quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

 

O Acórdão da Relação



O Tribunal da Relação de Lisboa acabou de proferir o acórdão do recurso interposto pela Teresa e pela Lena do despacho do Conservador do Registo Civil e da sentença do Tribunal Cível de Lisboa que indeferiram o seu processo de casamento.

Como (infelizmente) já se esperava, o Tribunal da Relação também indeferiu a pretensão da Teresa e da Lena.

Com fundamentos, afinal, muito simples:
- Na ordem jurídica portuguesa a norma do artigo 1.577º do Código Civil está conforme os princípios constitucionais;
- O casamento não é a única forma de constituir família.

Contudo, e paradoxalmente, estas conclusões não parecem estar de acordo com a fundamentação que o próprio acórdão invoca.
De facto (e citando até Jorge Miranda e Rui Medeiros), o acórdão é claro a considerar que:
«O casamento não é, pois, garantido como uma realidade abstracta, completamente manipulável pelo legislador e susceptível de livre conformação pela lei. Pelo contrário, como é próprio de uma garantia institucional, não faz sentido que a Constituição conceda o direito a contrair casamento e, ao mesmo tempo, permita à lei ordinária suprimir ou desfigurar o seu núcleo essencial».

Como se este paradoxo não bastasse, continua o acórdão do Tribunal da Relação:
«De igual forma, o Tribunal Constitucional, no seu acórdão nº 590/2004, de 6 de Outubro, veio sustentar que “quanto ao direito a casar, pode dizer-se que este comporta duas dimensões. Por um lado, consagra um direito fundamental, por outro, é uma verdadeira norma de garantia institucional”».

Depois, e a propósito do artigo 36º da Constituição – que estabelece que «todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade» – afirma o acórdão que esta disposição constitucional consagra dois direitos distintos (o direito de constituir família e o direito a contrair casamento) e considera (e bem) que estes direitos não se confundem.

Assim, e tendo em vista esta distinção, o Tribunal da Relação conclui que, uma vez que, vivendo em união de facto, nada impede as recorrentes de constituírem família (obviamente uma com a outra) só pelo facto de serem homossexuais, não se verifica qualquer violação à norma constitucional que lhes garante esse mesmo direito de constituir família.

Mas, e estranhamente, o Tribunal da Relação parece esquecer-se que é a mesmíssima norma constitucional que garante às recorrentes o direito a constituírem família que lhes garante também o direito... a contrair casamento em condições de plena igualdade...

Finalmente, o Tribunal da Relação fala no «Princípio da Igualdade» estabelecido no artigo 13º da Constituição, que impede qualquer tipo de discriminação entre os cidadãos, nomeadamente em razão da sua orientação sexual.
Só que o acórdão não resiste a entrar no pantanoso campo (tão típico de quem lhe repugna a consagração constitucional deste princípio e por isso tudo procura para não o aplicar), da consideração de que o princípio da igualdade não impede que o legislador faça distinções entre os cidadãos, desde que essas distinções tenham «fundamento material bastante».

Ora, e como é óbvio, e como não podia deixar de ser, o acórdão da Relação não explica qual é este «fundamento material bastante» que, pelos vistos, se sobrepõe às consagrações constitucionais da proibição da discriminação dos cidadãos em razão da sua orientação sexual e do direito a contraírem casamento e, assim, os impede de celebrar um mero contrato de natureza exclusivamente civil que tem como simples objecto não mais do que a liberdade de dois cidadãos de «constituírem uma família em plena comunhão de vida».

Como nem sequer explica quem numa qualquer sociedade está autorizado a definir quais são, afinal, os «fundamentos materiais» que são «bastantes» para se sobreporem aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos que merecem dignidade de consagração constitucional.

Como não podia deixar de ser, deste acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa foi já interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.




(Publicado simultaneamente no «Advogado do Diabo»)

 

De cabalas e da insustentável estupidez dos teocratas



«I hope I live to see the day when, as in the early days of our country, we won't have any public schools. The churches will have taken them over again and Christians will be running them. What a happy day that will be!» - Rev Jerry Falwell, America Can Be Saved.

Warren Chisum, o nº2 republicano do Texas à Câmara de Representantes e um cristão devoto, utilizou a logística do Congresso para distribuir o seguinte memo do representante da Geórgia Ben Bridges, que há anos tenta proibir o ensino da evolução no respectivo Estado.

O memo pretende que ensinar evolução nas escolas americanas é contra a «lei», sendo portanto mais que tempo de acabar com o «monopólio da evolução» nas salas de aulas, dando a ligação para um site que contém um formulário pedindo ser declarado inconstitucional o ensino da evolução nos Estados Unidos.

Para se perceber o que está por trás das pretensões imbecis dos teocratas americanos, recordo que em finais de 2005 os IDiotas cristãos sofreram uma pesada derrota quando o juíz John Jones, um republicano cristão praticante, decidiu que o ensino do desenho (pouco) inteligente é inconstitucional, já que viola a separação da Igreja e do Estado preconizada na Constituição americana.
Até o juíz reconheceu que a Idiotia é obviamente religião pura e dura, sem resquício de racionalidade ou ciência a contaminar os delírios obscurantistas que os devotos pretendem ser ciência.

Lá como cá, os fanáticos cristãos não se conformam com as pretensões ateias de «doutrinar» os jovens em ciência, que acreditam, como vaticina JC das Neves na homilia de ontem, conduzirão à destruição da nossa sociedade!
E calimerizam-se, como o devoto pastor Ray Mummert:
«Nós [os cristãos] estamos sob ataque do segmento inteligente e instruído da sociedade»!

E assim, para que sejam os burros e ignorantes a determinar o que deve ser ensinado às crianças, o memo alerta os devotos cristãos para as «evidências irrefutáveis» que indicam ter a «ciência da evolução uma agenda religiosa muito específica».

Mais concretamente, a nota indica que novas informações que podem ser confirmadas no dito site, para que referem os congressistas, informações que demonstram conclusivamente que há uma cabala judaica - envolvendo um monte de cientistas cabalistas como Copérnico, Einstein, Darwin, Carl Sagan, etc., - que pretende destruir o cristianismo atacando as suas bases, a verdade absoluta da Bíblia sobre a origem da Terra, do Universo e do homem!

Assim, os devotos cristãos que gerem o site – na boa tradição cristã, ferozes anti-semitas, pelo que Chisum foi obrigado a um pedido de desculpas público - garantem que como resultado dessa conspiração judaica poucos hoje em dia acreditam nos sábios ensinamentos cristãos de que a Terra é o centro imóvel do Universo e todos os restantes planetas, estrelas, e restantes corpos celestes giram em volta da Terra.

O site indicado pelos dois republicanos, que assim demonstram a sua assombrosa ignorância científica, é ainda mais hilariante, por ainda mais cretino, que a Conservapedia!

Parafraseando Einstein, de facto a estupidez não tem limites!


- Um artigo de Palmira F. da Silva

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

 

Momento zen de segunda



Segunda-feira é um dia em que, com um frémito de antecipação, saboreio o meu momento zen semanal com a coluna de opinião de João César das Neves no Diário de Notícias.
Por vezes o referido autor desilude-me e em vez de um momento zen tenho de contentar-me com uma pausa Kit Kat, devotada a temas sortidos não contaminados com as mais absurdas elucubrações de cariz religioso.

Mas hoje esperava-me um momento de puro nonsense, intitulado «Um Portugal livre e próspero», que só consigo perceber como um episódio de insanidade (temporária?) provocado pela derrota estrondosa da Igreja no referendo da despenalização da IVG.

JC das Neves efabula um cenário completamente obtuso e de desgraça para o Portugal laico do ano 2029, que apenas permite afirmar que o fazedor de opinião católica não terá futuro na ficção científica. Nem terá futuro como sibila já que vaticina um futuro absolutamente imbecil que afirma ser o que nos espera como consequência do avanço da ciência e do conhecimento científico cá no burgo.

Por uma razão qualquer obscura que um psiquiatra poderia eventualmente explicar, a modernidade e a ciência para JC das Neves são sempre associadas ao «deboche», a uma «soberania artificial sobre a natureza»...

Nunca conseguirei perceber o horror que a ciência inspira nas almas mais beatas que suspiram pelos bons velhos tempos do obscurantismo medieval.
Ou pelos bons velhos tempos do Portugal de antigamente, orgulhosamente só mas alheio a modernices pecaminosas, com a Igreja firmemente nas rédeas do poder ...

- Um artigo de Palmira F. da Silva

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

 

O Trilema de Alberto João Jardim



Segundo o «Expresso», a nova Lei das Finanças Regionais implicará um corte de 34 milhões de euros, que representam apenas cerca de dois por cento do orçamento regional da Madeira deste ano.

Mas talvez Alberto João Jardim tenha tomado uma decisão correcta ao demitir-se.
Porque dois por cento são dois por cento, e há aqui várias questões políticas de princípio.

