quarta-feira, 31 de janeiro de 2007
O Jovem Delinquente
Ao fim de todos estes anos, os pais do Zé apareceram-me hoje de repente no escritório.
E com eles vieram as memórias amargas do caso.
Por isso, quase como uma homenagem, torno a publicar sem quaisquer alterações este texto que escrevi aqui há coisa de dois anos.
*
Ao fim de quase vinte anos a memória daquele caso ainda o perturbava.
Recostou-se para trás na cadeira de braços forrada a pele e olhou em volta.
Nem o conforto daquele gabinete de «advogado de sucesso», nem sequer o longo tempo passado impediam aquele frio no estômago de cada vez que aquela memória o assaltava.
Será que tinha feito tudo o que devia? Tudo o que podia?
Ainda hoje não sabia.
Por que raio se tinha lembrado outra vez?
Respirou fundo e fechou os olhos.
O gabinete era então modestamente mobilado: a secretária metálica comprada em segunda mão a um primo que tinha mudado de casa. A cadeira de napa comprada em saldo. As estantes com os dossiers dos processos arrumados espaçadamente para parecerem mais...
O casal de ciganos entrou.
Sentaram-se desconfortáveis nas cadeiras à sua frente. Ele muito direito, rodava nas mãos o chapéu castanho muito manchado e tentava disfarçar a atrapalhação.
O filho tinha sido preso.
«Sr. Dr. ele, o meu Zé, só tem 19 anos. Ajude-o».
Foi consultar o processo.
Não! Está em segredo de justiça!
Foi vê-lo à Penitenciária.
Ele e um amigo tinham abordado um brasileiro ali para os lados do Bairro Alto. Pediram-lhe lume e o próprio ar atemorizado do outro os encorajou. Encostaram-no à parede e tiraram-lhe o que tinha nos bolsos sem encontrarem qualquer resistência.
Fugiram apressados com o produto do saque: 17$50 em dinheiro e um isqueiro «Bic» azul.
Mas foi por pouco tempo. O brasileiro correu para a Esquadra mais próxima e destacaram-lhe um carro patrulha que logo às primeiras voltas os encontrou.
Fez o requerimento tentando a liberdade provisória, nem que fosse com caução.
O Ministério Público opôs-se.
Alegou perigo de fuga: «repare-se que o arguido é de raça cigana», leu atónito.
O juiz manteve a prisão preventiva, aceitando os argumentos.
Quase um ano depois, o julgamento. Toda a família à espera, «acampada» à porta do Tribunal.
A esperança? Claro: Deus é grande e a justiça dos homens não vai falhar. É a primeira vez que o Zé se mete nestes assados. Tem 19 anos. Um isqueiro descartável e 17$50 não hão de ser motivo para grande castigo. Nem sequer houve grande violência com o brasileiro.
Vai apanhar pena suspensa, com toda a certeza.
E não há aquela lei dos «Jovens Delinquentes»? Não disse o Dr. que ela mandava o juiz olhar para a idade?
Ele tem 19 anos, é uma criança!
Ele tem 19 anos, é uma criança!
A audiência estava marcada para as 2 horas. Às 3 entraram os juizes.
Meia hora depois, começaram os outros quatro julgamentos também marcados para a mesma hora.
O seu começou às 6,30 da tarde.
«Vá lá, conte lá isso depressa que não há tempo a perder. Já viu que horas são?»
O juiz presidente, qual cometa, não era para contemplações. Os outros dois juizes não: um deles até estava meio distraído, quase a dormir; o outro escrevia atarefado em processos que tinha trazido com ele para a sala de audiências.
Vinte minutos depois tinha terminado o julgamento.
Com as alegações do advogado e tudo, que o ar de ameaçador enfado do juiz não deu para mais.
Uma semana depois a sentença: 6 anos de prisão!
Claro que o recurso vai fazer justiça. Desta vez é que vai ser.
A motivação do recurso foi feita e refeita. Ao ínfimo pormenor.
Como mandam as regras, tudo estava mencionado.
O irrisório montante do roubo.
E a idade! Não tinha ele 19 anos? Não havia aquela lei dos jovens?
É que o tribunal de primeira instância não aplicou aquela lei.
Era a primeira vez que entrava no Supremo Tribunal de Justiça.
A própria solenidade da sala atemorizava.
Até a D. Maria II o olhava fixamente daquele quadro.
Os juizes Conselheiros entraram. Ena tantos!
Tem a palavra!
Então, esperançado, expôs os seus argumentos. Um a um.
Todos irrefutáveis, claro.
Espera!
Aqueles três juizes do lado direito estão na conversa. Não estão a ligar patavina a isto. Não faz mal, o juiz relator está com atenção.
Falou quase 20 minutos.
Para o fim, deixou o argumento da idade. A omissão da aplicação da lei por parte do Tribunal, que nem sequer referiu a sua existência.
Até que finalizou: Peço Justiça!
Com ar solene, o juiz presidente abriu uma pasta preta e tirou umas folhas. Passou-as lentamente nas mãos, olhou para a última e disse sem levantar os olhos:
«Nega-se provimento ao recurso; o Sr. Dr. depois passa na secretaria que lhe dão a fotocópia do acórdão; o caso seguinte é o número...».
Espera! O acórdão já estava pronto? O que é que eu estive aqui a fazer?
Tinha preparado isto tão bem...
Então e os «Jovens Delinquentes»?
E a «atenuação especial da pena»?
Fica com os seis anos?
Mas ele é primário. Foram 17$50 e a merda de um isqueiro.
Tem 19 anos.
É uma criança...6 anos?
Quanto é que apanhou aquele tipo que ia com os copos e atropelou a miúda na passadeira? Dois anos com pena suspensa, não foi?
Apetecia-lhe gritar.
Apetecia-lhe gritar.
Acabou-se!...
Ainda o foi ver ao Estabelecimento Prisional de Sintra. Estava mais magro, mas conformado:
«deixe estar, Sr. Dr.; Tinha que ser, Sr. Dr.; Eu até já estava à espera, Sr. Dr...».
Depois de cumprida a parte regulamentar da pena, o Zé saiu em liberdade.
Não a gozou por muito tempo.
Contraiu SIDA na prisão, nunca soube explicar como.
Já morreu.
segunda-feira, 29 de janeiro de 2007
A Homeopatia
É curioso como quase de repente as chamadas «medicinas alternativas» passaram a gozar nas sociedades modernas de uma reputação de seriedade e eficácia.
De facto, e por paradoxal que isso pareça, quanto mais ouvimos falar no espantoso avanço da medicina e em curas de doenças e em descobertas científicas que ainda há meia-dúzia de anos nos pareceriam pura ficção científica, e também quanto mais a informação está disponível para a generalidade das pessoas que vivem no mundo ocidental, mais estas parecem confiar o bem mais precioso que podem ter, que é a sua saúde, a autênticos curandeiros que ora lhes prometem curas milagrosas simplesmente por lhes espetarem agulhas em misteriosas partes do corpo, ou por lhes fazerem ingerir poções e mezinhas cuja origem só eles conhecem.
