sexta-feira, 19 de setembro de 2008

 

Todos diferentes, todos iguais!



Logo no mesmo dia em que a Teresa e a Lena se apresentaram na 7ª Conservatória do Registo civil de Lisboa para dar início ao seu processo de casamento, no dia 1 de Fevereiro de 2006, o Bloco de Esquerda, os Verdes e a Juventude Socialista apressaram-se a surfar na onda da oportunidade política que o mediatismo de que o caso se revestiu lhes oferecia de mão beijada.

Vai daí, todos anunciaram a apresentação de propostas de lei no sentido da legalização do casamento homossexual.
Só faltava agendar o debate. Coisa de somenos…

Entretanto, o Partido socialista entendeu encostar a J.S. à parede e anunciou com pompa e circunstância que o casamento homossexual não constava do seu programa de Governo.
Por isso, só restava uma solução: chutar para canto e relegar tudo para as calendas da próxima legislatura.

Passaram dois anos e meio, e cá temos a oportunidade política ideal para debater o assunto e lá aparece o agendamento das propostas de lei para o próximo dia 10 de Outubro, por iniciativa do Bloco de Esquerda e dos Verdes.

E cá temos um dos mais paradigmáticos exemplos de como a política pode ser sabuja e aviltante, e de como os políticos não hesitam em lançar sobre si próprios a mais desonrosa ignomínia.

De facto, afirmar que o casamento entre pessoas do mesmo sexo não faz parte do seu programa, é a desculpa mais imbecil a que um partido político pode recorrer.
E será que a subida do I.V.A. para 21% estava no programa de Governo do P.S.?...

E ainda por cima desautorizando estupidamente a Juventude Socialista, com tudo o que isso obviamente significa, muito mais quando se sabe que a J.S., verdade seja dita, sempre assumiu pública e frontalmente – e corajosamente – a sua opção favorável ao casamento homossexual.

Um partido político tem antes de mais a obrigação ética de tomar uma posição sobre todos e cada um dos problemas políticos, sociais ou económicos do país. Pode ser a favor ou ser contra esta ou aquela medida, esta ou aquela posição. Mas uma coisa é certa: tem de definir-se!
Não tomar uma posição expressa sobre um determinado assunto, significa não mais do que optar pela sabuja cobardia das meias tintas.

Mas o Partido Socialista ainda fez pior: não só não tomou uma posição expressa e inequívoca sobre qual era a sua posição política perante o casamento homossexual, como anunciou que debateria o tema somente… na próxima legislatura.

Ora, ao dizer isto o PS demonstra que sabe bem que o problema existe. E ao anunciar o debate para a próxima legislatura, significa que sabe também que o assunto carece de ser debatido.
Então, se assim é, por que raio não o debate já?
Se o problema existe e precisa de ser debatido, é porque ele afecta uma fatia importante da população portuguesa, milhares e milhares de pessoas, que não se compadecem com o facto de verem as suas vidas adiadas para a próxima legislatura só porque o partido do Governo e maioritário na Assembleia da República não tem coragem política suficiente para tomar uma decisão sobre um tema, só porque esse tema é «fracturante».

Mas esta triste e néscia política do Partido Socialista não se fica por aqui: já foi anunciado que o P.S. votará contra as propostas do Bloco e dos Verdes, mas impondo disciplina de voto nesse sentido aos seus deputados. É como se a direcção do P.S. quisesse deixar bem claro que quando a posição do Partido é não tomar posição, todos os seus deputados têm de ser uma nova espécie de carneiros cinzentos e votarem todos obedientemente nesta idiotia.

E é assim que vemos uma vez mais um partido político pôr aquilo que há de mais baixo na política, que é essa coisa abstrusa a que chamam «o combate político-partidário», à frente dos interesses da população, à frente da vida das pessoas.
E ainda se admiram da imagem e da reputação de que os políticos gozam em Portugal…

Mas o Partido Socialista não está só nesta ignara posição.
O Bloco de Esquerda e os Verdes fazem-lhe muito boa companhia!

Para já, os Verdes (que, sejamos claros, é a mesma coisa que o Partido Comunista) apresentaram uma proposta com que pretendem passar por ser um partido inovador, moderno e que combate a homofobia e a discriminação.
Nem ao menos têm a dignidade de assumir frontalmente essa homofobia e essa discriminação, como o fazem abertamente o PSD e o CDS…

Porque acontece que a proposta dos Verdes, perdão, do Partido Comunista, prevê também a alteração do artigo 1.979º do Código Civil que em vez de dizer «podem adoptar plenamente duas pessoas casadas há mais de 4 anos…», passaria a inviabilizar a adopção por casais homossexuais, passando a dizer qualquer coisa como «podem adoptar plenamente duas pessoas “de sexo diferente” casadas há mais de 4 anos…».
É triste, muito triste, quando na Assembleia da República, o repositório do Poder Legislativo e da Democracia portuguesa, é um dos seus próprios partidos o primeiro a apresentar uma proposta de lei discriminadora, marcadamente homofóbica e inequivocamente inconstitucional.
Deve ser assim que é lá na Coreia do Norte…

Ou seja:
Se virmos bem, há mais de dois anos que se conhece a posição do P.S. quanto a quaisquer propostas de lei que surjam sobre o casamento homossexual.
E sem os votos do P.S. nenhuma lei pode ser aprovada.
Ora, se o Bloco e os Verdes sabem disso, por que motivo apresentaram então as suas propostas?
Para serem aprovadas?

Claro que não. Foi precisamente para o contrário: foi para serem rejeitadas!

Face à irredutibilidade da posição do P.S., o Bloco e os Verdes poderiam ter-se conformado com isso (não tinham outro remédio) e ter apresentado as suas propostas daqui a um ano, logo até no primeiro dia da próxima legislatura. Aí, se as suas intenções visassem não mais do que o interesse das pessoas, não só lhes resolveriam o problema, como ainda teriam um ganho político à custa do P.S., que ficaria entre a espada e a parede e não teria outro remédio que não apoiar as propostas.

Mas o Bloco de Esquerda e os Verdes pretendiam o ganho político para já: estamos no último ano desta legislatura e já na contagem decrescente para as próximas eleições.
Então a jogada político partidária é simples: apresentam-se já as propostas e, como é expectável o Partido Socialista vota contra.
E o ganho político está precisamente na rejeição das propostas!
Depois é só fazer muito barulho, muita publicidade, e capitalizar os votos à esquerda do P.S.

Claro que para isso têm de usar as pessoas.
Mas afinal, para os partidos políticos – todos eles – que interesse têm as pessoas, meros «danos colaterais», nessa coisa tão nobre e altaneira que é o «combate político-partidário»?




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