Para já, e em primeiro lugar, Alberto João demonstrou já à saciedade que conseguiu transformar a Madeira numa região autónoma de sucesso. O interior da região ainda não está lá muito desenvolvido, mas lá chegaremos.
Ou seja: se Alberto João já demonstrou com inegável sucesso que com dinheiro consegue governar, está obviamente dispensado de demonstrar se o consegue ou não fazer sem dinheiro ou com restrições orçamentais.

Depois, não está escrito em lado nenhum que os madeirenses tenham de partilhar os sacrifícios económicos e orçamentais do “Contenente”.
Até porque é para isso que servem as acusações de colonialismo e as sucessivas ameaças de independência.

Mas o maior problema de Alberto João Jardim é outro muito diferente, e terá sido esse que o terá levado a esta brilhante decisão, só ao alcance de um número muito restrito de génios da política, que foi demitir-se para depois se candidatar novamente (embora bem saiba que os resultados eleitorais estão garantidos), borrifando-se para os que lhe chamam burgesso ou palhaço, ou o acusam de falta de sentido de Estado.
Ou até mesmo para aqueles que, obviamente desprovidos do inato sentido político do génio insular, dizem que as eleições vão custar mais dinheiro que os cortes orçamentais.

O seu maior problema é que neste mesmo Orçamento Regional que viu reduzido em 34 milhões de euros, Alberto João Jardim tem inscritas verbas importantíssimas e de um indiscutível significado político, social e estratégico para a Região Autónoma da Madeira.
E, como ele tem dito, não se podem mudar as regras a meio do jogo!
E os interesses da Madeira têm, claro está, de ser defendidos!

Por exemplo:
- Para as comemorações de Natal e fim-de-ano e «campanha de imagem»: 17 milhões de euros;
- Para a Igreja: 45 milhões de euros;
- Para os clubes de futebol: 78 milhões de euros.

É aqui que reside o maior problema do presidente do Governo Regional da Madeira.
Um autêntico trilema:
Com menos 34 milhões de euros, onde vai Alberto João cortar?
Na campanha de imagem?
Nos subsídios à Igreja?
Nos clubes de futebol?

Ah!
Como é difícil ser governante regional em Portugal!!!


domingo, 25 de fevereiro de 2007

 

Violência em nome de Deus



«Terror in the mind of God: The global rise of religious violence

Como escrevi diversas vezes no Diário Ateísta, considero que o fundamentalismo religioso é um epifenómeno de crises económico-sociais.
Epifenómeno que tende a agudizar-se em países sem estruturas sociais sólidas, nomeadamente sem estruturas de segurança social e de assistência médica.

De facto, as religiões do Livro evangélicas, cristianismo e islamismo, apresentam em comum o facto de que o respectivo proselitismo é disfarçado de caridade, caridade prosélita que será tanto mais efectiva quanto menos social for o Estado no país em causa.
Por isso, para ambas as religiões aumenta o número de crentes e o número de fanáticos no Terceiro Mundo e na América de Bush - empenhado em destruir a segurança social não ligada à fé - e diminui drasticamente o número de crentes na Europa, especialmente no norte da Europa.

Não é por isso de espantar que a primeira encíclica de Bento XVI advogasse exactamente o fim do estado social de forma a angariar mais clientes para o catolicismo numa Europa cada vez menos religiosa – e concomitantemente aumentar o número e a aceitação social de fanáticos católicos. Isto é, o ex-inquisidor mor advoga uma nova «ordem» social em que a Igreja, financiada com dinheiro estatal, se substituíria ao Estado na segurança social e espalharia a fé, a discriminação e a violência com o dinheiro de todos.

De facto, apenas a laicidade inerente ao nosso modelo democrático impede que o fanatismo/fundamentalismo cristão se exprima da mesma forma que o equivalente islâmico.
Sem as rédeas da laicidade (que os fanáticos carpem ser radical) ninguém tenha dúvidas que ambos seriam formalmente iguais!

Basta pensar nas pretensões dos fanáticos cristãos americanos, da imposição de um direito baseado na «lei» bíblica, que prevê penas de morte para adultério, «sodomia», apostasia, heresia, aborto e demais «pecados», para confirmarmos que não existe qualquer diferença entre ambos os fundamentalismos, as suas manifestações apenas são diferentes porque se inserem em países com modelos políticos diferentes e a laicidade reprime as demências e as orgias violentas de fé a que temos assistido por parte dos fundamentalistas islâmicos!

A razão pela qual o Islão se mostra resistente à modernidade, isto é, à tendência geral de secularização, só pode ser entendida à luz do pós-colonialismo e da emergência do nacionalismo árabe, uma reacção à aculturação colonianista. Em que a falência da política na resolução dos graves problemas sociais propiciou um modelo de sociedade assente numa utopia – na realidade um «entre» bhabhiano (de Homi Bhabha), isto é, uma tentativa de recuperação de uma cultura desaparecida há séculos e como tal construída no imaginário - baseada no Islão político. De que a Palestina e o Hamas são apenas um exemplo...

Que há uma relação inquívoca entre religião e violência pode ser apreciado no número de Março da revista «Psychological Science», uma das melhores revistas de psicologia a nível mundial.
Num artigo deveras interessante, disponibilizado online (documento em formato pdf), intitulado «When God Sanctions Killing: Effect of Scriptural Violence on Aggression» de que recomendo a leitura.
As conclusões do estudo indicam que após a leitura de textos identificados como biblícos, os crentes agem mais violentamente que os descrentes especialmente se a passagem indicar que Deus sanciona a violência. E os livros sagrados são repositórios de violência ordenada por Deus, especialmente em relação aos «infiéis», aos que não pertencem.

Assim, é natural que o recrudescimento anacrónico do fundamentalismo, a par de uma guerra à laicidade e à ciência, seja acompanhado de um aumento da violência em nome de Deus. Há sempre um texto «sagrado» que justifica a violência contra os «outros».

E esse recrudescimento é igualmente acompanhado de ululações de perseguição e vitimização, indispensáveis para angariar clientela e inflamar ainda mais os fundamentalistas. Um inimigo a demonizar é ingrediente indispensável ao combustível para a violência religiosa, pelo que é necessário inventar perseguições - pelos infiéis de outras fés ou pelos tais laicistas radicais - e glorificar os «mártires» que se «sacrificam» em nome de uma qualquer «causa».

Na Europa os fundamentalistas católicos agitam ambas as bandeiras, os dois inimigos: a ameaça islâmica e a «guerra» contra o catolicismo movida pelos laicistas «fundamentalistas», que não deixam a Igreja ditar como vivemos.
É necessário desmontar as urdiduras da Igreja de que se prevê a escalada cá no burgo depois da derrota estrondosa no referendo. A leitura dos jornais deste fim-de-semana já o indica...».

- Um artigo de Palmira F. da Silva

 

Serial Killer em nome de Deus



Um fanático islâmico assassinou a ministra da Segurança Social do Punjab, Zilla Huma Usman, quando esta se preparava para discursar – sem o tradicional véu islâmico– num encontro político em Gujranwala, a norte da capital da província, Lahore.

A ministra paquistanesa de 36 anos, uma defensora dos direitos da mulher que já tinha incorrido na fúria dos fundamentalistas islâmicos por ter organizado uma maratona em que as mulheres podiam participar, morreu a caminho do hospital depois de ter sido alvejada na cara por um alucinado fundamentalista.

O assassino, Mohammad Sarwar, que gritou: «Porque não tens a indumentária islâmica?» antes de a alvejar, foi imediatamente detido pela polícia..

O dito fanático religioso, um pai de 9 filhos educado numa madrassa de Gujranwala e que ensinava o Corão às crianças locais, tinha confessado o assassínio de quatro prostitutas - e tentativas a pelo menos mais outras seis -, em 2003. No entanto, foi absolvido em tribunal dos seus crimes, também porque os clérigos locais reuniram elevadas somas de dinheiro que deram aos pais das vítimas que, embaraçados com a vida imoral das filhas, retiraram as queixas.

Numa entrevista à televisão depois de preso, um Sarwar calmo e aparentemente convicto da sua libertação, declarou:
«Não tenho remorsos. Eu apenas obedeci ao mandamento de Allah», acrescentando que o Islão não permite posições de chefia às mulheres. «Voltarei a matar todas aquelas mulheres que não sigam o caminho correcto se for novamente libertado».

Raja Basharat, o ministro da Justiça do Punjab declarou que «Ele é contra o envolvimento de mulheres na política ou em assuntos de Estado».
Um comunicado da polícia, emitido após o interrogatório de Sarwar indica que «Ele considera ser contra os ensinamentos de Allah que uma mulher se torne ministro ou dirigente. Por isso cometeu esta acção».

O assassínio da ministra sucede numa altura em que Paquistão aumentou de uma forma assustadora a violência contra as mulheres, essencialmente devido à oposição dos mullahs à blasfema concessão de alguns direitos às mulheres pelo governo de Pervez Musharraf e à instigação à violência contra as «pecadoras» pelos devotos clérigos.