É precisamente o caso da homeopatia.
Inventada nos princípios do século XIX por Samuel Hahnemann, a homeopatia parte do princípio básico que qualquer doença deve ser tratada ajudando-se a «força vital» a restaurar a harmonia e o equilíbrio do organismo.
Etimologicamente a palavra homeopatia deriva do grego homeo (semelhante) e pathos (doença).
A homeopatia está hoje muito difundida e é praticada por autodenominados «médicos homeopatas» que, ao contrário do que acontece com a medicina tradicional, que é essencialmente materialista e recorre a disciplinas com a anatomia, a fisiologia e a química, prefere antes optar por métodos basicamente empíricos que envolvem o apelo a entidades e a processos metafísicos.
Depois, aparecem a chamadas «farmácias homeopáticas» que vendem preparados misteriosos a preços astronómicos, embora sejam compostos quase só por água e nunca ninguém tenha conseguido demonstrar a sua eficácia ou sequer o seu efeito.
Mas o que há de mal na homeopatia não são os preparados que incitam os seus pacientes a tomar, pois, embora caros, se não lhes fazem bem, são tão diluídos em água que também não lhes fazem mal.
O que há de criminoso nos homeopatas é que sob a capa do exercício de uma medicina, que «credibilizam» unicamente pelo recurso ao adjectivo «alternativa», para ganharem o seu dinheiro influenciam os seus pacientes a não receber um tratamento médico verdadeiramente adequado, muitas vezes com consequências bem trágicas para a sua saúde ou até para a sua vida.
Mas como uma imagem vale mil palavras, mais vale deixarmos James Randi dar-nos no filme abaixo uma explicação mais detalhada sobre o que é verdadeiramente a homeopatia e dizer-nos o que pensa sobre os que a praticam, e a quem chama de tudo, desde asininos a criminosos.
Absolutamente imperdível!
quinta-feira, 25 de janeiro de 2007
E se o «NÃO» ganhar?
Independentemente dos critérios que levarão os portugueses a votar «SIM» ou «NÃO» no próximo referendo sobre a despenalização do aborto, e (longe vá o agoiro) se o «NÃO» ganhar?
O que mudará neste caso em Portugal?
A resposta é por demais simples, e tão óbvia que até chateia: nada vai mudar; tudo ficará na mesma como agora.
Quer então isto dizer que depois do referendo vai deixar de haver mulheres a abortar em Portugal?
Claro que não!
Como é por demais óbvio, nem uma só mulher em Portugal que pretenda abortar (e independentemente dos motivos que a tiverem levado a tomar essa decisão) e tenha decidido nesse sentido, vai deixar de o fazer em função do resultado de um referendo.
O número de abortos que se vão realizar em Portugal será precisamente o mesmo.
Então, e se o «NÃO» ganhar, a prática do aborto que não se insira na lei já actualmente em vigor (violação, malformação do feto ou perigo para a saúde da mãe) continuará a ser criminalizada e penalizada.
Mas, apesar disso continuará a haver abortos em Portugal, já que a penalização, como é sabido, nunca constituiu o menor motivo de dissuasão para as mulheres que pretendam abortar.
É por isso que as mulheres que tenham decidido abortar se dividirão em dois grupos: as que têm dinheiro e as que não têm.
As que têm dinheiro irão fazê-lo em clinicas inglesas, ou até aqui bem pertinho, em Badajoz. E o número de abortos, quanto a estas, será precisamente o mesmo.
Aliás, se eu fosse um dono sem escrúpulos de uma clínica de Badajoz o que eu faria melhor era financiar o mais possível a campanha do «NÃO». Mas isso é outra conversa.
As mulheres que não têm dinheiro e que tenham decidido abortar recorrerão a uma clínica clandestina, a um qualquer «vão de escada», ou até a uma «parteira» amiga, que tem muita experiência em meter agulhas de tricot por mulheres adentro, e até lhes faz um desconto.
Então, por sua vez, as mulheres sem dinheiro que tenham decido abortar clandestinamente dividir-se-ão em dois grupos: aquelas a quem a coisa corre bem, e aquelas a quem a coisa corre mal.
Aquelas a quem a coisa correr bem, pode ser que se safem e que não sejam descobertas pelas autoridades policiais.
Aquelas a quem a coisa correr mal, vão de urgência para o Hospital.
Então, se a coisa correr mesmo mal, morrem; se a coisa correr bem, safam-se.
Mas são estas que se safam precisamente aquelas que vão ter um processo crime às costas, porque o médico que as safou é obrigado a participar a ocorrência à Polícia.
Quer então isto dizer que se o «NÃO» ganhar no referendo as mulheres que abortem e as pessoas que as auxiliem continuarão a ser perseguidas criminalmente.
Serão julgadas e, provado o crime, serão condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Mas atenção: só as mulheres que não têm dinheiro.
Porque as que têm dinheiro não terão praticado qualquer crime, porque terão abortado num país estrangeiro onde, porque essa conduta não é punível, ela não deixará qualquer rasto.
Serão então julgadas somente as mulheres mais pobres e com menos recursos que tenham abortado num «vão de escada» e, mesmo dentre estas, provavelmente só aquelas a quem «a coisa correu mal» e que por isso tenham sido «apanhadas».
Essas serão sentadas no correspondente «banco dos réus».
Serão fotografadas por jornalistas à entrada e à saída do tribunal, serão humilhadas perante toda a gente e obrigadas a contar e a explicar, para quem quiser ouvir, os motivos mais íntimos e pessoais que as terão levado a uma decisão tão trágica como é a de abortar.
Provado o crime, serão então condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Em suma, se o «NÃO» ganhar, tudo ficará na mesma em Portugal.
Porque foi nesse sentido que as pessoas que terão votado «NÃO» no referendo terão decidido.
E terá sido nesse mesmo sentido, aliás, que terão decidido as pessoas que optem por abster-se no referendo.
Todas elas terão decidido por si próprias e, obviamente, e porque se acham nesse pleno direito, terão decidido também pelas outras pessoas.
Se o «NÃO» ganhar, presumo que essas pessoas fiquem satisfeitas.
Afinal, e pelos vistos, pensam que como está é que tudo está bem....
Mas são estas que se safam precisamente aquelas que vão ter um processo crime às costas, porque o médico que as safou é obrigado a participar a ocorrência à Polícia.
Quer então isto dizer que se o «NÃO» ganhar no referendo as mulheres que abortem e as pessoas que as auxiliem continuarão a ser perseguidas criminalmente.
Serão julgadas e, provado o crime, serão condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Mas atenção: só as mulheres que não têm dinheiro.
