sexta-feira, 29 de dezembro de 2006
Um bom ano de 2007!
O «Random Precision» vai passar o fim-do-ano fora, lá fora.
Por isso, cá fica com alguma antecedência o tradicional post de fim-de-ano, e que (com algumas diferenças) publico pela terceira vez.
Cá vai:
Stanley Milgram, professor de psicologia social na Universidade de Yale, levou a cabo em 1974 uma experiência com o objectivo de estudar a «Obediência à Autoridade»:
Entre pessoas comuns (operários, estudantes, secretárias, empresários, lojistas, etc.) foram recrutados voluntários a quem foi atribuído o papel de “professores”.
Esses “professores” foram instruídos a aplicar choques eléctricos de intensidade crescente (de 15 a 450 Volts) num outro indivíduo (que estava amarrado a uma cadeira com eléctrodos numa sala adjacente), e que era designado "estudante".
Os choques seriam administrados todas as vezes que o "estudante" errava uma resposta a um questionário previamente determinado.
Milgram tinha explicado aos "professores" recrutados que o objecto daquele estudo residia precisamente nos efeitos da punição sobre a memória e sobre aprendizagem.
Como é óbvio, o "professor" não sabia que o "estudante" da pesquisa era afinal um actor, que convincentemente interpretava e manifestava desconforto e dor a cada aumento da potência dos “choques eléctricos” que lhe eram pretensamente infligidos.
O resultado da experiência foi absolutamente perturbador e mais “chocante” que qualquer voltagem aplicada:
Nada menos do que 65% das pessoas envolvidas – os "professores" – chegaram mesmo, e sem qualquer hesitação, a administrar ao "estudante", sob ordens do cientista (que na experiência representava a “autoridade”) os choques mais potentes, dolorosos (de 450 volts) e claramente identificados como perigosos e... potencialmente mortais!
E todos os "professores" - mas todos eles - administraram pelo menos 300 Volts!
Em muitos casos houve "professores" que a determinada altura da aplicação dos choques eléctricos se preocuparam com o bem-estar do "estudante" e até perguntaram ao cientista quem se responsabilizaria caso algum dano viesse a ocorrer.
Mas quando o cientista os descansou, afiançando-lhes que assumiria toda e qualquer responsabilidade do que acontecesse e os encorajou a continuar, todos os "professores" persistiram na aplicação dos choques com as voltagens mais elevadas, mesmo enquanto ouviam gritos de dor e súplicas dos “estudantes” para que os parassem.
É esta “obediência”, firmada em primeiro lugar na ausência de um consciência individual, e que é cega a qualquer noção de ética, censura moral ou até à mais básica dignidade humana, que leva às barbaridades praticadas pelos Homens.
Seja em nome de uma ideologia, de uma política e até mesmo de uma religião;
Seja nas ditaduras latino americanas, na União Soviética, na Alemanha de Hitler, ou noutro país qualquer, até mesmo em Portugal.
E que conduz ao Holocausto ou aos Gulags e ao extermínio de milhões de pessoas.
Que conduz a uma Inquisição ou a um terrorismo frio e sem rosto que torturam e matam em nome de Deus.
As ditaduras podem ser instituídas por uma “Junta Militar”, por uma religião, ou por um qualquer punhado de indivíduos que assumiram num país uma tal concentração de poderes que lhes permite a prática impune de tudo o que lhes vem à ideia.
Mas só é possível – sejamos claros – com a complacência, com a cumplicidade de toda a estrutura da sociedade.
De todos nós!
De facto, Stanley Milgram repetiu a sua famosa experiência em mais de uma dezena de outros países, de todos os continentes, sempre com resultados absolutamente idênticos.
Do Chile de Pinochet ao Cambodja de Pol Pot, passando pelo Portugal da Pide e dos Tribunais Plenários, será talvez a “obediência” e a "falta de sentido crítico" que explicam porque motivo pessoas comuns, colocadas em determinadas circunstâncias e sob a influência de uma autoridade – política, ideológica ou religiosa – que nem sequer se lembram de questionar (e que antes procuram impor aos outros), sejam capazes de cometer os crimes mais hediondos.
E é até irónico que virtudes humanas como a lealdade, o sacrifício próprio, a disciplina ou o amor ao próximo, e que tanto valorizamos, sejam as mesmas propriedades que criam máquinas destrutivas de guerra, corrupção e morte, e ligam homens e mulheres a sistemas, ideologias, religiões e princípios perversos.
E é até irónico que virtudes humanas como a lealdade, o sacrifício próprio, a disciplina ou o amor ao próximo, e que tanto valorizamos, sejam as mesmas propriedades que criam máquinas destrutivas de guerra, corrupção e morte, e ligam homens e mulheres a sistemas, ideologias, religiões e princípios perversos.
Ideologias e princípios, quer políticos quer religiosos que são, ainda hoje, cega, acrítica e incondicionalmente apoiados e seguidos por tantas e tantas pessoas.
É a este planeta, habitado pelos humanos, que desejo um bom ano de 2007!