Direitos concedidos pela recente «Women Protection Bill», execrada como «secularização» inadmissível pelos fundamentalistas islâmicos, que permite a punição de homens em caso de violação - prática muito comum no Paquistão - e impede que apodreçam nas prisões ou sejam devidamente vergastadas pelo seu «crime» as mulheres que o denunciassem...

Lá como cá o menosprezo pela mulher assim como a exigência de que a lei puna as mulheres que não se conformem aos padrões (i)morais da respectiva religião é indissociável do fundamentalismo religioso.
Muda a forma mas o conteúdo é exactamente igual.


- Um artigo de Palmira F. da Silva

sábado, 24 de fevereiro de 2007

 

A pateta por Deus




Michele Bachmann, grande paladina de óvulos, espermatozóides e da IDiotia (aka neo-criacionismo), cruzada contra o evolucionismo e os demoníacos homossexuais declarou-se chamada por Deus – por quem é uma pateta - para concorrer ao Congresso dos Estados Unidos (pelo Partido Republicano, claro).

É algo preocupante que esta imbecil alucinada e homofóbica tenha sido eleito para a Câmara dos Representantes - pelo estado do Minnesota é certo - mas mais preocupantes são as declarações recentes da misógina congressista (misógina porque afirma deverem as mulheres submeterem-se cristã e completamente aos homens) acerca de um plano «secreto» do Irão que implicitamente apela a um ataque americano ao Irão!

De facto, certamente por inspiração divina porque se recusa a dizer quais as fontes de tão grandes certezas, Bachmann afirmou declarou ao St. Cloud Times ter informações seguras de que o Irão se prepara para dividir o Iraque:

O Irão é o culpado dos problemas (…) E sabem porquê? Porque já decidiram que vão particionar o Iraque.

E metade do Iraque, a parte ocidental e a norte do Iraque, vai ser chamada o Estado Islâmico do Iraque ou coisa no género. E desculpem, não tenho o nome oficial, mais vai ser um campo de treino para terroristas. Já há um acordo feito.

Eles vão ficar com metade do Iraque e essa parte vai ser um paraíso para os terroristas onde eles planearão mais ataques terroristas no Médio Oriente e depois virão atrás dos Estados Unidos porque nós somos os seus inimigos declarados.

As declarações imbecis da neófita representante (de Deus, como declarou na campanha que a elegeu) mereceram duras críticas por parte de analistas políticos, que na apreciação mais simpática consideraram «extremamente irresponsáveis» os delírios da beata.

Bachmann declarou ontem que as suas declarações tenham sido «mal compreendidas», mas diria que a emenda saiu pior que o soneto, já que não só não explica porquê as suas declarações foram mal entendidas, como insiste em que se for deixado à vontade, o Irão apoderar-se-á da província iraquiana de Anbar que se tornará num refúgio de terroristas.

É de facto preocupante que a única superpotência do mundo seja governada por um bando de lunáticos cristãos, que, como G. W. Bush explicou, iniciaram a guerra no Iraque por obediência a ordens divinas, expressas de viva voz, que incumbiram «à nação una sob Deus» a guerra ao «eixo do mal».

Ou, que consideram que os terroristas tentam destruir a América porque «somos uma nação cristã e o inimigo é um tipo chamado Satanás» e «o nosso inimigo espiritual só pode ser defendido se lutarmos contra ele em nome de Jesus» (general William "Jerry" Boykin, sub-secretário da Defesa dixit).

Especialmente preocupante porque estas visões apocalípticas são partilhados por outro lunático em nome de Deus, de seu nome Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irão!


- Um artigo de Palmira F. da Silva

 

Fogo-de-artíficio celestial







Faz hoje 20 anos que dois astrónomos, Ian Shelton e Oscar Duhalde, numa sessão nocturna no Observatório Las Campanas, no Chile detectaram a morte de uma estrela de grande massa, a supergigante azul Sanduleak -69° 202a, situada a mais de 160 000 anos luz (o tempo que demorou o fenómeno a ser vísivel na Terra), na Grande Nuvem de Magalhães.

A supernova resultante, denominada SN1987A, durante meses uma "nova" estrela nos céus do hemisfério sul, foi a primeira supernova em quase 400 anos a ser visível a olho nú. A última é conhecida como a supernova de Kepler e foi observada pela primeira vez na Terra em 1604, tendo sido estudada pelo astrónomo Johannes Kepler e seus contemporâneos sem o benefício de um telescópio.

A energia libertada pela mega explosão, que lançou as camadas exteriores da estrela a velocidades estonteantes (mais de 60 milhões de quilómetros por hora), foi transportada essencialmente por neutrinos. A equipa de Masatoshi Koshiba, o director do observatório de Kamioka, detectou 11 destes neutrinos que permitiram confirmar espectacularmente a física das supernovas. Pelo seu trabalho nas experiências de Kamioka e em particular pela detecção de neutrinos «astrofísicos», Koshiba foi galardoado com o prémio Nobel da Física em 2002.




O Hubble foi lançado só três anos depois, em 1990, mas a partir daí tem acompanhado a evolução da explosão. E descobriu um sistema de três anéis de gás incandescente em torno da SN1987A. A origem desses anéis não é clara, mas uma possibilidade seria a sobreposição de dois ventos estelares ionizados pela explosão da estrela. Ou mais provavelmente serão resultado da libertação de material constituinte da supergigante antes e durante a explosão.









Qualquer que seja a sua origem, estes anéis estão em expansão. Apesar da enorme velocidade da expansão, esta só é perceptível directamente em intervalos de alguns anos, mesmo com os instrumentos mais sensíveis, já que são necessárias mudanças de milhares de kilómetros nos raios destes anéis, para serem detectadas.










Em 1994, o Hubble começou a ver uma sequência de pontos iluminados ao longo do anel central, atríbuidas a impacto das ejecções da supernova com o gás constituinte do anel.



- Um artigo de Palmira F. da Silva

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

 

Violência Infantil



Como é já infelizmente tradição, o Santuário de Fátima está a promover um «concurso nacional para crianças».

Desta vez o tema do concurso é «As Aparições de Nossa Senhora do Rosário de Fátima» e é destinado às crianças do 1º ciclo das escolas privadas, mas também das escolas públicas de todo o país.

Será dada às crianças total liberdade de expressão mas... desde que essa liberdade esteja relacionada com as aparições de Nossa Senhora em Fátima e com os pastorinhos visionários, e se baseie nos textos de apoio que estão no site oficial do Santuário.

E assim, desde muito cedo é incutida às crianças – mesmo as que frequentam as escolas públicas – a gigantesca patranha de lucros multimilionários extorquidos fraudulentamente aos fiéis mais incautos, de que a mãe do próprio Deus gostava de se encavalitar em cima das árvores para transmitir banalidades aos Homens. E que às vezes até se enganava e tudo, coitada.

Gostava de saber se não haverá algures um limite para além do qual a propagação de delírios religiosos a crianças não deveria ser considerada um crime de pedofilia como qualquer outro.


 

Atirem-me água benta - II



A demissão anunciada de Romano Prodi, devido a uma derrota no Senado relacionada com questões de política externa, preencheu os telejornais de ontem.
Curiosamente a derrota no Senado ficou a dever-se à abstenção de duas formações comunistas da aliança de centro-esquerda que suportava o governo.
Curiosamente porque há menos de uma semana era anunciado em manchete no jornal Liberazione, órgão de imprensa da Refundação Comunista, que o Vaticano e os Estados Unidos «declararam guerra» ao Executivo de Romano Prodi com o intuito de derrubar o pouco cristão governo.

O governo Prodi caiu mas aparentemente a queda não se deve nem a Condolezza Rice nem à cruzada do Vaticano contra o governo de Prodi, em particular contra o projecto de lei que regulamentaria as uniões de facto, que deveria ter sido apresentado ao Parlamento ontem.

Resta ver não só se Romano Prodi segue como primeiro-ministro da Itália, já que a maioria parlamentar de centro-esquerda lhe manifestou total apoio, como se este projecto lei vai para a frente, já que a Igreja Católica anunciou que vai enfrentar esta guerra de poder com todas as armas à sua disposição. Nomeadamente exortando à desobediência civil disfarçada de objecção de consciência, uma arma muito esgrimida pela ICAR nos últimos tempos para afirmar como perrogativa católica o direito à intolerância de quem não segue os ditames do Vaticano.

Assim, o presidente da Conferência Episcopal Italiana (CEI), Camillo Ruini, que considera não ser «ingerência» na actividade legislativa do Estado a chantagem sobre este e outros temas, está a preparar um documento remiscente de outras eras, em que proibe os católicos de apoiar o mui tímido projecto.
Tímido porque apenas confere alguns benefícios sociais aos abominados homossexuais - e restantes pecadores que vivam em união de facto -, algo completamente inadmíssivel para a ICAR.

A ser reintroduzido, a excomunhão paira sobre os políticos católicos que votarem favoravelmente o execrado projecto que, segundo Bento XVI, resulta da pressão política de grupos de pressão que pretendem destruir a família.

