terça-feira, 7 de outubro de 2008

 

A Religião Comunista



Ninguém pode negar o papel que os partidos comunistas desempenharam ao longo da História do século XX.
Em muitos países, como em Portugal, durante muito tempo os comunistas foram os únicos que de forma sistemática e organizada lutaram contra as ditaduras, frequentemente com o risco das suas próprias vidas.
Por vezes essa luta ficou associada a uma imagem de poética e utópica liberdade, e durante décadas arrastou ideologicamente jovens sonhadores e filósofos «progressistas» que remavam contra as marés de governos empedernidos em conceitos velhos de séculos.

Que pena que não tivesse sido só assim.
Aos poucos foi-se conhecendo o banho de sangue com que a utopia soviética nasceu e se foi afirmando.
Aos poucos o sonho foi-se dissipando, à medida que se ia conhecendo o pesadelo e o horror dos campos de concentração, dos Gulags, dos hospitais psiquiátricos em que se internavam os que ousavam discordar, desde que tivessem a sorte de não ser sumariamente fuzilados.

Só que ao longo dos tempos muitos não queriam acreditar naquilo que se passava à frente dos seus próprios olhos: tudo isso era falso e não passava de uma infernal invenção propagandística da C.I.A.
Ao Muro de Berlim virava-se a cara para o lado, e dizia-se que aquela imensa vergonha de betão servia somente para proteger o povo trabalhador da República Democrática da Alemanha das investidas reaccionárias do capitalismo americano.

A exportação da «Revolução Soviética» foi primordial para mostrar que a utopia não passava de um pesadelo banhado em sangue: estratégicos tratados políticos com Hitler, o massacre dos bosques de Katyn na Polónia, a Hungria em 1956, a Primavera de Praga em 1968, a invasão do Afeganistão ou as chacinas impiedosas do camarada Agostinho Neto são meros exemplos do que foi fazendo com que tantas pessoas abandonassem o barco e quisessem demarcar-se pessoal e filosoficamente de um regime e de uma ideologia suportada pelo sangue de milhões de pessoas e pelas dolorosas deportações de muitas mais.

Em Portugal não foi diferente.
Mas, infelizmente também, nem toda a gente pensou assim.
Ao longo de décadas, o Partido Comunista Português foi-se mantendo numa empedernida cegueira de apoio, não só implícito, mas tantas vezes inequivocamente explícito, a esta loucura sanguinária.
A este persistente e anquilosado fanatismo, como foi o típico caso de Álvaro Cunhal, alguns chamam-lhe, pasme-se, «coerência»!
Como se a teimosa imutabilidade na estupidez fosse assim uma espécie de virtude.

Como se não bastasse, o PCP resolve arrogar-se o «dono do 25 de Abril», com o qual nada tem a ver a não ser com o insano PREC que conseguiu implementar logo nos dias seguintes. Invocando uma espécie de «autoridade moral» revolucionária e uma espécie de dever de defesa «das conquistas de Abril e da Reforma Agrária» os comunistas vão tocando a mesma «cassete» e pensam que ainda estamos nos tempos em que se nacionalizava a imprensa, os bancos, as seguradoras, as empresas de transportes, enfim todos os sectores produtivos do país, para que passássemos a viver numa espécie de idílico paraíso em que ninguém precisava de trabalhar nem de produzir.
Ao fim e a cabo se o dinheiro está nos bancos e os bancos pertencem ao povo, para quê trabalhar?

A visão retrógrada dos «malefícios do capital» nem sequer os deixa ver a irracionalidade em que vivem. Mal souberam que a fábrica da Opel na Azambuja poderia fechar por falta da produtividade desejada, o que fizeram os sindicatos afectos ao PCP? Trataram de saber como podiam aumentar essa produtividade? Como poderiam evitar o fecho da fábrica? Não: a primeira coisa que fizeram foi anunciar «que iriam enveredar por outras forma de luta» e marcaram imediatamente uma greve.
E a fábrica fechou, e centenas de trabalhadores ficaram desempregados.

E assim vão vivendo o Partido Comunista e os comunistas portugueses, entre declarações sucessivamente emendadas sobre as virtudes do regime da Coreia do Norte e o idílico paraíso dos campos de concentração cubanos.
Confrontados com esta insanidade, os comunistas fazem o mesmo que vão fazendo há décadas: fingem que não vêem.
E é assim que em pelo século XXI, num país ocidental que vive uma democracia em crescente consolidação ainda há pessoas que, ao mesmo tempo que persistem em ver em cada empresário «um inimigo do povo», recusam pronunciar-se sobre os regimes torcionários da China ou de Mianmar e defendem expressamente as tácticas assassinas do Hezbollah e do narco-terrorismo das FARC.

E é assim que na Assembleia da República de um país de democrático - aliás um Órgão de Soberania que nem sequer existiria se tivesse vingado em Portugal uma ideologia comunista - assistimos a um P.C.P. que se arroga um progressismo de pacotilha, porque enquanto propõe uma lei que conduz à igualdade do casamento homossexual, tem a indignidade, a hipocrisia e a autêntica desonestidade intelectual de propor uma outra (alteração ao artigo 1.979º do Código Civil) que pretende distinguir os cidadãos casados em razão da sua orientação sexual no seu acesso à adopção, enquanto bem conhece a grosseira inconstitucionalidade que isso constitui.

Porque este P.C.P. não passa de um conjunto de bandalhos que vota contra uma proposta de condenação pela escalada de violência no Tibete, que vota contra uma proposta de regozijo pela libertação de Ingrid Betancourt, que vota contra um voto de pesar pela morte do escritor russo Alexander Soljenitsin (aqui brilhantemente acompanhados pelo Bloco de esquerda), que foi prémio Nobel da literatura e um dos principais denunciadores das políticas torcionárias do camarada Estaline, e que vota até contra uma proposta de congratulação pela detenção de Radovan Karadzic.

Não admira que assim seja, simplesmente porque o Partido Comunista Português há muito que vive numa utópica irracionalidade, e que não tem sequer uma ideologia política.
Porque o Partido Comunista Português há muito que não é um partido político: é uma religião!




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