Porque as que têm dinheiro não terão praticado qualquer crime, porque terão abortado num país estrangeiro onde, porque essa conduta não é punível, ela não deixará qualquer rasto.
Serão então julgadas somente as mulheres mais pobres e com menos recursos que tenham abortado num «vão de escada» e, mesmo dentre estas, provavelmente só aquelas a quem «a coisa correu mal» e que por isso tenham sido «apanhadas».
Essas serão sentadas no correspondente «banco dos réus».
Serão fotografadas por jornalistas à entrada e à saída do tribunal, serão humilhadas perante toda a gente e obrigadas a contar e a explicar, para quem quiser ouvir, os motivos mais íntimos e pessoais que as terão levado a uma decisão tão trágica como é a de abortar.
Provado o crime, serão então condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Em suma, se o «NÃO» ganhar, tudo ficará na mesma em Portugal.
Porque foi nesse sentido que as pessoas que terão votado «NÃO» no referendo terão decidido.
E terá sido nesse mesmo sentido, aliás, que terão decidido as pessoas que optem por abster-se no referendo.
Todas elas terão decidido por si próprias e, obviamente, e porque se acham nesse pleno direito, terão decidido também pelas outras pessoas.
Se o «NÃO» ganhar, presumo que essas pessoas fiquem satisfeitas.
Afinal, e pelos vistos, pensam que como está é que tudo está bem....
quarta-feira, 24 de janeiro de 2007
Os Abutres
No dia 6 de Outubro de 2002, Shawn Hornbeck, uma criança de 11 anos do Estado do Missouri, nos Estados Unidos, desapareceu sem deixar rasto quando passeava de bicicleta.
Os pais tudo fizeram para o encontrar. Espalharam a fotografia do filho em cartazes e literalmente em todas as lojas e bombas de gasolina do Estado, e organizaram grupos de busca que tiveram a colaboração de milhares de voluntários.
No seu desespero, os pais de Shawn compareceram num programa de televisão para publicitar uma vez mais o desaparecimento do seu filho.
Compareceu também a mais célebre «psíquica» americana, a famosa e inefável Sylvia Browne.
Como se pode ver no filme abaixo, Sylvia Browne «desvendou» os pormenores do rapto, e descreveu em pormenor a fisionomia do raptor e o local para onde tinha fugido e levado a criança.
E depois, para desgosto e comoção de todos os que assistiam ao programa, informou os pais que o seu filho estava já morto.
A comovente reacção dos pais de Shawn ao ouvirem esta noticia, fala por si.
Estas «revelações» fizeram desmobilizar os grupos de busca de voluntários e desviaram as atenções para os locais indicados por Sylvia Browne.
Até que, mais de quatro anos depois, no passado dia 12 de Janeiro de 2007, Shawn Hornbeck foi encontrado com vida juntamente com outra criança raptada mais recentemente, e o seu raptor foi preso.
Como não podia deixar de ser, nenhuma das circunstâncias do rapto reveladas por Sylvia Browne estavam correctas.
Como diz James Randi no final do filme, estes «psíquicos», que dizem que falam com os mortos e se arrogam misteriosos e esotéricos poderes paranormais, são como abutres que estão pousados em árvores à espera que lhes apareçam pessoas fragilizadas e vulneráveis por desgostos que estejam a viver e que, precisando desesperadamente de ajuda, acabam por ser ingénuas o suficiente para acreditar nestes aldrabões.
Enquanto por todo o mundo Sylvia Browne, John Edward (cujos shows de aldrabice puderam ser vistos no canal «People and Arts») e tantos outros enriquecem como nababos à custa da ingenuidade das pessoas, Portugal não é excepção a este autêntico escândalo.
Ao mesmo tempo que condena a seis anos de cadeia um pai que não quer entregar a filha que ama a um desconhecido, a Justiça portuguesa continua de costas voltadas para a sociedade em que está inserida e permite que outros tantos abutres e aldrabões, com nomes mais ou menos comerciais como professor Karamba ou Professor Bambo, como Cristina Candeias, Maya, Paulo Cardoso ou Alexandra Solnado, que têm até a lata e o despudor de se anunciarem às escâncaras nos jornais e televisões, continuem autenticamente a burlar e a extorquir dinheiro às pessoas honestas.
segunda-feira, 22 de janeiro de 2007
O dia em que Salazar caiu da cadeira
No dia 3 de Agosto de 1968 quando passava uns dias de féria no forte de Santo António no Estoril, António de Oliveira Salazar, o Primeiro-ministro de Portugal, ou o «Presidente do Conselho», como então se usava chamar, caiu de uma cadeira e bateu com a cabeça no chão.
A sua forte personalidade, o seu carisma e influência política e social eram de tal ordem que, apesar de Salazar ter ficado com as capacidades mentais muito diminuídas em consequência do hematoma cerebral que sofreu na queda, o próprio Presidente da República, Américo Tomás, hesitou vários dias antes de nomear Marcelo Caetano como seu sucessor.
Salazar acaba por morrer no dia 27 de Julho de 1970 em consequência desta queda.
Não sem antes os ministros de Portugal se terem prestado à ridícula pantomina de fingirem que Salazar ainda governava. Apresentam-se-lhe a despacho no Hospital onde está internado, e fazem-no proferir ridículas decisões a fingir, fazendo-lhe pateticamente crer que ainda está à frente do Governo.
Mas que Portugal nos entregou Salazar no dia em que caiu da cadeira, e após ter sido Primeiro-ministro durante 36 anos?
Personalidade controversa, não faltam a Salazar incondicionais apoiantes, que lhe imputam invariavelmente as mesmas qualidades: uma honestidade a toda a prova, o equilíbrio financeiro do país, a sua estabilidade política depois dos primeiros agitados anos da República, uma das maiores reservas de ouro do mundo, um escudo forte, ter mantido Portugal fora da 2ª Guerra Mundial e, muito principalmente, a autoridade férrea e incondicional com que governou Portugal.
É decerto nestas prestimosas qualidades que pensam aqueles que «votam» em Salazar no estapafúrdio programa televisivo (em que me recuso a participar) que visa eleger «o melhor português».
Não sei que português sairá «vencedor» e que militância telefónica em chamadas de valor acrescentado pretenderá impor-nos como o «melhor português».
Mas não posso deixar de surpreender-me com quem vota em Salazar, afinal num exercício de uma liberdade cívica e política absolutamente normais e corriqueiras, mas que ele próprio não admitia, e que perseguia com a tal e tão elogiada «autoridade férrea».
De facto, não consigo deixar de me surpreender com a incomensurável tacanhez de espírito de quem tem coragem e a desfaçatez de votar em Salazar como o «melhor português», passando como cão por vinha vindimada e ignorando qual o verdadeiro Portugal que aquele ditador estúpido, tacanho e sanguinário nos legou a 3 de Agosto de 1968, o dia em que caiu da cadeira.