Entre os odiosos e anti-cristão destruidores da civilização encontram-se a Organização Mundial de Saúde, as organizações ecológicas ( na realidade anti-católicos saudosos do paganismo, ex- inquisidor mor dixit) e as indústrias farmacêuticas que... fabricam preservativos e pílulas contraceptivas, essas obras demoníacas «que seduzem a humanidade para as mentiras do Maligno» e afastam a população italiana das garras do Vaticano.

- Um artigo de Palmira F. da Silva

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

 

Atirem-me água benta



«"Nunca quis dizer que os conservadores são na generalidade estúpidos. Quis sim dizer que as pessoas estúpidas são na generalidade conservadoras."
Carta de John Stuart Mill ao parlamentar conservador Sir John Pakington, Março de 1866

Ao ler o último post do meu blog de ciência favorito, o Pharyngula, recordei não só esta citação de Stuart Mill como um artigo publicado na revista científica Psychological Bulletin que li em tempos, «Political Conservatism as Motivated Social Cognition». Nesse artigo, que examinou mais de 50 anos de pensamento conservador - incluindo artigos, livros e conferências envolvendo 22 818 conservadores de 12 países - os autores explicavam que o conservadorismo é uma doença psicológica.

Patologia que os autores sugerem ser explicável por uma série de neuroses ligadas ao medo, à agressão, ao dogmatismo, a imperativo cognitivo fechado** e à intolerância de ambiguidades.
Quem quiser pode ler aqui o artigo completo, que explica como esta perturbação do foro psicológico aflige figuras como Hitler, Mussolini, o apresentador de rádio de direita Rush Limbaugh e o Presidente George W. Bush.

Quer a citação de Stuart Mill quer as revelações dos dois cientistas de Berkeley são completamente corroboradas pela última dos conservadores americanos, normalmente associados à direita religiosa ou religious right.

Indignados com a Wikipedia, que acusam de ser tendenciosa, anti-americana e anti-cristã, os teocratas americanos criaram a Conservapedia, mui conservadora, cristã ... e estúpida, mas de leitura recomendável no género comédia, em que merece nota máxima.

A Conservapedia «tem mais de 3 200 entradas» supostamente educacionais, «em temas históricos, científicos, de Direito e económicos». Até agora só explorei alguns temas de História e temas científicos. Em relação aos primeiros são... er.. pouco elucidativos. Creio que o meu sobrinho-neto de seis anos faria algo melhor para, por exemplo, a entrada sobre a Igreja Católica Apostólica Romana, vulgo ICAR, a entrada sobre a Inquisição ou mesmo a entrada sobre a Idade do Ferro...

Os artigos designados como científicos não o são de facto, são apenas muito mauzinhos e igualmente lacónicos, excepto no prato forte desta enciclopédia conservadora cristã (oops, outro pleonasmo...) o combate ao anti-cristão evolucionismo, que introduzem a despropósito em temas como entropia ( conceito de facto muito pobremente entendido).

Achei deveras divertido ler em inúmeras entradas de uma enciclopédia que supostamente trata didacticamente assuntos científicos, mesmo que virtual e cristãmente, a pérola «ciência secular», em que o «secular» ou talvez mesmo «ciência» são debitados como pejorativos.

Mas ainda não parei de rir com as justificações da necessidade desta atrasadice mental: o ululado bias da Wikipedia que não dá crédito nem tempo de antena suficiente ao seu mito, ao ponto de em algumas entradas em vez de BC e AC ( antes de depois de Cristo) insultam os cristãos com BCE e CE (antes da era comum e era comum) e, especialmente, não permite obscurantismos criacionistas ou IDiotas (acrónimo de Intelligent Design).

De facto, não se percebe como «apesar de a maioria dos americanos (e provavelmente a maioria do mundo) rejeitar a teoria da evolução, os editores da Wikipedia são quase 100% pró-evolução».

Na realidade, no mundo civilizado a evolução só não é aceite maioritariamente pelo homem da rua na Turquia e nos Estados Unidos. Pela amostra que li, não existirá algum perigo do homem da rua cristã americana não aceitar ou não perceber o que passa por ciência na Conservapedia. O nível científico da Conservapedia está muito abaixo do conhecimento do homem da rua...em qualquer canto do mundo!

*O título do post é uma homenagem (singela, pronto) ao Pedro Marques Lopes, um exemplo de que ser de direita não implica ser conservador ... muito menos estúpido!
**«imperativo cognitivo» é o termo cunhado por Eugene D'Aquili para representar o desejo de ordem e sentido biologicamente condicionado que está na origem dos mitos religiosos.

- Um artigo de Palmira F. da Silva

 

Os Escuteiros



Baden-Powell
(22 de Fevereiro de 1857 – 8 de Janeiro de 1941)




Robert Stephenson Smyth Baden-Powell foi o fundador do movimento Escuteiro.
Por isso, o dia do seu nascimento é considerado «O Dia do Escutismo».

O Escutismo é um movimento de juventude destinado à «educação integral» dos jovens de ambos os sexos e baseado no voluntariado.
Em Portugal, a principal organização de escuteiros é representada pelo «Corpo Nacional de Escutas» (C.N.E.), que se assume como um movimento da Igreja Católica e que protagoniza o desenvolvimento dos jovens e a sua realização nas comunidades onde se inserem e a sua defesa da natureza e do meio ambiente.

Mas os objectivos que Baden-Powell tinha em mente quando criou o Escutismo ficam por aqui.
Porque, estranhamente, e apesar da proclamação de tão belos princípios, o Corpo Nacional de Escutas é uma organização de juventude que selecciona os jovens que queiram alistar-se nas suas fileiras quer pela sua orientação sexual, quer pelas suas crenças religiosas, não permitindo a entrada de crianças que não sejam católicas.

A esta crítica, os garbosos escuteiros respondem que existe «outra organização» similar, aberta às demais crenças religiosas, onde as crianças não-católicas se podem perfeitamente inscrever.
Até hoje, ainda não consegui que nenhum escuteiro percebesse que isso ainda é pior do que se houvesse somente uma única organização...

A fórmula da «promessa de escuteiro» é perfeitamente elucidativa quanto ao que é verdadeiramente importante para um escuteiro e quais as suas prioridades: cumprir os seus deveres para com Deus e com a Igreja.
O que, temos de convir, não abona nada em favor dos pais que inscrevem os seus filhos nos escuteiros, a quem desde pequeninos enfiam na cabeça que «a honra vale mais que a própria vida».
Quem sabe para prepararem uma reserva estratégica católica de honrados e fanáticos «bombistas suicidas».

A fórmula reza assim:
«Prometo pela minha honra e com a graça de Deus fazer todos os possíveis por: cumprir os meus deveres para com Deus; Igreja e Pátria, auxiliar o meu semelhante em todas as circunstâncias e obedecer à Lei do Escuta».

Provavelmente por causa da sua estreita ligação com a Igreja Católica, o movimento escuteiro é conhecido, para além dos preconceitos e discriminação que faz entre as crianças, também pela sua feroz homofobia.
De facto, nos últimos tempos têm sido conhecidos em todo o mundo inúmeros casos de crianças que, independentemente da sua idade, são sumariamente expulsas dos seus grupos de escuteiros apenas por se terem tornado suspeitas de serem homossexuais.

Os profundos traumas causados a essas crianças decerto constituirão também um objectivo primordial do movimento escuteiro.

Mas também os seus dirigentes são discriminados, pois geralmente não é permitida a permanência de pessoas que vivam em união de facto ou que se tenham divorciado.

Quando são acusados de discriminação (que é já tão conatural ao escutismo que por vezes até já se verifica mesmo entre os seus diversos movimentos e associações) os escuteiros invariavelmente respondem deste modo, que é sem dúvida esclarecedor:
«Desde quando é errado discriminar? Será que nos tornamos tão estúpidos que não vemos que a discriminação é praticada rotineiramente em todos os aspectos da vida? A Bíblia ensina que os cristãos discriminem em diversas áreas».

Os Escuteiros são ainda conhecidos por mandarem vestir fardas a crianças.
Decerto como corolário dos seus princípios de obediência incondicional, de subordinação e de abjecta submissão do indivíduo ao grupo e à comunidade onde se insere, e sempre em «comunhão eclesial».
Foi por estas e por outras que ficou célebre a definição do cómico brasileiro, Juca Chaves:
«Os escuteiros são um grupo de meninos vestidos de imbecil, comandados por um imbecil vestido de menino».


quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

 

O Império contra-ataca!



Noticia a «Rádio Vaticano» que a Opus Dei está a preparar uma super-produção cinematográfica, que custará dezenas de milhões de dólares, sobre a vida de Josemaria Escrivá de Balaguer.

O filme contará ao que consta com a participação de Robert De Niro e pretende ser «a resposta da Opus Dei ao Código da Vinci», filme que, segundo a «Rádio Vaticano», foi «asperamente criticado pelos católicos de todo o mundo por ter apresentado de maneira discutível pontos fundamentais da fé cristã».
Mas sobretudo, continua a notícia, «por ter pintado a Opus Dei como uma espécie de organização criminosa, governada por uma "cúpula" de delinquentes».

