segunda-feira, 18 de junho de 2007

 

Será que é realmente possível aprendermos a gostar das pessoas que não são como nós?



Através do site de Richard Dawkins cheguei a este artigo publicado no «Times Online» da autoria de Jonathan Sacks, que é o Rabi líder da «United Hebrew Congregations of the Commonwealth».
Embora (como seria obviamente de esperar) não concorde com tudo o que se diz no artigo, não hesito em deixar aqui a sua tradução, embora bastante "livre" e um pouco resumida.

«O ateísmo vende.
Primeiro «The End of Faith» de Sam Harris foi um sucesso nos Estados Unidos. Depois vieram «Breaking the Spell» de Daniel Dennett», «The God Delusion» de Richard Dawkins» e «Against All Gods» de A. C. Grayling. E agora «God is not Great» de Christopher Hitchen está nos tops de vendas em ambos os lados do Atlântico.

Claro que houve várias réplicas eclesiásticas a estes livros, normalmente a dizer que o ateísmo é, ele próprio, uma fé, ou que existem tantos fundamentalistas seculares como religiosos. Isto seria ideal para quem gosta de polémicas destrutivas.
Mas, se formos honestos, de facto isso não basta.

Conta-se uma história de Yochanan ben Zakkai, um professor judeu do século I que foi desafiado por um romano a propósito de um ritual judaico:
«Pura superstição», disse o romano; «Nada disso», retorquiu o rabi, e deu-lhe de seguida uma resposta de acordo e em total coerência com as crenças religiosas do romano, e que obviamente o satisfizeram plenamente.
Quando o romano se foi embora, os discípulos perguntaram ao rabi:
«Bem, isso foi o que respondeste ao romano; o que nos terias respondido a nós?»

Esta é, de facto, a verdadeira questão. O ateísmo não surge do nada; o agnosticismo e a indiferença, sim.
As pessoas desinteressam-se, a religião cessa de as inspirar, e então descobrem coisas bem melhores para fazerem.
O ateísmo é diferente. O ateísmo é uma forma de protesto.
Se alguma coisa corre realmente mal na vida religiosa, as pessoas sentem-se motivadas a escrever livros onde dizem essencialmente: «isso em meu nome, não!».
Quando isso acontece, uma simples desculpa nunca será suficiente. Porque quando o debate acabar, uma coisa restará dentro da alma do crente que se recusará a calar-se: «Bem, isso foi o que lhe respondeste; e então o que nos vais responder a nós?».

A Secularização, o grande movimento do pensamento europeu que se iniciou no século 17, não começou porque as pessoas deixaram de acreditar em Deus. Pelo contrário, os grandes heróis deste movimento de Secularização, Newton e Descartes, acreditavam em Deus. E bastante, diga-se de passagem.

O que eles perderam foi a fé foi na capacidade das pessoas religiosas viverem juntas e em paz.
Os católicos e os protestantes tinham-se guerreado por toda a Europa, naquilo que Hobbes chamou «uma guerra de cada um dos homens contra cada um dos homens».

Não podia ter sido de outro modo. E foi então que, primeiro a ciência, depois a filosofia, a política e a cultura, foram redefinidas em bases que não dependiam de doutrinas ou dogmas mas, em vez disso, no experimentalismo e na observação, na razão e na dedução.

Tal como acontecia na ocasião, também agora os sunitas e os shiitas continuam a lutar no Médio Oriente, os muçulmanos e os hindus na Caxemira, os budistas e os hindus no Sri Lanka, e os muçulmanos e os judeus em Israel.
Mas duas coisas acontecem agora nesta nossa época pós-moderna e pós-Guerra Fria: a religião, frequentemente disfarçada de pressupostos ou fundamentos étnicos regressou à arena política; e as religiões continuam sem saber como conviver em paz umas com as outras.

De certa maneira, nós já passámos por tudo isto. Mas por outro lado ainda não passámos.
E isso não é só porque os nossos poderes de destruição são agora muito superiores, mas antes porque as tecnologias de comunicação global significam que qualquer conflito é agora imediatamente conhecido em todo o lado.
Batalhas travadas a milhares de quilómetros de distância são agora transmitidas para todo o mundo, criando tensões em campus universitários, em instituições de caridade e em igrejas, criando divergências de opiniões, destruindo amizades e dividindo sociedades.

E é então que as pessoas começam a escrever livros sobre o ateísmo e esses livros se transformam imediatamente em “bestsellers”.
Porque se a grande força da religião é que ela cria comunidades e as une, a sua grande fraqueza é que é ela também quem divide essas mesmas comunidades.
E as duas andam sempre lado a lado: por cada «um de nós» há também «um deles», e quanto mais forte for a convicção de uma, mais profundo é sempre o constrangimento em relação à outra..
Aquilo que nos junta é também aquilo que nos separa. Sempre foi assim.

A verdadeira batalha, e isto aplica-se tanto ao secularismo como à religião, é a seguinte:
Poderemos nós, em vez de odiar, amar as pessoas que não são como nós?

Nós somos animais tribais. Estamos programados para o conflito.
Os sociobiologistas chamam a isto «código genético»; os cristãos chamam-lhe «pecado original» e os judeus chamam-lhe «tendência para o mal».

Se é assim, então a única crença que nos une é que o instinto não tem a última palavra.
Genes Egoístas podem produzir pessoas altruístas. Isso é um milagre ou acontece por mero acaso?
Existe um criador omnipotente ou um Relojoeiro Cego?
Isso são, de facto, questões importantes.

Mas a questão verdadeiramente urgente é esta:
Poderemos nós, crentes e não-crentes, dar as mãos de modo a lutarmos juntos pela paz e contra aqueles que procuram a globalização da guerra?».




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