sábado, 27 de novembro de 2004

 

A Denúncia



Só nos primeiros 10 meses de 2004 a Polícia Judiciária recebeu mais denúncias de casos de pedofilia que nos dois anos anteriores juntos.
Não que estes números reflictam um aumento dos casos de abuso sexual de menores: o que acontece é que aumentou exponencialmente o número de denúncias.
Isso deve-se, decerto, à extraordinária mediatização do «Caso Casa Pia» que trouxe às pessoas uma maior consciencialização para as questões da Justiça de um modo geral, e para a brutalidade dos crimes sobre as crianças, em particular.
Ainda bem!

Mas não resisto a contar aqui resumidamente um caso que profissionalmente acabou de me passar pelas mãos.
Infelizmente, e como é de calcular, são as crianças quem em primeiro lugar sofre com a separação dos pais, principalmente em complexos casos de divórcio.
E é frequente que acabem por servir de “arma de arremesso” entre os pais e de motivo de pressões e chantagens com vista à obtenção de melhores condições processuais ou até materiais. O que, diga-se de passagem e sem qualquer misoginia, é principalmente feito pelas mães, porque é a estas que fica normalmente confiado o poder paternal.
Este caso com que lidei não foi excepção: pretendia a mãe um aumento do montante da pensão de alimentos para uma menina de 5 anos, de € 200,00 para € 300,00 mensais.
Não é muito, de facto.
Mas acontece que o pai ganha € 650,00 por mês (aproximadamente o salário da mãe) e tem uma outra filha de 8 anos de um anterior casamento a quem presta alimentos, também em montante de € 200,00.
Depois de pagar as pensões às duas filhas sobram-lhe somente € 250,00 para a totalidade da sua própria subsistência. O aumento pretendido reduziria este montante para € 150,00 mensais.
O caso acabou por ser judicialmente decidido e, tendo o juiz sido sensível aos argumentos do pai, manteve o montante de € 200,00, já fixado.
Furiosa e inconformada com esta decisão, e sem que mais ninguém ouvisse, a mãe não regateou ameaças logo à saída do Tribunal: «Isto não fica assim; nem sabes o que te vai acontecer».

Meu dito meu feito: meia dúzia de dias depois, regressada a filha de um fim de semana, a mãe apresentou queixa na Polícia contra o pai, acusando-o de «molestar sexualmente a criança».
Depois, pediu uma certidão da queixa apresentada e entregou-a no Tribunal.
Como é óbvio, o juiz decretou de imediato e cautelarmente a suspensão da permanência da menor com o pai, que se vê agora não só na contingência de se defender judicialmente da mais vil das acusações mas até com a incrível responsabilidade de «provar a sua inocência» no mais abjecto dos crimes.
Para além de que, se virmos bem (e apesar dos exames médicos entretanto já realizados nada terem detectado de anormal), este pai está neste momento já definitivamente condenado a uma autêntica «suspeita perpétua», não lhe servindo de consolação saber que tudo isto poderia acontecer «a qualquer um».

Só mais uma coisa: há seis meses que não vê a filha...



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