sexta-feira, 1 de junho de 2007
O Neto do Vice-Presidente
A foto ao lado retrata o vice-presidente dos Estados Unidos, Dick Cheney e também a sua mulher Lynne, que tem ao colo o sexto neto de ambos.
O bebé nasceu no passado dia 23 de Maio e chama-se Samuel David Cheney. É filho de Mary Cheney, uma das filhas de Dick Cheney, que é lésbica, e que vive há vários anos com a sua companheira, Heather Poe.
Como é óbvio, a criança vai ser criada e educada por ambas.
O vice-presidente afirmou estar «muito feliz» por ser avô pela sexta vez. E até o próprio Presidente George W. Bush declarou que pensa que «Mary vai ser uma mãe extremosa para o seu filho e que estava muito feliz por ela».
Será que esta situação seria possível em Portugal?
Vejamos:
Em Portugal é o artigo 36º da Constituição da República Portuguesa que nos dá a resposta.
Sob a epígrafe «família, casamento e filiação», destaca-se desta disposição constitucional:
«1. Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade».
«4. Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objecto de qualquer discriminação...»
«5. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos».
Ora bem:
Segundo foi considerado no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, já publicado, de facto «neste preceito constitucional consagra-se o direito a constituir família e o direito a contrair casamento em condições de igualdade».
Mas, continua o acórdão e muito bem: «tais direitos não se confundem e, muito pelo contrário, neste preceito constitucional estabelece-se o reconhecimento de que a família não é apenas produto do casamento».
E para que dúvidas não haja, o acórdão da Relação ainda vai mais longe na sua explicação:
«Dentro do sector normativo... estão hoje as uniões homossexuais, entendidas também como comunidades de existência familiar».
Ou seja:
Em Portugal, os homossexuais têm perfeitamente garantido o seu direito a constituir família.
Por outras palavras, para o Tribunal da Relação, e muito bem, as uniões homossexuais são já hoje perfeitamente entendidas também como uma família.
Por outro lado, aos homossexuais é também garantido o direito (e o dever) constitucional de educação e manutenção dos seus filhos.
Ou seja, tal como vai acontecer com o neto do vice-presidente americano, também em Portugal uma criança pode muito bem ser educada no seio de uma união homossexual, isto é, no seio de uma família homossexual.
Resumindo e concluindo:
Dos três direitos inscritos na própria epígrafe do artigo 36º da Constituição, não restam dúvidas de que em Portugal dois deles estão já pacificamente garantidos aos homossexuais: o direito a constituir família e o direito de educação e manutenção dos seus filhos, tenham eles sido concebidos, por exemplo, numa relação heterossexual anterior ou até em resultado de uma inseminação artificial.
Mas, e então o direito a contrair casamento?
Pois: este direito parece que não!...
De facto, em Portugal os homossexuais não têm o direito de contrair casamento.
Mas não vimos há pouco que o n.º 1 do artigo 36º da Constituição estabelece claramente que «TODOS têm o direito de contrair casamento em condições de plena igualdade»?
Não está lá a palavra «TODOS»?
E não está lá a palavra «IGUALDADE»?
Será que é possível excluir da expressão «TODOS» alguns cidadãos ou categorias de cidadãos, distinguindo-os, assim, dos demais?
Bem: o artigo 13º da Constituição não permite que ninguém seja prejudicado ou privado de qualquer direito em razão seja do que for, incluindo da sua orientação sexual.
Então, se estão consagrados no artigo 36º da Constituição três direitos e se se garantem apenas dois deles, ficando em falta a concessão do «direito de contrair casamento em condições de plena igualdade», quando até o próprio Tribunal da Relação considerou que «tais direitos não se confundem» e terão de ser exercidos individualmente, então a conclusão é por demais óbvia:
- Falta aqui um direito!
Ou seja, a actual formulação do artigo 1.577º do Código Civil, que impede a celebração de casamentos entre pessoas do mesmo sexo é inequivocamente inconstitucional!
Contudo, e não obstante ser manifesta e inequívoca a clareza desta lógica jurídica, por que motivo é que o Tribunal da Relação de Lisboa persiste na sua posição de não considerar inconstitucional a proibição do casamento homossexual em Portugal?
A resposta é simples e é o próprio acórdão da Relação quem a dá, quando afirma que o casamento «radicado intersubjectivamente na comunidade como instituição não permite retirar da Constituição um reconhecimento directo e obrigatório dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo...».
E é nesta afirmação que reside, de facto, o cerne de toda a questão!
Porque em Portugal os homossexuais podem constituir família.
E podem no seu seio educar e criar os seus filhos.
Mas o seu casamento é uma questão que nunca será resolvida enquanto os cidadãos portugueses tiverem de continuar a ver escrito numa decisão judicial que o casamento é uma... «instituição».
É uma violação chocante e abominável da Constituição, e é uma aberrante privação de um direito fundamental que continuará a ser negado a um grupo de cidadãos que, em nome de um preconceito moral qualquer, são discriminados em razão da sua orientação sexual, enquanto continuarmos a ver um Tribunal, qualquer que ele seja, a ter o arrojo, o atrevimento, o desplante e a autêntica desfaçatez de considerar o casamento como uma «instituição».
Porque o casamento poderá ser uma «instituição», sim. Mas... só na igreja lá da terra ou até na Sé de Braga.
Porque, de facto, num acórdão de um Tribunal da Relação um casamento não é, nunca foi nem nunca será uma «instituição».
Mas o seu casamento é uma questão que nunca será resolvida enquanto os cidadãos portugueses tiverem de continuar a ver escrito numa decisão judicial que o casamento é uma... «instituição».
É uma violação chocante e abominável da Constituição, e é uma aberrante privação de um direito fundamental que continuará a ser negado a um grupo de cidadãos que, em nome de um preconceito moral qualquer, são discriminados em razão da sua orientação sexual, enquanto continuarmos a ver um Tribunal, qualquer que ele seja, a ter o arrojo, o atrevimento, o desplante e a autêntica desfaçatez de considerar o casamento como uma «instituição».
Porque o casamento poderá ser uma «instituição», sim. Mas... só na igreja lá da terra ou até na Sé de Braga.
Porque, de facto, num acórdão de um Tribunal da Relação um casamento não é, nunca foi nem nunca será uma «instituição».
Não!
Num acórdão de um Tribunal da Relação um casamento é uma coisa bem difente:
-É, sim, um mero e simples contrato!