarem-se uns aos outros está absolutamente fora de questão.

- Depois, não se entende a teimosia da ministra em pretender que os resultados do desempenho dos médicos contem para a sua avaliação. Pretender isso é ignorar as precárias condições de trabalho com que os médicos todos os dias se deparam, e a completa falta de apoios do ministério.
Na verdade, não é possível confrontar um médico com os resultados do seu trabalho, ou com os sucessos ou insucessos dos seus diagnósticos ou das suas prescrições, quando é sabido que muitos médicos estão sujeitos a serviços de “banco” de 24 horas seguidas.

- Também não é admissível que continue o sistema de «consultas de substituição» implementado pelo Ministério da Saúde. Se um médico tem de faltar ao seu trabalho, isso não quer dizer que os doentes tenham de ser atendidos por outro médico, só porque este não está naquele momento a dar consultas.

- Terá igualmente de terminar a obrigatoriedade de os médicos permanecerem nos Hospitais durante o seu horário de trabalho. Com efeito, os médicos não podem dar mais do que 16 horas semanais de consultas e muito menos de desgastantes intervenções cirúrgicas.
Não é possível que o Ministério da Saúde continue a ignorar que os médicos têm de preparar as consultas e as operações, têm de ver as análises, depois disso ainda têm de estar presentes em reuniões de trabalho com os chefes de serviço e com os directores dos Hospitais, e ainda por cima têm de preencher uma resma interminável de relatórios e de fichas clínicas.
"Esta papelada é uma burocracia insustentável", afirmam os médicos. E ainda por cima há que preencher as fichas das doenças de comunicação obrigatória que vão aparecendo. Um autêntico pesadelo!

- Resultado, os médicos não têm tempo para se actualizar, para estudar ou para ir a congressos profissionais, o que desde sempre têm feito por sua conta e risco, sem o menor reconhecimento e apoio por parte das entidades ministeriais.
Uma conhecida médica afirmou mesmo: antes de ser implementado este sistema, quando vinha para o Hospital nem sentia que vinha trabalhar! Agora há dias em que chego a casa quase às 4 da tarde, vejam só, e até o meu filho já me diz: só agora?

- É que os médicos também são seres humanos e querem estar de pleno direito na sua profissão porque têm família, porque têm filhos e precisam de tempo para eles.

- Antes ainda havia alguns cursos de formação reconhecidos pelo Ministério da Saúde e de inegável interesse pessoal e profissional para os médicos portugueses, como sejam os cursos de Arraiolos, de aromaterapia, de "reiki", de "feng-shui", etc. Agora nem isso!

- Os médicos portugueses estão também unidos na sua pretensão de continuarem como até agora: a concentração das suas 16 horas de consultas semanais em quatro dias, de modo a poderem ter um dia de folga por semana, nem que isso se reflicta nos horários das consultas e obrigue os doentes a estarem nos Hospitais de manhã à noite.

- Também não se entende a intransigência da ministra que quer acabar com o sistema de férias dos médicos, que constitui um inequívoco direito por si adquirido ao longo de muitos anos: a interrupção das consultas e das intervenções cirúrgicas de 18 de Dezembro a 6 de Janeiro, uma semana no Carnaval, mais 15 dias por ocasião da Páscoa e, finalmente, de 15 de Junho a 15 de Setembro, o que mal passa os quatro meses de férias, período manifestamente insuficiente para os médicos retemperarem as suas forças do esgotante trabalho que desempenham.

- Pretendem ainda os médicos que as suas carreiras sejam divididas em 10 escalões, com subida automática de 2 em 2 anos ao escalão seguinte, e obviamente com a correspondente actualização salarial.

- Quanto à avaliação de desempenho propriamente dita, a proposta da FenMed é bem clara:
O médico a ser avaliado faz uma «auto-avaliação». A explicação para este sistema de avaliação é muito simples, uma vez que a auto-avaliação resulta de uma profunda reflexão do médico que está a ser avaliado.

- Então, depois dessa auto-avaliação, cada médico reúne-se em conjunto com os restantes médicos do seu serviço e, agora em conjunto, fazem todos uma reflexão conjunta, de que resulta então uma «co-avaliação».
Mas atenção: é uma co-avaliação em que não se põem os médicos uns contra os outros, nem ninguém dá notas a ninguém, o que seria denegrir a classe dos médicos, pois que os colegas não se avaliam uns aos outros.

- Como é óbvio, depois da reflexão conjunta e da co-avaliação, cada um dos médicos volta a fazer uma reflexão por ele próprio, e assim termina a sua avaliação de desempenho, que é a única forma de avaliação que os médicos portugueses admitem: a auto-avaliação.

E a esmagadora adesão à greve fala por si: 96% dos médicos portugueses estão unidos e estão a favor e apoiam inequivocamente este sistema de auto-avaliação de desempenho da sua classe profissional.

Por isso, assegura a FenMed, os portugueses que estejam doentes e que precisem de ir ao médico para uma consulta ou até mesmo para serem operados podem estar descansados:
- A sua saúde e até a sua vida estão em boas mãos; a dignidade profissional e a incontestável competência dos médicos portugueses estão perfeitamente asseguradas!




Pois é:
Senhora Ministra: por favor, não desista!




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