terça-feira, 24 de outubro de 2006

 

A história de uma professora do ensino superior



Uma coisa é inquestionável: Isabel Magalhães Colaço foi uma mulher absolutamente admirável!

Quando morreu, no dia 1 de Novembro de 2004, Portugal perdeu uma das suas mais brilhantes académicas e uma das pessoas mais notáveis que já por aqui passaram.

Nascida em 1926, licenciou-se em direito em 1948, aos 22 anos, com 19 valores.
Ora, uma mulher licenciar-se na Faculdade de Direito de Lisboa na década de 40, quando os professores mandavam as alunas «coser meias» nas orais, já é obra.
Para se licenciar com 19 valores é porque se calhar merecia pelo menos o dobro...

Isabel Magalhães Colaço foi a primeira mulher a doutorar-se em direito em Portugal.
No entanto, e apesar da sua genialidade, pelo simples facto de ser mulher só foi convidada para assistente depois de defender com invulgar brilhantismo a sua tese de doutoramento, já em 1954.
Só então os grandes mestres da corporação, com Marcelo Caetano à frente, lá autorizaram a sua contratação como assistente e a sua regência da cadeira de Direito Internacional Privado.

Todos os seus alunos recordam a sua extrema competência técnica e didáctica, e a sua verticalidade pessoal.
Deve ter sido talvez a única professora da Faculdade de Direito de Lisboa que antes do 25 de Abril teve a coragem de se manifestar frontalmente contra os «gorilas» que a polícia política punha a vigiar os alunos.

Os seus alunos recordam ainda a sua grande exigência nos exames e como tinham de «empinar» a sério a sua «sebenta», que não era mais do que o resultado da publicação da sua brilhante tese de doutoramento.

Pois é.
Até aqui tudo bem.

Só que, desde que a Profª. Isabel Magalhães Colaço se doutorou e começou a dar aulas, em 1954, até que se jubilou, em Maio de 1996, passaram 42 anos.
O pior é que nesses 42 anos a Profª. Isabel Magalhães Colaço foi a regente ou, por outras palavras, a «dona» da cadeira de Direito Internacional Privado.
E nesses 42 anos todos os seus alunos estudaram meticulosamente a cadeira de Direito Internacional Privado pela «sebenta» da sua tese de doutoramento.

E nesses 42 anos, com excepção de dois ensaios em 1968 e em 1971, a Profª. Isabel Magalhães Colaço não se deu ao trabalho de publicar absolutamente mais nada.
E nos 25 anos que vão de 1971, até que se jubilou, então nem sequer um mísero ensaio viu a luz do dia.

Com excepção da publicação de algumas compilações de aulas gravadas, realizadas por alunos seus, como era moda naquela época, todos os alunos que nesses 42 anos fizeram a cadeira de Direito Internacional Privado na Faculdade de Direito de Lisboa tiveram de estudar por sucessivas gerações de fotocópias de fotocópias de fotocópias, para o fim já muito sumidas, da «sebenta» da velha tese da Profª. Isabel Magalhães Colaço.

Dizia-se nos corredores da Faculdade de Direito de Lisboa que a Profª. Isabel Magalhães Colaço, a «Magalhoa», como carinhosamente lhe chamavam, nem sequer fazia uma nova edição da sua «sebenta» para não ter de a actualizar.
Foi decerto para afastar esses boatos que a Profª. Isabel Magalhães Colaço decidiu em 1984 publicar novamente a sua «sebenta».
Mas não a actualizou...

E foi assim que nesses 42 anos o ramo do Direito Internacional Privado ficou completamente estagnado e sem qualquer evolução na Faculdade de Direito de Lisboa.

E foi assim que nesses 42 anos ninguém sequer ousou pensar em atrever-se em afrontar a «nomenklatura» da Faculdade de Direito de Lisboa.
Aliás seria inútil.
Pois não era a Profª. Isabel Magalhães Colaço, professora catedrática de «nomeação definitiva» da Faculdade de Direito de Lisboa, a regente, a «dona» da cadeira de Direito Internacional Privado?

Senhora ministra: por favor, não desista!




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