Embora bem pior que essa tacanhez de espírito seja a imbecilidade de quem ousa proferir a frase: «então e agora as coisas estão bem?».
A frase que talvez melhor defina Salazar foi por ele próprio proferida:
«Devo à Divina Providência a graça de ser pobre».
Pois foi nesta «graça de ser pobre» que Salazar transformou Portugal, decerto convencido que essa era uma sagrada tarefa que lhe tinha sido encomendada pela «Divina Providência».
No dia em que caiu da cadeira, Salazar deixou-nos um Portugal que tinha uma taxa de mortalidade infantil semelhante à do Alto Volta e uma taxa de analfabetismo parecida com a da Costa do Marfim ou a do Uganda.
Deixou-nos um país sem ciência, sem cultura e sem civilização!
Uma legião de censores de lápis azul procuravam imbecilmente descobrir nas entrelinhas dos livros e dos jornais aquilo que era «proibido dizer».
Um exército de polícias políticos encarregavam-se de prender, torturar e matar quem ousava opor-se ao regime, e os tribunais plenários da complacência do poder judicial tratavam de «legalizar» as prisões, os desterros e os campos de concentração.
Nem dos próprios portugueses Salazar tinha grande opinião e dizia claramente:
«O grau das liberdades públicas efectivas depende da capacidade dos cidadãos, não da concessão magnânima do Estado».
Mas ao mesmo tempo, não hesitava em hostilizar as elites culturais e científicas do país ao mínimo sinal de oposição às suas ideias. Quantos professores universitários foram proibidos de ensinar, quantos cientistas foram «aconselhados» a emigrar, só porque as suas ideias não se encaixavam nos cânones oficiais do regime.
Um arremedo de eleições fingidas pretendiam dar uma espécie de legalidade ao regime. Mas bastava alguém ousar candidatar-se e dizer de Salazar «obviamente, demito-o», para ser impiedosamente assassinado.
Católico empedernido e fanático, que nunca conseguiu deixar de ser um seminarista tacanho e de vistas curtas, Salazar submeteu Portugal a Concordatas que proibiam aos portugueses a dissolução dos casamentos celebrados catolicamente ao mesmo tempo que conferiam à Igreja Católica uma notável influência na educação e na sociedade civil e política. Com os resultados que se conhecem.
Salazar era um saloio ridículo e boçal, cujo horizontes nunca verdadeiramente passaram dos campos lavrados de Santa Comba. E, como bom católico, era também um misógino empedernido, que dizia:
«Ensinai aos vossos filhos o trabalho, ensinai às vossas filhas a modéstia, ensinai a todos a virtude da economia. E se não poderdes fazer deles santos, fazei ao menos deles cristãos».
Impondo um regime autoritário de direita, Salazar, por muito paradoxal que isso pareça, e por muita fama de entendedor de finanças que tivesse, nem sequer compreendeu muito bem a economia de mercado. Implementou em Portugal um regime corporativista retrógrado e proteccionista e, sempre a bem das finanças, mandou congelar as rendas das casas, uma medida com consequências bem sérias que ainda hoje, meio século depois, se fazem sentir.
Salazar nem sequer ia ao cinema: enquanto Portugal morria silenciosamente de fome ou emigrava para sobreviver, era a sua fiel Maria que lhe contava as histórias dos filmes, sentados de mantas nos joelhos nas frias e longas noites de Inverno.
Diz-se que apreciava particularmente que a Maria lhe contasse muitas vezes o «Música no Coração».
«Orgulhosamente só», Salazar nem sequer se dava ao trabalho de ver o que se passava nem no país nem no mundo à sua volta.
Por isso, não soube perceber o que o mundo tinha mudado, principalmente depois da 2ª Guerra Mundial, e não soube descolonizar a tempo de o fazer pacificamente, antes preferindo manter uma guerra colonial estúpida e obviamente inconsequente porque impossível de vencer politicamente, com o óbvio custo de milhares e milhares de mortos.
Nem sequer soube encontrar uma solução pacífica e honrosa para as colónias da Índia, recusando mesmo cegamente a solução de uma independência calculada, que ainda hoje poderia, talvez, perdurar.
Depois da invasão indiana em 1961, mandou estupidamente as tropas portuguesas resistirem até ao último homem, mas em vez de lhes mandar armas e munições, mandou-lhes caixotes com... chouriços!
Mas isso não o impediu de humilhar e perseguir esses militares quando estes regressaram a Portugal.
Como não teve qualquer pejo em humilhar e perseguir a coragem de Aristides Sousa Mendes, que salvou a vida de milhares de judeus que fugiam à fúria assassina nazi.
Germanófilo convicto, Salazar admirava Franco e disfarçava mal o seu apoio a Hitler e Mussolini, que idolatrava incondicionalmente e de quem mantinha retratos sobre a sua secretária de trabalho.
Soube gerir admiravelmente como obra sua a neutralidade de Portugal na 2º Guerra, fazendo crer que isso se devia mais às suas notáveis capacidades diplomáticas e influência no xadrez político mundial, qual Richelieu de trazer por casa, do que à irrelevância do nosso país no esforço de guerra europeu, com excepção do precioso volfrâmio, que exportava, como é bom de ver, para a Alemanha.
Por isso, escondeu quer os planos de Hitler para a invasão de Portugal (a célebre Operação Leão Marinho) ou o ultimato dos americanos para a utilização dos Açores como base estratégica, que até à última procurou evitar conceder-lhes.
Depois da 2ª Guerra Mundial, e enquanto aqui mesmo ao lado a Espanha, devastada pela Guerra Civil, se ia transformando num dos países mais industrializados e desenvolvidos do mundo que é hoje, em Portugal Salazar defendia a política do «condicionamento industrial» e instituía a «licença de isqueiro» ou proibia a venda de Coca-cola para proteger as medíocres indústrias concorrentes de famílias cuidadosamente protegidas do regime, que enriqueciam com a exploração despudorada de mão de obra barata e desqualificada.
No fim, Salazar transformou Portugal num «país de província» e à sua própria imagem: com ouro debaixo do colchão, mas um país atrasado, seminarista, tacanho, estúpido e de tamancos.
Mas, apesar de tudo, um homem e um governante em quem tantas pessoas não hesitam em votar como «o melhor português».
Decerto pessoas como ele: atrasadas, seminaristas, tacanhas, estúpidas e de tamancos!
Pois foi nesta «graça de ser pobre» que Salazar transformou Portugal, decerto convencido que essa era uma sagrada tarefa que lhe tinha sido encomendada pela «Divina Providência».
No dia em que caiu da cadeira, Salazar deixou-nos um Portugal que tinha uma taxa de mortalidade infantil semelhante à do Alto Volta e uma taxa de analfabetismo parecida com a da Costa do Marfim ou a do Uganda.
