segunda-feira, 10 de agosto de 2009

 

Encerrado Para Descanso do Pessoal



O «Random Precision» está de férias.

Voltamos em Setembro.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

 

O Acórdão do Tribunal Constitucional



Já não era sem tempo:
Ao fim de quase dois anos, o Tribunal Constitucional lá se dignou pronunciar-se sobre o que pensa do acesso ao casamento civil a TODOS os cidadãos.

O Acórdão pode ser lido na íntegra aqui mesmo ao lado no «Advogado do Diabo».


Dos cinco juízes que conheceram do recurso da Teresa e da Lena, três negaram-lhe provimento, enquanto dois votaram favoravelmente a sua procedência.

O que é mais espantoso, é que pudemos ficar a saber que os juízes do nosso Tribunal Constitucional conhecem efectivamente a Constituição da República Portuguesa.
Tanto assim, que não hesitam em citar profusamente o n.º 1 do artigo 36º da Constituição, que reza assim:
«TODOS têm o direito de constituir família e de CONTRAIR CASAMENTO em condições de plena igualdade».

Contudo, não sem surpresa, tenho de o admitir, o Tribunal Constitucional decidiu assim:

«Improcede, assim, a alegada violação do direito a contrair casamento e, ainda, a dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, sendo certo que é manifestamente deslocada a invocada violação da garantia de constituição e tutela de família, resultante do artigo 36.º, n.º 1, conjugado com o artigo 67.º da Constituição, já que nada obsta a que as recorrentes, mesmo sem a celebração jurídica do casamento, pudessem ou possam constituir "família"».

Sim, é verdade: o Tribunal Constitucional achou que nada obsta a que TODOS possam constituir família, tal como esse direito fundamental vem previsto no n.º 1 do artigo 36º da Constituição.

Quanto ao direito a contrair casamento, o caso é diferente.
Considerou-se assim no acórdão:
«…saber se as normas impugnadas violam o princípio da igualdade é uma questão cuja resposta se encontra na concepção do casamento adoptada. Se se entender o casamento como uma instituição social que é apresentada aos cônjuges com um significado relativamente estável, enquanto união entre homem e mulher, designadamente assente na função que lhe cabe na reprodução da sociedade, pode fazer sentido reservar o casamento aos casais heterossexuais. Pelo contrário, apenas se se adoptasse uma concepção do casamento como relação puramente privada entre duas pessoas adultas, sem qualquer projecção na reprodução da sociedade, a exclusão dos casais homossexuais surgiria necessariamente como discriminatória. Ora, como se disse, não foi essa a opção legislativa».

Sim, é verdade: o Tribunal Constitucional achou que o casamento civil é «uma instituição social… assente na função que lhe cabe na reprodução da sociedade».

Ou seja, o Tribunal Constitucional achou que o casamento civil NÃO constitui «uma relação puramente privada entre duas pessoas adultas, sem qualquer projecção na reprodução da sociedade».

Sim, é verdade: o Tribunal Constitucional achou que o casamento civil celebrado entre pessoas estéreis ou que optem por não ter filhos, ou se tiver sido celebrado “in articulo mortis”, pode muito bem vir a ser declarado… inconstitucional!

Enfim, é o Tribunal Constitucional que temos…


Entretanto, aqui ficam as duas declarações de voto dos juízes que votaram vencidos.
O seu profundo significado é absolutamente inegável.


DECLARAÇÃO DE VOTO

«Embora não sem hesitações, votei vencido quanto à decisão. Na verdade, conquanto reconheça que “a reforma da ordem jurídica cabe a órgãos de representação estrita da vontade popular, investidos no poder de fazer opções de natureza político-legislativa”, não se me afigura suficiente uma mera afirmação pretoriana de que não é permitido «retirar da Constituição um reconhecimento directo e obrigatório dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo” para afastar os argumentos que, em claro sentido contrário, resultam, a meu ver necessariamente - e independentemente de qualquer outra reforma da ordem jurídica -, do teor do artigo 36º, n.º 1, conjugado com a nova redacção do artigo 13º, n.º 2, ambos da Constituição da República Portuguesa. Assim, considerando imprestáveis para esta discussão os argumentos tradicionais respeitantes “à procriação e educação da prole”, que nem no Código Civil de 1966 tiveram acolhimento, bem como outros habitualmente invocados - e refutados, em termos que se me afiguram definitivos, em alguns dos pareceres juntos aos autos -, e não encontrando qualquer outra justificação para a solução que fez vencimento, que não a pretoriana afirmação já referida, votei no sentido da inconstitucionalidade da norma objecto do recurso».

- Gil Galvão

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DECLARAÇÃO DE VOTO

«Votei vencida por entender que o artigo 1577º do Código Civil (CC), na parte em que determina que casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente, é inconstitucional, por violação dos artigos 13º, nº 2, e 36º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

Embora acompanhe o entendimento de que saber se a norma impugnada viola o princípio da igualdade é uma questão cuja resposta se encontra na concepção do casamento adoptada, tenho para mim que o casamento não é “uma instituição social que é apresentada aos cônjuges com um significado relativamente estável, enquanto união entre homem e mulher, designadamente assente na função que lhe cabe na reprodução da sociedade”, constituindo “um meio específico de envolver uma geração na criação da que se lhe segue e o único desses meios que assegura a uma criança o direito de conhecer e ser educada pelos seus pais biológicos”. Uma tal concepção não decorre da CRP, apontando até em sentido contrário a consagração constitucional do direito de constituir família, enquanto direito distinto do direito de contrair casamento (artigo 36º, nº 1); o princípio constitucional da não discriminação dos filhos nascidos fora do casamento (artigo 36º, nº 1, primeira parte); a protecção constitucional da família (artigo 67º); e a protecção constitucional da paternidade e da maternidade (artigo 68º).

E tão-pouco decorre da lei. A lei configura o casamento como contrato celebrado entre duas pessoas que pretendam constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições do CC, à qual associa as notas da vinculação recíproca aos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência (artigo 1672º do CC), da comunhão de vida exclusiva (artigo 1601º, alínea c), do CC) e da perpetuidade tendencial (artigo 1773º do CC). Notas essenciais do contrato de casamento, cuja conformidade constitucional não é questionável, que não permitem o estabelecimento de uma qualquer ligação à orientação sexual de quem o celebra.

A referência que é feita ao casamento no artigo 36º da CRP supõe, obviamente, uma determinada configuração do mesmo por referência à lei civil, havendo até remissão expressa para a lei em matéria de requisitos e de efeitos do casamento. Mas tal só pode significar uma configuração legal constitucionalmente conforme, nomeadamente quanto à concepção de casamento e à regulação, em concreto, dos requisitos do contrato. É por isso dispensável que a norma constitucional afirme explicitamente que a celebração do casamento por pessoas do mesmo sexo é permitida.

De acordo com o artigo 36º, nº 1, segunda parte, da CRP, todos têm o direito de contrair casamento em condições de plena igualdade. Isto é, todos têm o direito de, sem qualquer diferenciação, aceder ao que significa do ponto de vista jurídico (e simbólico) a celebração de um contrato entre duas pessoas que pretendam constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições do CC.

O artigo 1577º do CC na parte em que determina que casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente, priva o titular do direito previsto no artigo 36º, nº 1, segunda parte, da CRP em razão da sua orientação homossexual, o que é constitucionalmente ilegítimo (artigo 13º, nº 2).

Na falta de fundamento material suficiente para a diferenciação, é esta a conclusão que se me impõe»
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- Maria João Antunes




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