Vai ser bonito, vai!
Vai ser um filme a não perder!!!

Vai ser bonito ver o Robert De Niro no filme a explicar às pessoas as piedosas virtudes dos lobbies multimilionários e da Mafia poderosíssima que é a Opus Dei, que persiste em influenciar todos os sectores da sociedade nos países que decide infectar.

Vai ser bonito ver um filme a exaltar as qualidades de Francisco Franco, do regime franquista e da recusa sistemática de Balaguer em criticar ou sequer fazer o mínimo reparo aos crimes praticados pelos falangistas durante a Guerra Civil de Espanha.

Vai ser bonito ver Josemaria Escrivá de Balaguer a deixar a sua própria canonização preparada para depois da sua morte e ver como apareceu uma freira que, graças à sua ajuda, se curou de um tumor adiposo e proporcionou o milagre que faltava à sua subida ao Olimpo, ou lá o que é aquilo.

Mas mais bonito ainda vai ser ver o Robert De Niro, coitado, a apertar um cilício numa perna até se contorcer de dor, e a autoflagelar-se violentamente durante horas a fio até deixar o sangue a escorrer pelas paredes e a dizer com aquele ar de piedosa mortificação de que Deus tanto gosta:
- «Abençoada dor; amada dor; santificada seja a dor; glorificada seja a dor!».

Vai ser bonito, vai!


 

Momento Zen de segunda-feira



«J. C. das Neves brindou-nos na passada segunda-feira com mais uma crónica inenarrável.
Num momento raro de puro delírio tomista, o inefável cavaleiro da Pérola Redonda assume finalmente a «enorme derrota para a Igreja» do dia 11 de Fevereiro, depois de na semana passada se ter recusado a comentar o que classificou como «boa discussão de taberna».

JC das Neves demorou a reconhecer que, como referia Vital Moreira num artigo indispensável no El Pais, «desde a implantação da República que a Igreja Católica não sofria uma derrota política tão profunda e desta vez directamente às mãos do voto popular. Decididamente, ela deixou de comandar a consciência moral dos portugueses e as opções políticas do Estado».
Tal como aconteceu aos bispos nacionais que emudeceram de choque pela estrondosa vitória do SIM, conseguida apesar dos apelos ao NÃO dos assalariados da Igreja, das ameaças de excomunhão, das Virgens lacrimejantes, dos terços, procissões, vigílias, missas, panfletos terroristas distribuídos em infantários e escolas, inúmeros artigos em jornais diocesanos, paroquiais e nos jornais regionais que controlam.

De facto, embora o opinador de segunda afirme ser «algo exagerado identificar o ‘não’ com a Igreja católica» - «mas não muito» - confirma ter sido «a única grande entidade que se empenhou a fundo na luta desse lado e perdeu largamente». E uma ronda rápida pelos blogs católicos mais conservadores confirma terem sido os motores do NÃO essencialmente grupos ligados ao Opus Dei e Comunhão e Libertação - os tais grupos «iluminados pelos ensinamentos de D. Luigi Giussani ou S. JoseMaria Escrivá » referidos por um dos comentadores do Fiat Lux.
Algo a que os debates para que fui convidada como representante do SIM ou assisti (nomeadamente os dois Prós&Contras) durante a campanha me permitiu confirmar em primeira mão.

Os cruzados pela talibanização de Portugal estavam tão confiantes na vitória do NÃO - como demonstrado no frente a frente de JC das Neves com Daniel Oliveira na TSF, em que o spin doctor católico debitou pérolas como «Esta atitude laxista relativamente ao aborto vai dar uma volta. Nós daqui a uns tempos vamos discutir de novo a lei de 84», isto é, em caso de vitória do NÃO pretendiam uma regressão civilizacional para uma situação semelhante à do Chile, Malta, El Salvador ou Nicarágua. Pilares da moral e bons costumes católicos em que o aborto é proíbido, mesmo para salvar a vida de uma mulher, e até no caso de uma gravidez ectópica em que o embrião não tem qualquer hipótese de sobrevivência!

A confrontação dos totalitários católicos com a realidade inesperada de um Portugal mais laico, resultou em prosas que ultrapassam todos os limites do decoro. A análise do referendo debitada pela CEP é especialmente vergonhosa.
Para além de ameaçar os muitos católicos que votaram SIM convidando-os implicitamente a sair se não aceitarem «as exigências de fidelidade à Igreja a que pertencem e às verdades fundamentais da sua doutrina», isto é, se se atreverem a pensar pelas respectivas cabeças, os obscurantistas da ICAR atribuem a «lacunas na formação da inteligência». Isto é, na linha de Bento XVI que afirmou ser irracional a ciência, os nossos irritados bispos chamam burros inconscientes e desprovidos de «valores éticos fundamentais» todos os que votaram SIM.
Como se a Igreja das Cruzadas e da Inquisição fosse detentora da «moral absoluta» e não pudesse existir moralidade fora dos seus ditames!

Mas o cúmulo do ressabiamento é encontrado na prosa do paladino da moral e bons costumes, cruzado contra telemóveis e pastéis de nata, que inspirou este post. JC das Neves verbera que «quando a Igreja perde, quase ninguém ganha» esquecendo que, para bem da sociedade, desde meados do século XIX que a Igreja perde todas as batalhas políticas.

De facto, desde o reinado de Pio IX que a Igreja reage à perda de poder político como Antero de Quental indicou: «fortificar a ortodoxia, concentrando todas as forças, disciplinando e centralizando; empedernir a Igreja, para a tornar inabalável». E desde o reinado de Pio IX que os valores em que assentam a nossa civilização ocidental têm vindo a ser lenta mas firmemente construídos contra a empedernida Igreja de Roma.

A Igreja combateu ferozmente tudo o que ameaçasse o poder absoluto papal – ver, por exemplo, a encíclica Quanta cura (1864) e seu famoso apêndice, o Sílabo de Erros -, da impossibilidade de a Igreja impor à força a sua doutrina (erro 24º), até à liberdade de expressão, que corrompe as almas, passando pela tolerância religiosa, a democracia, a laicidade, a liberdade de consciência e de imprensa, até à possibilidade de um governo legislar sem os auspícios de Roma, tudo que fosse ou parecesse moderno merecia o anátema da Igreja de Roma, que bramia estar sob ataque de forças demoníacas empenhadas em desacreditar ou destruir os dogmas da fé!
Em termos tão ou mais veementes que os usados pelos totalitários católicos actuais.

No entanto, poucos serão os que no século XXI não reconhecem a virtude dos direitos humanos e da democracia – declarada já no século XX na bula Immortale Dei como incompatível com o catolicismo -, que mereceram da Igreja um combate tão feroz como o aborto ou o reconhecimento de direitos a homossexuais hoje em dia!

Mas a pérola mais redonda da diatribe de JC das Neves é a efabulação das consequências da despenalização do aborto.
Especialmente sensibilizante para um libertária de esquerda é a preocupação demonstrada pelo conservador católico de direita (um pleonasmo, eu sei, mas hoje sinto-me dada a figuras de estilo) com a sobrevivência da esquerda, já que de acordo com o fazedor de opinião católica, o aborto «assolará sobretudo as classes mais pobres» e como tal «minará a base eleitoral dos partidos de Esquerda».
Pessoalmente dispenso as preocupações do cavaleiro da pérola redonda com o futuro da minha área política mas de qualquer forma não deixo de notar que um aumento exponencial com a pobreza só se regista para a religião.

Aliás, imediatamente antes do seu final apoteótico (ou apopléctico) em que J. C. das Neves promete que a «luta continua» - nomeadamente aludindo a um possível veto jurídico do diploma, na hipótese de o Opus Dei conseguir manobrar as nomeações do TC - , este tem um lapso de lucidez e carpe as suas preocupações: haverá «menos crianças a correr nos bairros de lata», «menos crianças abandonadas, menos deficientes, menos criminosos».
Fico na dúvida se é esta previsão e as suas consequências para a propagação da fé que tanto o angustiam. Porque todos os dados internacionais indicam que a legalização da IVG diminuiu progressivamente o número de «cadáveres pequeninos», a forma artística de referir um embrião, para além de tornar realidades do passado os cadáveres de mulheres vítimas do aborto clandestino que ele persiste em defender!».

- Um artigo de Palmira F. da Silva

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

 

Liberdade de religião é uma coisa; liberdade «da religião» é outra!



Gostava de um dia perceber se entre os delírios religiosos e a imbecilidade há uma conexão necessária e natural, ou se isso é apenas uma simples e mera coincidência...

(Clicar na imagem para a ampliar)

 

II - Falhas de Ética e Défice de Inteligência



«A insistência dos fundamentalistas do NÃO em apresentarem as portuguesas como seres acéfalos desprovidos da capacidade de decisão autónoma e responsável, com os poucos neurónios funcionais ocupados com questões fúteis, é para mim completamente mistificante.
Assim como é mistificante, especialmente se olharmos para o mapa dos resultados do referendo, que a CEP (Conferência Episcopal Portuguesa) atribua a vitória do SIM a «lacunas na formação da inteligência»!