Deixou-nos um país sem ciência, sem cultura e sem civilização!
Uma legião de censores de lápis azul procuravam imbecilmente descobrir nas entrelinhas dos livros e dos jornais aquilo que era «proibido dizer».
Um exército de polícias políticos encarregavam-se de prender, torturar e matar quem ousava opor-se ao regime, e os tribunais plenários da complacência do poder judicial tratavam de «legalizar» as prisões, os desterros e os campos de concentração.
Nem dos próprios portugueses Salazar tinha grande opinião e dizia claramente:
«O grau das liberdades públicas efectivas depende da capacidade dos cidadãos, não da concessão magnânima do Estado».
Mas ao mesmo tempo, não hesitava em hostilizar as elites culturais e científicas do país ao mínimo sinal de oposição às suas ideias. Quantos professores universitários foram proibidos de ensinar, quantos cientistas foram «aconselhados» a emigrar, só porque as suas ideias não se encaixavam nos cânones oficiais do regime.
Um arremedo de eleições fingidas pretendiam dar uma espécie de legalidade ao regime. Mas bastava alguém ousar candidatar-se e dizer de Salazar «obviamente, demito-o», para ser impiedosamente assassinado.
Católico empedernido e fanático, que nunca conseguiu deixar de ser um seminarista tacanho e de vistas curtas, Salazar submeteu Portugal a Concordatas que proibiam aos portugueses a dissolução dos casamentos celebrados catolicamente ao mesmo tempo que conferiam à Igreja Católica uma notável influência na educação e na sociedade civil e política. Com os resultados que se conhecem.
Salazar era um saloio ridículo e boçal, cujo horizontes nunca verdadeiramente passaram dos campos lavrados de Santa Comba. E, como bom católico, era também um misógino empedernido, que dizia:
«Ensinai aos vossos filhos o trabalho, ensinai às vossas filhas a modéstia, ensinai a todos a virtude da economia. E se não poderdes fazer deles santos, fazei ao menos deles cristãos».
Impondo um regime autoritário de direita, Salazar, por muito paradoxal que isso pareça, e por muita fama de entendedor de finanças que tivesse, nem sequer compreendeu muito bem a economia de mercado. Implementou em Portugal um regime corporativista retrógrado e proteccionista e, sempre a bem das finanças, mandou congelar as rendas das casas, uma medida com consequências bem sérias que ainda hoje, meio século depois, se fazem sentir.
Salazar nem sequer ia ao cinema: enquanto Portugal morria silenciosamente de fome ou emigrava para sobreviver, era a sua fiel Maria que lhe contava as histórias dos filmes, sentados de mantas nos joelhos nas frias e longas noites de Inverno.
Diz-se que apreciava particularmente que a Maria lhe contasse muitas vezes o «Música no Coração».
«Orgulhosamente só», Salazar nem sequer se dava ao trabalho de ver o que se passava nem no país nem no mundo à sua volta.
Por isso, não soube perceber o que o mundo tinha mudado, principalmente depois da 2ª Guerra Mundial, e não soube descolonizar a tempo de o fazer pacificamente, antes preferindo manter uma guerra colonial estúpida e obviamente inconsequente porque impossível de vencer politicamente, com o óbvio custo de milhares e milhares de mortos.
Nem sequer soube encontrar uma solução pacífica e honrosa para as colónias da Índia, recusando mesmo cegamente a solução de uma independência calculada, que ainda hoje poderia, talvez, perdurar.
Depois da invasão indiana em 1961, mandou estupidamente as tropas portuguesas resistirem até ao último homem, mas em vez de lhes mandar armas e munições, mandou-lhes caixotes com... chouriços!
Mas isso não o impediu de humilhar e perseguir esses militares quando estes regressaram a Portugal.
Como não teve qualquer pejo em humilhar e perseguir a coragem de Aristides Sousa Mendes, que salvou a vida de milhares de judeus que fugiam à fúria assassina nazi.
Germanófilo convicto, Salazar admirava Franco e disfarçava mal o seu apoio a Hitler e Mussolini, que idolatrava incondicionalmente e de quem mantinha retratos sobre a sua secretária de trabalho.
Soube gerir admiravelmente como obra sua a neutralidade de Portugal na 2º Guerra, fazendo crer que isso se devia mais às suas notáveis capacidades diplomáticas e influência no xadrez político mundial, qual Richelieu de trazer por casa, do que à irrelevância do nosso país no esforço de guerra europeu, com excepção do precioso volfrâmio, que exportava, como é bom de ver, para a Alemanha.
Por isso, escondeu quer os planos de Hitler para a invasão de Portugal (a célebre Operação Leão Marinho) ou o ultimato dos americanos para a utilização dos Açores como base estratégica, que até à última procurou evitar conceder-lhes.
Depois da 2ª Guerra Mundial, e enquanto aqui mesmo ao lado a Espanha, devastada pela Guerra Civil, se ia transformando num dos países mais industrializados e desenvolvidos do mundo que é hoje, em Portugal Salazar defendia a política do «condicionamento industrial» e instituía a «licença de isqueiro» ou proibia a venda de Coca-cola para proteger as medíocres indústrias concorrentes de famílias cuidadosamente protegidas do regime, que enriqueciam com a exploração despudorada de mão de obra barata e desqualificada.
No fim, Salazar transformou Portugal num «país de província» e à sua própria imagem: com ouro debaixo do colchão, mas um país atrasado, seminarista, tacanho, estúpido e de tamancos.
Mas, apesar de tudo, um homem e um governante em quem tantas pessoas não hesitam em votar como «o melhor português».
Decerto pessoas como ele: atrasadas, seminaristas, tacanhas, estúpidas e de tamancos!
sexta-feira, 19 de janeiro de 2007
Como entalar um imbecil
Um tal Dinesh D’Souza (a cacofonia com o português é notável), conhecido nos meios académicos americanos pelas suas ideias ultra-conservadoras, acabou de publicar nos Estados Unidos um livro que tem como sugestivo título mais ou menos isto: «O inimigo em nossa casa: a esquerda cultural e a sua responsabilidade pelo 11 de Setembro».
Claro que é para vender como pãezinhos quentes nos Estados Unidos um livro que atribui toda a responsabilidade pelos ataques terroristas à esquerda e à sua «agressiva campanha à escala global para acabar com os tradicionais valores da família patriarcal».
Mas acontece que o bom do Dinesh D’Souza caiu na asneira de ir promover o seu livro ao programa de televisão de Stephen Colbert.
O resultado é absolutamente notável!!!
(Clicar sobre a imagem para ver o filme)
quarta-feira, 17 de janeiro de 2007
Opinião da Igreja Católica? Não, Obrigado!
