quinta-feira, 19 de maio de 2005
A Minuta
O meu cepticismo quanto ao funcionamento da Justiça em Portugal, principalmente no que se refere aos órgãos de investigação e acção criminal, leva-me muitas vezes a evitar comentar casos judiciais pendentes.
Muito mais quando está em causa a honorabilidade das pessoas envolvidas.
Só conheço o que li nos jornais sobre a investigação criminal que procura apurar a amplitude das relações entre diversas empresas do Grupo Espírito Santo e determinados membros do Governo de Pedro Santana Lopes.
Sei que foram constituídos arguidos três administradores do Grupo BES: Luís Horta e Costa, Carlos Calvário e José Manuel Santos.
Foi também constituído arguido Abel Pinheiro, que no tempo de Paulo Portas foi o responsável pelas finanças do CDS-PP, e que sei que é de muito boas famílias.
Foi ainda constituído arguido o antigo ministro do Ambiente, Luís Nobre Guedes, igualmente militante do CDS-PP, e de quem só sei que tem uma casa na Arrábida.
Sejamos então politicamente correctos: confiemos «na acção da Justiça» e não esqueçamos a «presunção de inocência» de que gozam todos os visados.
Mas leio hoje no «Público» que a Polícia Judiciária apreendeu nas instalações da «Escom» nada menos do que a minuta preparatória do despacho dos ex-ministros Nobre Guedes, Telmo Correia e Costa Neves que declarou a «imprescindível utilidade pública» do empreendimento turístico do Grupo Espírito Santo em Benavente.
Não quero pensar agora no que tal situação significa em concreto para a honorabilidade dos ex-ministros envolvidos, ou qual o verdadeiro alcance de um «despacho pré-datado».
Não sei, nem faço a mínima ideia, se os arguidos são ou não culpados dos crimes de tráfico de influências (ou até de corrupção) por que estão já indiciados.
Não sei, nem faço a mínima ideia se é verdadeiro o autêntico regabofe de que acusam a generalidade dos membros do anterior Governo, principalmente desde a altura em que o Presidente dissolveu a Assembleia da República.
Mas já sei perfeitamente o que significa encontrar uma minuta de um despacho ministerial de um Governo de um Estado de Direito, nas instalações de uma empresa privada que sai beneficiada desse mesmo despacho!