Na realidade, os únicos indicadores que tornam Portugal um exemplo para todo o Mundo civilizado são exactamente os referentes às portuguesas: por exemplo, são mulheres a esmagadora maioria dos licenciados nacionais – mais de dois terços, 67,1%, em 2002, ano em que segundo o Observatório da Ciência e do Ensino Superior (OCES) metade dos doutorados nacionais eram mulheres.
A percentagem de portuguesas que trabalham em áreas como ciência, tecnologia e engenharia é muito superior, mais do dobro, à média europeia. De acordo com o INE em 2003 eram mulheres 60,2% dos especialistas das profissões intelectuais e cientificas, e a taxa de abandono escolar no secundário aproxima-se do valor médio europeu (embora globalmente seja mais do dobro) se nos restringirmos ao universo feminino.

Contudo, a predominância do sexo feminino no número de licenciados e doutorados não acompanha a sua representatividade nos cargos de topo, nem a sua maior escolaridade se traduz numa remuneração maior, bem pelo contrário.
Nestes indicadores, tal como em relação à violência sobre as mulheres, Portugal está na cauda do mundo civilizado!

Mas as diferenças que tornam a situação das portuguesas impar em toda a Europa, não ficam por aqui. As portuguesas não deixam de trabalhar quando têm filhos; têm taxas de emprego elevadas qualquer que seja a sua escolaridade e qualquer que seja o número e a idade dos filhos; não trabalham em percentagem significativa a tempo parcial qualquer que seja o número de filhos; trabalham significativamente mais tempo por dia do que os homens (cerca de mais 2h), sendo a assimetria a mais elevada da União Europeia.

Até 11 de Fevereiro último a situação das portuguesas era igualmente insólita por ser um dos últimos redutos no mundo civilizado em que o fundamentalismo religioso ditava a lei no que respeita ao aborto.
Apenas na Irlanda, Polónia, Malta e Chipre as mulheres são relegadas para um sub-mundo clandestino ou obrigadas a deslocarem-se para fora do país para realizarem em segurança o que a (pseudo) moral de alguns proíbia a todas!

Hoje, uma semana depois do primeiro grande passo para reconhecer a mulher como um ser humano de plenos direitos, nomeadamente pela primeira vez com direito à liberdade de consciência, não podemos cruzar os braços às investidas católicas contra esta vitória civilizacional.
Nós, as mulheres portuguesas, que merecemos encómios de todo o mundo civilizado pelo nosso esforço, dedicação e trabalho, merecemos pelo menos da sociedade nacional que não permita aos obscurantistas que nos vendem como coitadinhas ou rameiras reverterem o reconhecimento que ganhámos nas urnas!».

- Um artigo de Palmira F. da Silva

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

 

Falhas de ética



«Pensariam os mais ingénuos que estava encerrada a novela aborto com o resultado do referendo do passado dia 11 de Fevereiro, que não deixou margens para dúvidas sobre a posição da sociedade nacional em relação a este tema pseudo-fracturante.

Na realidade, o tema só é fracturante para aqueles que insistem em remeter Portugal para um passado marialva em que imperavam os três efes, Fátima, futebol e fado.
Para esses de facto o tema é fracturante, não de per se mas porque é um símbolo da fractura do paradigma mariano de menorização da mulher, paradigma que não reconhece direitos ao sexo «fraco» apenas deveres. Para esses misóginos, conceder liberdade de consciência às fúteis e ocas mulheres é uma «loucura e erro» que tentam evitar por todos os meios que se efective.

Assim, uma das primeiras «obras» do Opus Dei e paladino pró-penalização Bagão Félix na pasta do Trabalho e Segurança Social foi alterar o nº1 do artº 10 da Lei 4/84, a lei de protecção da maternidade e paternidade que vigorou até 1 de Dezembro de 2003. Desde então, pela mão do piedoso católico, uma mulher que sofra mazelas em virtude de um aborto clandestino e seja hospitalizada 5 dias é despedida com justa causa, portanto sem direito a qualquer indemnização!
O artº 50 do Código do Trabalho, sobre o «Regime das licenças, faltas e dispensas» diz explicitamente que «fica excluído o chamado aborto clandestino, cujas faltas por ele causado determinam a perda de direitos para as mulheres trabalhadoras».
O mesmo paladino da moral e bons costumes que reduziu o valor da licença de maternidade e eliminou a universalidade do abono de família...

É assim vísivel para todos o menosprezo pela mulher evidenciado pelos pró-penalização, que ulularam durante a campanha não querer ver mulheres na prisão pela prática de aborto mas carpiam serem as mulheres umas inconscientes acéfalas que abortariam por dá cá aquela palha se o aborto fosse despenalizado.
Asseverando ser a criminalização do aborto – que apenas o remeteria para a clandestinidade de vãos de escada e hemorragias de Citotec, todos os organismos internacionais confirmam que a criminalização do aborto não é impedimento para que este seja efectuado – a única forma de proteger de si próprias estas criaturas fracas das ideias, amorais e sem vontade própria.

Com o SIM vencedor por larga margem, os fundamentalistas do NÃO preparam-se agora para tentar boicotar o referendo impondo na secretaria o que não conseguiram nas urnas. Isto é, pretendem pôr tantos obstáculos à realização da IVG que na prática fique tudo como antes! Para isso, aqueles que antes vociferavam não querer ver o dinheiro dos seus impostos a financiar abortos, exigem agora que a futura lei remeta a IVG em exclusivo para o SNS, pretendendo que seja proibida em clínicas privadas. Serviço Nacional de Saúde onde «exigem» que a opção da mulher seja obrigatoriamente sancionada por uma comissão de aconselhamento!

Na prática pretendem tornar futura legislação sobre a IVG a «lei inútil» que a Igreja Católica e suas sucursais leigas exigem.
A Federação Portuguesa pela Vida, uma sucursal da Igreja de Roma, apressou-se assim a exigir «aconselhamento e acompanhamento» obrigatório às mulheres que pretendam abortar. Engonhando ad eternum, isto é, impedindo, a concretização da opção da mulher tal como aconteceu nos últimos 20 anos a muitas mulheres nas condições previstas no artigo 142º do Código Penal, de que é apenas um exemplo Maria Luísa Morgado Castela, a paraplégica de 41 anos que teve de ir interromper a Badajoz uma gravidez de alto risco detectada às 4 semanas!

O primeiro ministro já deu provas no Expresso desta semana que não embarca na conversa da treta de fundamentalistas sortidos e prometeu legislação consentânea com o resultado eleitoral dentro de um mês.
Mas o nosso PR já mandou recado à AR que estará vigilante em relação à legislação que despenalizará a IVG. Diz o nosso Presidente católico que a lei a ser criada deverá ser abrangente e consensual, não se percebendo como pretende seja consensual legislação sobre um tema que garante dividir profundamente a sociedade.
Aliás, não se percebe onde está a divisão profunda da sociedade se relembramos que apenas um milhão e meio de portugueses se dispuseram a declarar nas urnas contra a despenalização da IVG e cerca de dois milhões e setecentos mil portugueses votaram em outros candidatos a presidente.

Convém recordar ao nosso presidente «fracturante» que os portugueses estarão vigilantes em relação a golpes palacianos que contrariem o voto popular. E que não aceitaremos vetos presidenciais, político ou jurídico, à democracia.
O que quer que a dança das cadeiras no Tribunal Constitucional de Março próximo determine, seria desastroso para o credibilidade da democracia remeter ao TC uma alteração ao Código Penal aprovada em referendo, com uma pergunta aprovada duas vezes pelo próprio TC.».
(Continua)

- Um artigo de Palmira F. da Silva

 

Os Testículos



Habituado há mais de duas décadas a subsidiar os clubes de futebol da Região, a subvencionar jornais falidos para os convencer a publicar os seus iluminados artigos e a ajudar os seus companheiros de partido nos seus milionários negócios de autoclismos, o Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, está fulo da vida com a nova Lei das Finanças Regionais.

E então, decerto muito simbolicamente, Alberto João Jardim escolheu esta época do Carnaval para mais uma das suas brilhantes manobras políticas.
É assim que, em protesto contra a nova Lei das Finanças Regionais (e é só um protesto porque não a pode mudar), Alberto João Jardim ameaça agora demitir-se do seu cargo de Presidente do Governo Regional, para depois... se candidatar novamente.

E como se não bastasse, o Bokassa do Atlântico, em quem o povo madeirense pelos vistos se revê e de quem, sem qualquer dúvida, se deve orgulhar, acabou de produzir mais uma das suas pérolas, desta vez a propósito do referendo sobre a despenalização do aborto.
Deve ser a isto a que na Madeira chamam as célebres «pérolas do Atlântico»...

E então, decerto com o sabor amargo da derrota a corroer-lhe as entranhas, e fazendo uma vez mais jus à sua peculiar interpretação do que é o «sentido de Estado», o carnavalesco troglodita insular, convencido que descobriu a pólvora nas Selvagens, bolsou assim:
«Parece que em Portugal não há testículos para se dizer que o referendo acabou por ser um fracasso do regime político. O referendo não é vinculativo».