Depois do Bispo de Roma, o Papa Rotweiller XVI, ter comparado a prática do aborto ao terrorismo, chegou a vez de um colega seu português, de nome António Montes Moreira, ter comparado o aborto à pena de morte, invocando galhardamente os valores da doutrina cristã e da civilização humana.
A inqualificável falta de dignidade e a chocante desonestidade intelectual da Igreja Católica no que concerne ao aborto, tocam mesmo as raias de um incomensurável absurdo.
É esta mesma Igreja, que agora se vem arrogar ter uma palavra a dizer na sociedade portuguesa no próximo referendo sobre a despenalização do aborto, que sempre foi contra qualquer forma de planeamento familiar que não passe pela contagem dos dias ou pela filiação na Opus Dei.
É esta mesma Igreja que, enquanto clama pelos valores da vida humana, organiza queimas rituais de preservativos e assim se torna cúmplice das terríficas taxas de disseminação da SIDA, principalmente em África.
É esta mesma Igreja que não hesita em achincalhar os sentimentos religiosos dos seus próprios fiéis com a publicação de panfletos com a mãe das suas divindades a chorar, a mesma semi-deusa que há décadas utiliza como instrumento e fonte de receita financeira numa das maiores fraudes religiosas de que há memória.
É esta mesma Igreja que carrega consigo um passado de ignomínia, uma História de sofrimento, de sangue e morticínio, que é sinónimo de atraso social, cultural e civilizacional, que se distingue pela sua visão suja e pecaminosa, típica dos mais abjectos tarados sexuais, sobre tudo o que diga respeito a sexo, que sempre sobrevalorizou a sua doutrina e o seu catecismo à própria vida humana, enquanto persiste em desprezar a mulher, quer na sua própria condição quer até como ser humano.
É esta mesma Igreja para quem o sexo é simplesmente sinónimo de «pecado», para quem amar é «pecar», que não concebe que o seu próprio Deus em visita aos homens pudesse ter sido concebido num acto de amor, que não permitiu sequer à mãe desse seu Deus o privilégio de amar, uma vez mais trata a mulher como um mero objecto, um ser humano de segunda ou terceira categoria a quem não permite sequer o livre arbítrio, a escolha ou a determinação do seu próprio corpo, e a quem antes impõem uma opção pré-determinada pela sua doutrina e pelos seus valores medievais, ainda que isso signifique o drama e o risco de vida do recurso ao aborto clandestino.
É esta mesma Igreja, que proclama os valores de um Deus tirano, impiedoso e sanguinário e a quem, borrada de medo, louvaminha em rituais de amesquinhamento absolutamente desprezíveis e indignos de seres humanos com um mínimo de respeito por si próprios, que se acha agora no direito de interferir na sociedade portuguesa, num assunto em que estão em causa estritos valores éticos.
Porque, de facto, é preciso uma lata gigantesca e um desplante sem fim para que um responsável eclesiástico católico venha invocar os valores da doutrina cristã e da vida humana para comparar o aborto ao terrorismo ou à pena de morte, quando essa mesma doutrina cristã admite precisamente... a pena de morte!
Que estes energúmenos de sotaina, com ou sem sapatinhos vermelhos, usem a arma da desonestidade intelectual para explicarem o seu relativismo moral, isso ainda admito.
Afinal, é disso que eles vivem.
O que não consigo entender é a cumplicidade tácita que tanta gente (quero crer, apesar de tudo, que de boa fé) tão cega a acriticamente ainda lhes entrega.
segunda-feira, 15 de janeiro de 2007
Escolher Pelos Outros
Os juizes do Tribunal de Loures não são excepção à esmagadora maioria dos seus colegas de todo o país: marcam as diligências da manhã todas para a mesma hora, e obrigam-nos a grandes secas à espera da «nossa vez».
Durante uma dessas secas, conversava na sala de advogados com alguns colegas, e inevitavelmente o tema foi cair no próximo referendo sobre a despenalização do aborto.
Dos oito ou nove colegas que lá estavam todos pareciam ir votar "sim".
Menos uma colega que peremptoriamente declarou:
- Pois eu sou completamente contra o aborto; eu própria até já abortei uma vez, mas vou votar "não".
Nem vale a pena comentar nem a hipocrisia nem a imbecilidade desta posição.
Mas talvez naquela sala se tenham de repente reflectido as verdadeiras posições das pessoas que vão votar no referendo do próximo dia 11 de Fevereiro:
- As que optam por uma liberdade de escolha e as que, tantas vezes hipócrita e imbecilmente, se acham no direito de escolher pelos outros...
sexta-feira, 12 de janeiro de 2007
A Vida de Brian
O filme «A Vida de Brian» é talvez a melhor comédia de todos os tempos.
O vídeo abaixo conta de forma notável (e em pouco mais de 40 minutos) o «making of» desta obra prima dos Monty Python, e também as reacções que se lhe seguiram um pouco por todo o mundo.
Mostra o preconceito dos responsáveis da «EMI», que recuaram no seu projecto de produção do filme, e como teve de ser o ex-Beatle George Harrison a financiá-lo.
A pretensão da Igreja Católica de pura e simplesmente querer proibir a exibição do filme (estávamos em 1979), revela-se perfeitamente actual se pensarmos nas mesmíssimas reacções a que assistimos com outros filmes, como «As Horas de Maria», «Je vous salue, Marie», ou ainda mais recentemente com o filme «O Código da Vinci».
E, mais ainda, as posições tomadas pelas escabrosas organizações religiosas inglesas que dão pelos bonitos nomes de «Guardians of Christian Morality» ou «Festival of Light», e a permanente ameaça de procedimento criminal contra os autores do filme pelo «crime de blasfémia», mostram-se inequivocamente assustadoras se pensarmos no inegável paralelismo das bem recentes reacções muçulmanas às famosas «caricaturas de Maomé».
Numa palavra: um documentário absolutamente notável!
quinta-feira, 11 de janeiro de 2007
O Império Satânico
Gostava de um dia perceber se entre os delírios religiosos e as taras sexuais há uma conexão necessária e natural, ou se isso é apenas uma simples e mera coincidência...
quarta-feira, 10 de janeiro de 2007
É tão giro ser católico!
A «BBC» noticia que na África do Sul foram colocados à venda preservativos que se colocam em apenas um segundo.
Willem van Rensburg, o criador deste preservativo, comercializado com a marca «Pronto», espera encorajar uma maior generalização do seu uso na África do Sul, um país onde 5,5 milhões de pessoas estão já infectadas com o vírus da SIDA.
Com efeito, as pesquisas sobre o problema da SIDA na África do Sul revelam que o fraco uso do preservativo é um factor que contribui enormemente para as grandes taxas de infecção com o vírus do HIV. A comercialização de um preservativo muito fácil de usar poderá contrariar essa tendência.
Como é óbvio, a comercialização do preservativo «Pronto» vai encontrar opositores.
