quinta-feira, 18 de maio de 2006
O sentido do ridículo
Um projecto de lei do Partido Socialista sobre as novas regras a que deverá passar a estar submetido o protocolo de Estado exclui o cardeal patriarca de lugares de honra nas cerimónias oficiais, como ainda tinha recentemente sucedido na tomada de posse de Cavaco Silva.
Segundo o próprio grupo parlamentar do PS a nova lei não fará mais do que respeitar a Lei da Liberdade Religiosa, que impõe expressamente o «princípio da não confessionalidade do actos oficiais e no protocolo de Estado.
Como não podia deixar de ser, logo veio o Patriarcado lamentar-se «não ter sido objecto de qualquer informação ou consulta».
E não só: com aquele ar alucinado pelo voto de castidade, Mota Amaral declarou à comunicação social que está a preparar um projecto de lei alternativo sobre esta matéria, dizendo que a proposta do PS «não faz sentido».
E acrescenta: «O lugar dos membros da Igreja nas cerimónias oficiais não tem a ver com a separação entre o Estado e as Igrejas, mas com a História e com o conhecimento da sociedade portuguesa».
Não estranho que ao fim de tantos anos de inexplicáveis privilégios a Igreja Católica ainda pense e mantenha a ilusão de que tem o direito de ser consultada pelo Parlamento antes da votação de uma lei, qualquer que ela seja.
Mas já estranho que alguém que foi durante tantos anos presidente da Assembleia da República tenha os sentidos tão embotados pelas hóstias e pela falta de sexo que não conheça a Constituição Portuguesa, e que não saiba o que significa a expressão «Estado laico».
Já acho um pouco esquisito que um fervoroso católico venha invocar a História de Portugal como argumento para a continuação dos privilégios protocolares da Igreja nas cerimónias oficiais, escassas semanas após a passagem dos 500 anos sobre aquele que ficou conhecido como o «Pogrom» ou o «Massacre de Lisboa».
Já acharia mais engraçado, confesso, ver, numa cerimónia oficial qualquer, uma frisa de líderes religiosos muito bem vestidos a preceito e alinhadinhos ao lado uns dos outros, todos muito ufanos a querer marcar uma posição que não sei qual é, desde muçulmanos a judeus, passando por um bispo da IURD e, claro está, pelo inefável Jorge Tadeu, tudo isto abrilhantado por um sujeito vestido com umas saias ridículas e um chapeuzinho vermelho no alto da cabeça.
Mas porque será que, tantas e tantas vezes, aquilo a que as pessoas chamam orgulhosamente a sua “fé” as faz desde logo perder o sentido do ridículo?