Acho muito bem que Alberto João Jardim tenha testículos para dizer as maiores imbecilidades e fazer as maiores barbaridades que lhe passam pela cabeça.
O que é lamentável é que pense com eles...


sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

 

Os Temas Fracturantes



Na segunda-feira a seguir ao referendo, não.
Mas logo na terça-feira seguinte os telefones começaram de novo a tocar.

Esgotado o tema do aborto, e passado à História o referendo e as intermináveis justificações para o «Sim» e para o «Não», de repente voltei de novo a ser entrevistado para televisões, jornais e revistas.
Todos preparam agora novas reportagens de fundo sobre, disseram-me, o novo «tema fracturante» da sociedade portuguesa que aí vem: o casamento homossexual!

Sim, o juiz da primeira instância bateu todos os recordes dos tribunais portugueses e indeferiu o primeiro recurso em cerca de três semanas.
Sim, o processo aguarda decisão do Tribunal da Relação há mais de onze meses.
Sim, nas sua alegações o iluminado Procurador do Ministério Público defendeu que o Estado deve providenciar que os portugueses só procriem dentro do casamento e que os homossexuais estão impedidos de constituir família.
Sim, se a Relação indeferir, recorro para o Supremo Tribunal de Justiça e daqui para o Tribunal Constitucional.

Sim, tenho mais esperança numa solução política e legislativa do que numa solução judicial.
Porque, obviamente, não acredito lá muito que uma correcta solução técnico-jurídica deste caso se sobreponha a preconceitos enraizados e a convicções pessoais conservadoras e retrógradas e até formatadas por empedernidas persuasões religiosas.

Sim, a Teresa e a Lena estão bem, têm agora emprego e vivem na margem Sul.

E, claro está, continuo convencido da inconstitucionalidade da lei civil que em função da orientação sexual de algumas pessoas as impede de celebrar um mero contrato de natureza exclusivamente civil.
Porque, obviamente, se o casamento é um simples contrato de natureza civil que é celebrado por uma pessoa que pretende «constituir família mediante uma plena comunhão de vida», então se essa pessoa é homossexual, deverá ser-lhe permitido celebrar esse contrato com uma pessoa do mesmo sexo.
Não é isso, aliás, que significa a palavra «homossexual»?

Leio agora no «Diário Digital» que a Juventude Socialista vai apresentar novamente o seu projecto de lei para que o casamento homossexual seja legalizado em Portugal.

Se as célebres deputadas independentes do P.S., Rosário Carneiro e Teresa Venda, não derem novamente umas palmatoadas a estes bravos rapazes e não os obrigarem a meter a viola no saco outra vez, este projecto de lei da J.S. vai juntar-se às iniciativas legislativas com o mesmo objectivo que também foram apresentadas pelo Bloco de Esquerda e pelos Verdes, e que até agora têm estado a aguardar numa gaveta do Parlamento o fim do processo do referendo sobre o aborto.
Agora, sim: agora é a vez do casamento homossexual!

Ao que parece a sociedade portuguesa só aguenta tratar de um «tema fracturante» de cada vez...


quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

 

A Obra do Demónio



Por incrível que pareça, e mesmo quase 200 anos após o nascimento de Charles Darwin, tem-se assistido ultimamente um pouco por todo o lado ao recrudescimento das mais IDiotas teorias criacionistas, a quem os pacóvios dos americanos (mas infelizmente não só) chamam «Inteligent Design».

De facto, os defensores do criacionismo acreditam literalmente na Bíblia, reclamando que, tal como é relatado no Génesis, Deus criou o mundo há seis mil anos e somente em seis dias.
E quando os factos não encaixam lá muito bem com isto, os criacionistas não hesitam: mudam os factos!
E é então que assistimos em pleno século XXI à defesa das mais fantásticas e espantosas teorias, como por exemplo que, depois de salvos do dilúvio pelo bom do Noé e pela sua arca, os dinossauros conviveram pacificamente com os homens há cerca de 4.000 anos, provavelmente passeando-se pachorrentamente entre as pirâmides do Egipto.
E, claro, contribuindo preciosamente, também eles, para a nossa «tradição judaico-cristã»...

Os restantes fósseis e registos históricos que não encaixam lá muito bem nisto? É simples: tudo não passa de falsificações engendradas pelos inimigos da fé.

E por mais cretino que tudo isso possa parecer, o que é facto é que o criacionismo é uma espécie de doença infecciosa que tem vindo a contaminar todo o planeta.

Nem de propósito, a «CNN» noticiou que o Museu Nacional do Quénia, em Nairóbi, se prepara para colocar em exposição pública um dos mais antigos e completos esqueletos de um hominídeo, conhecido como o «Turkana Boy».

Mas, ao que parece, a exibição pública de fósseis com vários milhões de anos, principalmente no Quénia, que é considerado por muitos cientistas como «o berço da humanidade», não tem sido lá muito conveniente para a defesa das teorias criacionistas.
Vai daí, o bispo Boniface Adoyo, líder das 35 igrejas evangélicas do Quénia, não tem feito outra coisa que não apelar ao seu rebanho que boicote a exposição, e reclama mesmo que a direcção do museu leve os fósseis para uma sala das traseiras pois estão a «matar a sua fé».

De tal forma que a direcção do museu teme mesmo que a preciosa colecção de fósseis seja atacada e destruída por um qualquer cristão fanático (passe o pleonasmo), e somente exibirá o fóssil do nosso velho ancestral depois de serem tomadas rigorosas medidas de segurança.

Muito podia ser dito sobre estes imbecis, que nem na sua própria fé irracional (passe o pleonasmo) aparentemente confiam.

Por isso, o melhor é deixar o comentário para esta brilhante passagem de uma «stand up comedy» de Lewis Black, como título «Fossils: The Devil's Handiwork».



segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

 

Os Derrotados do «NÃO»



Com cerca de 19% de vantagem, quase 60% dos votos, o «SIM» ganhou estrondosamente no referendo sobre a despenalização voluntária da gravidez.

Penso sinceramente que com este resultado todos os portugueses têm a ganhar: quer os que votaram «SIM» quer os que votaram «NÃO».

Se tivesse ganho o «NÃO», a opção ética que esse resultado implicaria passaria a ser imposta a todas as mulheres, independentemente da sua forma de encarar o assunto.
A vitória do «NÃO» teria significado a imposição de critérios e valores de ordem ética de uma parte da população sobre a outra.

Tendo ganho o «SIM», o aborto passará a ser despenalizado em certas condições e constituirá uma escolha livre para quem por ela pretenda optar.
A vitória do «SIM» significa, acima de tudo, a liberdade de escolha: para quem votou «SIM» e também para quem votou «NÃO».

É essa liberdade de escolha das mulheres – todas elas – a principal vitória deste referendo!

Mas este referendo é também a derrota clamorosa de muita gente:

É, em primeiro ligar, a derrota dos políticos com falta de coragem para tomar uma decisão legislativa que impedisse a estupidez de um referendo sobre questões de consciência.
E que agora se deparam com uma abstenção superior a 50%, e com uma coisa engraçada e muito curiosa que é um referendo que não é legalmente vinculativo mas que o é... politicamente.

É a derrota de Marques Mendes, que pensou que podia capitalizar politicamente uma eventual derrota do «SIM» de Sócrates.
É a derrota de Marcelo Rebelo de Sousa e das suas abstrusas cambalhotas e pontapés na lógica, que até o «Gato Fedorento» achincalhou e reduziu a pó.

É a derrota pesadíssima e humilhante da Igreja Católica e do seu envolvimento directo na campanha (tendo mesmo chamado à frente de batalha os seus maus fiéis e garbosos soldados e financiadores da Opus Dei), porque essa derrota lhe foi infligida principalmente pelos muitos católicos que se recusaram a confundir as suas convicções religiosas com uma fidelidade imbecil e medieval a opções patológicas sobre a sexualidade humana.

É a derrota do reaccionarismo mesquinho e seminarista daqueles que persistem em impor as suas convicções aos outros e não se conformam com a ideia de que Portugal é, acima de tudo, um Estado laico.

É a derrota daqueles que queriam colocar o direito penal ao serviço das suas convicções morais e opções de ordem ética.

É a derrota daqueles que confundindo o «direito à vida» com despenalização, acabavam por defender a formação de uma «comissão de ética» com poderes para autorizar um aborto, porque a sua pequenez mesquinha e misógina não pode conceber que uma mulher possa escolher e tomar decisões sozinha.

É a derrota de uma campanha suja, hipócrita e desonesta, com manipulações retóricas do significado da pergunta a referendar, com distorções de números e estatísticas e com distribuições de panfletos em infantários.
É a derrota de uma campanha que, desesperada pelos resultados das sondagens, e enquanto se dizia contra a despenalização, passou ao mesmo tempo a propor uma espécie de «penalização light» para as mulheres que abortassem.
É a derrota de uma campanha que deixou de repente de ser «pela vida» e passou a fazer de conta que não se apercebia que essa era uma medida que não evitava um só aborto em Portugal, que não impedia um só aborto clandestino, mas que se propunha actuar «de mansinho» mas... já depois do aborto ter sido realizado.