Para já espera-se os comentários dos mui católicos ex-vice presidente sul africano Jacob Zuma, que afirmou que lhe bastava tomar um duche depois de ter tido relações sexuais não protegidas com uma mulher seropositiva para não contrair o vírus da SIDA, e da ministra da saúde Manto Tshabalala-Msimang, que ficou a ser conhecida pela «Doutora Beterraba» depois de ter aconselhado os portadores de HIV a comerem alimentos nutritivos como alho e beterraba.
Como se continua também a esperar a fanática oposição da Igreja Católica, de fortíssima implantação e influência na África do Sul, ao uso do preservativo.
De facto, é muito giro ser católico!
Porque, mesmo que de vez em quando se levantem, mesmo internamente, vozes de oposição, que cedo são obviamente abafadas, a Igreja Católica, para gáudio de uns e com a complacência de outros, que apesar disso continuam, babados, a achar que é muito bonito intitularem-se católicos (mesmo que com aquela curiosíssima característica de «não praticantes»), continua a dar mais importância e valor a um dogma religioso inspirado numa imbecil historieta bíblica, do que à própria vida humana.
Mesmo que nessa vida humana, claro, já bata um coração...
terça-feira, 9 de janeiro de 2007
O Preço da Dignidade
Se há alguma coisa de que os professores portugueses têm noção é da realidade precisa e concreta do país em que vivem.
Nem podia ser de outro modo: a proximidade que têm do «país real» no mais variado tipo de escolas e de turmas confere-lhes um lugar privilegiado na ribalta da sociedade portuguesa.
Prova disso é que os professores bem sabem até onde podem ir na sua responsabilidade profissional.
Que fique desde já aqui bem claro, que não pretendo fazer generalizações tão absurdas como injustas para tantos professores que levam a sério e com competência e honestidade as suas profissões.
Mas o que é também facto é que esses mesmos professores, por incompreensível que isso me pareça, estão confortavelmente felizes e conformados em ver-se misturados, confundidos e «metidos no mesmo saco» com toda uma classe que cada vez mais goza da triste fama de ser a classe profissional com os mais elevados índices de absentismo de todas as classes profissionais portuguesas.
Porque são bem conhecedores do país em que vivem, os professores estão já habituados a que para nada contem os resultados da sua competência ou incompetência pedagógica para a sua progressão até ao topo da carreira.
Competentes ou incompetentes, tudo sobe, minha gente!
Como estão também habituados a que nenhum significado relevante tenha a sua assiduidade para a sua avaliação profissional. Ou até para o seu salário.
Até porque há sempre um médico amigo com um modo mais peculiar de encarar a sua honra profissional que passa um atestado, que toda a gente sabe que é falso mas que tem o milagroso efeito de amnistiar todas as faltas.
O absentismo dos professores tocou já as raias de um absurdo de tal ordem, que o Ministério da Educação teve de implementar um sistema de «aulas de substituição».
Estas aulas de substituição teriam a dupla virtualidade de manter ocupados os alunos e de minimizar as consequências da falta do professor, e seriam dadas por outros professores que não estivessem em actividades lectivas embora se encontrassem na escola dentro dos seus horários normais de trabalho.
Pois é: mas os professores e os seus insignes sindicatos não gostaram, e interpretaram esta medida do Ministério da Educação como um autêntico insulto e uma inqualificável afronta à sua honra, consideração e dignidade profissionais.
E então o que fizeram os professores?
Porque são bem conhecedores do país em que vivem, os professores fizeram duas coisas:
Em primeiro lugar andam a fazer de conta que dão aulas de substituição, que acham inúteis e despropositadas, e numa curiosa interpretação do conceito de honestidade profissional, transformam essas aulas num autêntico rega-bofe e põem os alunos a fazer os que muito bem lhes apetece, enquanto eles próprios lêem o jornal ou jogam "Sudoku".
Em segundo lugar, e porque são bem conhecedores do país em que vivem, os professores sabem bem que os tribunais e os juizes portugueses não têm, na sua generalidade, a mínima noção do conceito de «separação de poderes», e acham que vivem numa «República de Juizes» onde o poder judicial (que curiosamente nem sequer é democraticamente legitimado por eleições) se deve sobrepor ao poder legislativo e ao poder executivo.
Prova disso, foi o provimento dado a algumas providências cautelares contra o encerramento de maternidades determinado pelo Ministério da Saúde dentro das normais competências administrativas que lhe competem.
E então, e porque são bem conhecedores do país em que vivem, os professores e os seus ilustres sindicatos decidiram demandar o Ministério da Educação nos tribunais administrativos procurando que as tais infames aulas de substituição, e que tão ofensivas são para a dignidade profissional dos professores, lhes sejam pagas como... horas extraordinárias.
Isto apesar de serem dadas durante os seus horários normais de trabalho!
E porque todos somos bem conhecedores do país em que vivemos, não é de admirar, pois, que já em dois casos distintos os tribunais administrativos tenham descoberto o curioso conceito de «trabalho extraordinário dentro do horário de trabalho» e tenham decidido nesse sentido.
Ou seja:
As famigeradas aulas de substituição de repente deixam de ser uma aberração, deixam de ser inúteis e deixam até de ser uma afronta à dignidade dos professores, mas unicamente desde que sejam... pagas como horas extraordinárias!!!
É como se, de repente, os professores tivessem encontrado na remuneração extraordinária de cada uma dessas aulas de substituição o preço da sua dignidade profissional...
Senhora ministra: por favor, não desista!!!
segunda-feira, 8 de janeiro de 2007
A Distribuição Igualitária
O «Diário de Notícias» refere que uma seguradora do Canadá fez um estudo exaustivo da correlação entre o signo do condutor e o seu historial de condução.
Depois de descobrir que, por exemplo, os melhores condutores são do signo de Leão e os piores são do signo de Balança, essa seguradora está agora a estudar de que forma esta notável descoberta científica poderá vir a ter reflexos no cálculo dos prémios dos seguros.
Não sei como é que os accionistas desta companhia de seguros vão encarar esta brilhante e tão científica forma de gestão.
Mas já calculo o entusiasmo com que tantos aldrabões por esse mundo fora vão aqui descortinar uma explicação científica para a Astrologia, essa autêntica fraude legalizada com que ao longo dos anos vêm extorquindo dinheiro às pessoas mais incautas.
Claro está que nunca ninguém explicou a esta gente as mais elementares noções se não de estatística pelo menos de lógica e de bom senso.
Mas, admito, talvez seja um pouco difícil explicá-las a quem acredita piamente que a personalidade e até o destino de uma pessoa são determinados ou influenciados pelo dia do ano em que nasceu ou que uma conjunção de Júpiter e Saturno em determinadas condições pode provocar-lhe doenças de fígado.
Como explicar a esta gente que se fizermos uma simples sondagem a pessoas que sejam adeptas do Benfica, por exemplo, resultará necessariamente que um dos doze signos do zodíaco terá uma percentagem maior de benfiquistas que todos os outros.
