segunda-feira, 7 de novembro de 2005

 

O Cobrador Vai Nu



Há já alguns anos que uns determinados sujeitos trazidos pelos ventos de Espanha, muito cordatos e com um inegável bom aspecto, assentaram arraiais em Portugal.

E, sob a capa de uma marca registada, primeiro como “O Cobrador do Fraque”, e mais tarde rebaptizada como “O Homem do Fraque” dedicam-se a fazer aquilo a que chamam «cobranças difíceis» e exigindo como honorários uma percentagem do dinheiro que conseguem recuperar.

A táctica é tão simples como eficaz:
Fazendo-se transportar num automóvel que tem pintado o logotipo da empresa, dois sujeitos com cara de poucos amigos, vestidos de fraque preto e de físico avantajado de praticantes de halterofilismo, assim estilo porteiros de casas de alterne, abordam o alegado devedor e “convencem-no” a pagar as suas dívidas.

Como eu próprio uma vez assisti, chamado “de urgência” por um cliente aterrorizado, os métodos de persuasão desta gente são mascarados com eufemismos e palavras mansas.
Mas são óbvias e claríssimas as ameaças de consequências físicas bem específicas e determinadas para a pessoa do devedor e, principalmente, – e aqui está a principal eficácia – para a sua própria família.

Como é por demais óbvio, toda esta “actividade empresarial” constitui crime de natureza pública, ainda por cima praticado de forma concertada e organizada.

Mas, por curioso e estranho que pareça, e publicitando até abertamente a sua actividade nos principais jornais nacionais, com moradas e tudo, há largos anos que esta gente (e quem os contrata) actua em Portugal, com a inteira complacência do Ministério Público.

E a sensação de impunidade é já de tal ordem, que esta boa gente não hesita mesmo em fazer publicar anúncios no «Expresso» alertando os seus “clientes” para uns facínoras que se andam a aproveitar abusivamente a sua marca registada, e ameaçando-os de participação criminal por esta tão reprovável e iníqua actuação!

Se isto não parecesse retirado de um episódio da «Twilight Zone», diria que qualquer dia ainda aparecem por aí nos jornais anúncios de gangs de vendedores de droga a ameaçar os membros dos gangs vizinhos que os põem em tribunal por devassa de zonas de influência, ou até mesmo anúncios de autarcas que ameaçam demandar criminalmente empresas de construção civil pelo atraso no pagamento de uma percentagem qualquer.

Enquanto isto, o Sr. Procurador Geral da República, Dr. Souto de Moura, vai dirigindo alegremente o nosso Ministério Público e ocupando o seu tempo a fazer comunicados de desagravo a cidadãos sujeitos a inexplicáveis buscas domiciliárias, tentando minimizar as consequências de vergonhosas fugas ao segredo de justiça provindas de dentro dos seus próprios serviços, mas que, apesar disso, é incapaz de impedir ou sequer investigar.

Ao mesmo tempo, com aquele sorriso franco e simples que lhe é peculiar, Souto de Moura parece corporativamente conformado com investigações criminais incompetentes e absurdas, com os processos que prescrevem aos milhares nos gabinetes dos seus magistrados e com a promiscuidade e frequente subserviência do seu relacionamento com a magistratura judicial.

Entretanto, António Cluny e Baptista Coelho andam a tentar convencer-nos que o que os magistrados precisam é de dois meses de férias de Verão e de privilégios especiais de assistência na saúde e na sua aposentação para então se sentirem verdadeiramente “independentes”.

Embora, muito curiosamente, já tenham dado a entender que estão abertos a trocá-los por melhorias salariais... «a negociar»...




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