É a derrota soturna e mordaz como um ferro em brasa para a imbecilidade suprema de quem escreve no «Blog do Não»: «Venceu a cultura da morte! 11 de Setembro, 11 de Março, 11 de Fevereiro. Datas manchadas pela morte!»

É, enfim, a derrota daquelas pessoas que vi de lágrima ao canto do olho nas reportagens televisivas, todas de ar muito compungido e contristado ao ouvir os resultados do referendo.
Decerto desoladas porque as miúdas de 14 anos com overdoses mortais de «Citotec» ou as mulheres de útero esfrangalhado por agulhas de tricot vão poder agora optar em liberdade por aquilo que lhes indica a sua própria consciência – e não a consciência de outros – sem correrem o risco de ser perseguidas criminalmente.
Mas, e muito principalmente, sem correrem risco de vida!


sábado, 10 de fevereiro de 2007

 

Claro que Sim!


quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

 

Joint Venture



Noticia o «Le Monde» que em França os representantes das religiões católica, muçulmana, judaica, ortodoxa e protestante resolveram tomar uma posição comum contra o casamento homossexual naquele país.

Uma vez mais as principais multinacionais da exploração da fé e do medo da morte resolveram unir-se em torno daquilo que na realidade as une e a todas caracteriza: a intolerância e o preconceito.

Num documento conjunto que intitularam «O casamento é a união de um homem e de uma mulher», e sem temerem retaliações das leis anti-monopolistas da União Europeia à sua «joint venture» da homofobia, as principais religiões lá voltaram a unir sua persistente e patológica mania de tentarem influenciar e determinar a vida das pessoas, quer professem ou não o seu credo, quer perfilhem ou não dos seus valores e opções éticas.

Como não podia deixar de ser, depois de meterem a pata na poça ao tentarem chamar à instituição do casamento «uma referência da criação da humanidade», este clube de alucinados pelo sexo tem mesmo a ousadia de «recusar» qualquer debate sobre este assunto na sociedade, alegando que uma instituição tão essencial como o casamento não pode estar sujeita «às flutuações das correntes de pensamento».
Ou seja: como já pensaram e debateram pelos outros... a decisão está tomada!

Enquanto isso, em Portugal vive-se mais ou menos uma situação similar.
Enquanto o processo de recurso do indeferimento do casamento da Teresa e da Lena aguarda pacientemente a coragem de uma decisão juridicamente correcta por parte dos tribunais superiores, os milhares de casais homossexuais que em Portugal pretendem não mais do que o acesso à celebração de um simples contrato de natureza civil aguardam também que o poder político tenha a coragem e a dignidade – humana, pessoal e política – de legislar sobre o assunto.

Enquanto isso, o tempo vai passando ao sabor da vontade de quem se acha no direito de pensar pelos outros e de influenciar e determinar a sua vida de acordo com os seus próprios valores e princípios éticos ou religiosos.


Entretanto, e vergonhosamente, Portugal continua ao lado dos países que no mundo constituem os maiores exemplos de intolerância, homofobia e preconceito.

Na imagem ao lado (clicar na imagem para a ampliar) pode ver-se o mapa dos países da Europa que autorizam já o casamento homossexual ou uma união civil de características semelhantes, os que, como a França, autorizam um «Pacto Civil de Solidariedade» e os que, como Portugal, a Itália, a Polónia e a Hungria, não prevêem qualquer tipo de estatuto jurídico para os casais homossexuais.


quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

 

A Santa Intolerância Cristã



Gostava de um dia perceber se entre os delírios religiosos e a intolerância há uma conexão necessária e natural, ou se isso é apenas uma simples e mera coincidência.






segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

 

O Aborto Obrigatório



Sejamos claros: é um facto incontestável que o referendo sobre o aborto do próximo dia 11 de Fevereiro há muito que deixou de ter alguma coisa a ver com aquilo que a pergunta que vai ser referendada verdadeiramente significa.

Porque se quem vota «SIM» reconhece o valor da vida intra-uterina e se quem vota «NÃO» afirma agora que não pretende a prisão das mulheres, então o consenso entre ambas as posições seria até muito simples: despenalizava-se o aborto... até às 10 semanas!

Mas mais do que uma resposta a uma pergunta que visa não mais do que o acrescento de uma alínea ao Código Penal, mais do que uma preocupação sobre a situação das mulheres com menos recursos que recorrem ao aborto clandestino, será da ponderação de valores que cada pessoa intimamente faz, dos seus critérios e opções éticas muito pessoais, será da sua consciência que resultará o seu voto «SIM» ou o seu voto «NÃO».

Pois bem:
Foi precisamente de uma determinada política legislativa e, assim, também de um escolha ética precisa e muito concreta que nasceu a formulação da lei actualmente em vigor, que descriminaliza o aborto nos casos de violação, de malformação do feto ou de perigo para a mulher grávida.
Embora haja muito boa gente que tenha a iniquidade medieval de defender a revogação desta lei e pugne pela recriminalização do aborto mesmo nesses casos (e independentemente de se admitir ou de se concordar com a sua opção ética), é esta a lei que está em vigor e é esta a lei que tem de se cumprir.

Assim, o cumprimento desta actual lei, por exemplo no caso de uma gravidez que resulte de uma violação ou no caso em que uma ecografia que revele uma gravíssima malformação do feto, significa dar à mulher grávida a possibilidade de abortar.

Contudo, e como é por demais óbvio, esse mesmo cumprimento desta actual lei não significa que nesses mesmos casos a mulher grávida seja OBRIGADA a abortar.

Significa, antes, que a actual lei dá à mulher grávida a possibilidade de ESCOLHER qual a opção que pretende, e que resulta dos seus critérios éticos pessoais e da sua consciência.
Poderá a mulher grávida ESCOLHER entre abortar ou, ao invés, ESCOLHER antes levar a gravidez até ao fim.
E é essa escolha que tem de ser respeitada!
É essa escolha que representa o pleno exercício da LIBERDADE da mulher e do DIREITO que ela tem a agir de acordo com a sua própria consciência, seja em caso de violação, de malformação do feto, ou até mesmo de perigo grave para a sua própria vida.

Mas, acontece que a pergunta que vai ser referendada no próximo dia 11 de Fevereiro não permite à mulher essa liberdade e essa escolha.

Porque se o «SIM» ganhar, isso significa, tal como acontece com a lei actual, que colocadas duas mulheres grávidas nas mesmas circunstâncias de vida, uma delas poderá optar por abortar até às 10 semanas da sua gravidez sem correr o risco de ser por isso penalizada, enquanto a outra poderá ESCOLHER não abortar, se foi isso que lhe indicaram a sua consciência e os seus valores e critérios éticos pessoais.

Pelo contrário, se o «NÃO» ganhasse, nenhuma dessas duas mulheres poderia, nas mesmas circunstâncias, abortar.
Mas não por opção pessoal de qualquer uma delas: mas pura e simplesmente porque esse comportamento assim lhes foi determinado - a ambas - não em razão do exercício de uma liberdade individual própria e que é sua, mas por escolha e pela imposição da consciência e dos valores e critérios éticos e pessoais de... OUTRAS pessoas.

É por isso que não se devem realizar referendos sobre questões de consciência.
Porque levar a votos uma questão de consciência e referendar critérios de ética resulta sempre na imposição de critérios e valores éticos de umas pessoas sobre os critérios e os valores éticos de outras pessoas.
Com que autoridade?
E com que direito?
Porque se há coisa certa neste mundo, é que não é com toda a certeza de uma maioria de votos que resulta uma maioria de valores. E Adolf Hitler poderia bem testemunhá-lo!

É por isso que este referendo é antes de mais um novo insulto aos portugueses, porque ele resulta de mais uma decisão cobarde e hipócrita de uma classe política que parece apostada em todos os dias lançar um pouco mais de descrédito sobre si própria.

Mas mais do que isso:
Se nesta questão da despenalização do aborto o que está em causa é tão simplesmente a convivência simultânea de valores e critérios éticos de todas as pessoas e, por isso, a ESCOLHA individual de cada mulher, então, e por paradoxal que isso pareça, este referendo é também um insulto à própria democracia.
Porque a imposição de critérios de consciência de umas pessoas sobre os critérios de consciência de outras pessoas, mesmo que essa imposição resulte de uma maioria de votos, pode ser tudo.
Democracia é que não é!


sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

 

Os Amigos de Deus



Gostava de um dia perceber se entre os delírios religiosos e a imbecilidade há uma conexão necessária e natural, ou se isso é apenas uma simples e mera coincidência.

Como gostava de saber se não haverá algures um limite para além do qual a propagação dessa imbecilidade a crianças não deveria ser considerada um crime de pedofilia como qualquer outro.




(Publicado simultaneamente no «Diário Ateísta»)


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