Como dizia o outro, é tão óbvio que até chateia!
De facto, seria estatisticamente muito improvável que todos os doze signos tivessem uma distribuição precisa e rigorosamente igual.
Do mesmo modo que, como é sabido, a generalidade das pessoas não nasce em números rigorosamente iguais em cada um dos 365 dias do ano.
Imaginemos então que resulta dessa sondagem que há uma maior incidência de pessoas do signo Gémeos, por exemplo, entre os adeptos do Benfica.
Pois o que esta gente está a fazer é a virar o bico ao prego e a concluir:
- As pessoas do signo gémeos são mais propensas a ser adeptas do Benfica!!!
É bonito, não é?
Provavelmente só haverá uma coisa que terá uma distribuição estatisticamente igualitária por todos os signos do zodíaco: a estupidez humana!
quinta-feira, 4 de janeiro de 2007
Coerência? Não, obrigado!
«Contribuir com os meus impostos para financiar clínicas de aborto? Não, obrigada».
- Cartaz publicitário da campanha do «não» no referendo sobre o aborto.
«Contribuir com os meus impostos para financiar tratamentos médicos a mulheres que abortaram clandestinamente? Não, obrigado».
«Contribuir com os meus impostos para financiar tratamentos médicos a fumadores? Não, obrigado».
- Prováveis próximos cartazes publicitários da campanha do «não» no referendo sobre o aborto.
quarta-feira, 3 de janeiro de 2007
O Sr. Almirante
A falta de tempo e a sua inequívoca actualidade decerto justificarão a repetição deste texto, publicado no «Random Precision» aqui há coisa de um ano.
Mas não está o auto-plágio na moda?
Trata-se de algumas das inúmeras «pérolas» proferidas pelo Almirante Américo Tomás que, por mais incrível que isso agora nos pareça, foi durante quase duas décadas Presidente da República de Portugal.
Aqui vão elas:
«A hora vai demasiadamente adiantada, precisamente porque nós estamos muito atrasados e é por isso que limitarei as minhas palavras às indispensáveis»
«Começo por me congratular com a inauguração deste melhoramento; melhoramento da maior importância para os povos desta região, melhoramento que, evidentemente, não pode comparar-se àqueles que inaugurei faz hoje precisamente um ano».
«Mas as obras, como os homens, não se medem aos palmos e, para esta região, a Ponte da Varela terá certamente mais importância que a ponte da Arrábida».
«A minha boa vontade não tem felizmente limites. Só uma coisa não poderei fazer: o impossível. E tenho verdadeiramente pena de ele não estar ao meu alcance».
(in «Diário de Notícias», 23/6/1964).
«Ao visitar todas as terras de Portugal, embora só tenha nascido numa, parece que, afinal de contas, pelas saudades que todas me deixam, nasci simultaneamente em todas elas».
«O Sr. Prof. Oliveira Salazar, ao longo de mais de trinta anos, é uma vida inteiramente sacrificada em proveito do país, e desconhecendo completamente todos os prazeres da vida, é um homem excepcional que não aparece, infelizmente, ao menos, uma vez em cada século, mas aparece muito raramente ao longo de todos os séculos».
(in «Seara Nova», Maio 1965).
«Foi uma manhã sumamente produtiva, porque numa das cerimónias cumprimos o preceito; e na outra prestámos homenagem de gratidão».
«Neste almoço ouvi vários discursos, que o Governador Civil intitulou de simples brindes. Peço desculpa, mas foram autênticos discursos».
«... com palavras que dirigiu a minha mulher e a mim, pode crer que apreciámos os dois, sumamente.
«Não queremos sequer ponderar se elas foram ou não inteiramente justas; mas como foram inteiramente sentidas, é como se fossem inteiramente justas».
«Não queremos sequer ponderar se elas foram ou não inteiramente justas; mas como foram inteiramente sentidas, é como se fossem inteiramente justas».
(in «Diário de Notícias», 14/9/1970).
«Pedi desculpa ao Sr. Engº. Machado Vaz por fazer essa rectificação. Mas não havia razão para o fazer porque, na realidade, o Sr. Engº. Machado Vaz referiu-se à altura do início do funcionamento dessa barragem e eu referi-me, afinal, à data da inauguração oficial. Ambas as datas estavam certas.
«E eu peço, agora, desculpa de ter pedido desculpa da outra vez ao Sr. Engº. Machado Vaz».
(in «Seara Nova», Agosto 1972).
«Eu prolongo no tempo esse anseio de V. Exª. e permito-me dizer que o meu anseio é maior ainda. Ele consiste em que, mesmo para além da morte, nós possamos viver eternamente na terra portuguesa, porque se nós, para além da morte, vivermos sempre sobre a terra portuguesa, isso significa que Portugal será eterno, como eterno é o sono da morte».
(in «Diário da Manhã, 24/5/1969).
«É a primeira vez que visito oficialmente Celorico da Beira. Nos meus longos anos de chefia do Estado tenho visitado certamente milhares de terras do nosso país.
«No entanto, algumas não tiveram ainda oportunidade de receber a visita de um Chefe de Estado e esta era uma delas.
«É, pois, não só a minha primeira visita, como a primeira visita de um Chefe de Estado a esta histórica terra .
«E ainda bem que assim foi».
«E ainda bem que assim foi».
(in «República», 18/11/1972).
«Lembrei que há 4 anos e quase um mês, aqui estive. Voltei hoje em circunstâncias totalmente diferentes.
«O entusiasmo é o mesmo, o desejo de bem servir nunca me abandonou nem abandonará.
«Nesse aspecto, sou digno de elogio; talvez seja o único aspecto em que o mereça».
«Nesse aspecto, sou digno de elogio; talvez seja o único aspecto em que o mereça».
(in «O Segundo Mandato na Chefia do Estado»)
«Quem me ouviu falar pode supor que tenho espírito de guerreiro. Não, não sou um guerreiro; sou apenas um homem que deseja o bem de Portugal e a verdade é que também, muitas vezes, o bem se consegue através do mal».
(in «Diário de Notícias», 26/6/1970).
«A minha dificuldade reside somente na impossibilidade de compreensão para o que me não é possível compreender».
(in «O Segundo Mandato na Chefia do Estado»).
terça-feira, 2 de janeiro de 2007
O Pesadelo dos Ateus
Até que enfim!
Foi encontrado um argumento absolutamente irrefutável, que nenhum ateu se atreverá sequer a desmentir ou a pôr em causa, e que de uma vez por todas desmente e faz cair por terra a teoria da evolução, e demonstra inequivocamente que tudo o que existe no Universo resulta da criação e é obra de Deus.
Foi finalmente encontrado o argumento final para a existência de Deus e que é um autêntico pesadelo para os ateus: a banana!